Pular para o conteúdo principal

Ozonioterapia: conflitos entre ciência e regulamentação de prática sem eficácia comprovada

A sociedade tem de questionar o papel do Congresso Nacional na regulamentação sanitária com interesses de compensações políticas


ELIZE MASSARD DA FONSECA
professora da Escola de Administração
de Empresas de São Paulo (FGV EAESP)
Agência Bori

O projeto de lei 9001/2017, sancionado pelo governo em 4 de agosto como Lei 14648/2023 e que aprova a ozonioterapia como tratamento médico complementar, trouxe à tona um debate relevante sobre o papel do Congresso Nacional na regulação sanitária e os potenciais riscos para a saúde da população sendo desconsiderados em prol de retornos políticos.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, os equipamentos médicos emissores de ozônio são atualmente utilizados em aplicações odontológicas, como o tratamento antimicrobiano para cárie dental e para procedimentos estéticos de limpeza e assepsia de pele. No entanto, ainda não existem evidências científicas que comprovem sua eficácia no tratamento de enfermidades como dor crônica e inflamações.

A responsabilidade de avaliar e aprovar terapias, medicamentos e vacinas cabe à Anvisa, e essas decisões são fundamentadas em estudos de ensaios clínicos que garantam a segurança e eficácia dos produtos. A agência foi criada como uma entidade independente, justamente para assegurar autonomia na tomada de decisões e evitar influências comerciais e políticas na aprovação de produtos relacionados à saúde.

Entretanto, estudos realizados por pesquisadores da FGV sugerem que o Congresso tem atuado para alterar as competências normativas e fiscalizatórias dessas instituições. 

No caso específico da Anvisa, parlamentares têm trabalhado para evitar a restrição de determinadas atividades ou condutas por parte do órgão regulador. 

Situações semelhantes ocorreram com a liberação dos medicamentos anorexígenos e a fosfoetanolamina, ambos revertidas pelo STF, e mais recentemente, a autorização para a importação excepcional da vacina Sputnik V, que mesmo aprovada, nunca foi comercializada no Brasil.

Terapia com o ozônio
pode colocar em risco a
saúde da população

No caso da ozonioterapia, é preocupante a brevidade e a falta de detalhes no projeto de lei que regulamenta o seu uso. É esperado que projetos de lei apresentem uma justificativa clara ao serem submetidos ao Congresso. 

Além disso, durante o processo de tramitação, não foram realizadas audiências públicas com a participação de especialistas para debater o assunto. 

A análise das comissões limitou-se a alterações semânticas, debates sobre a legitimidade jurídica e possível ampliação dos profissionais habilitados para a aplicação desse tratamento.

Quando um projeto de lei chega à mesa do presidente para sanção ou veto, ele tem o poder de exercer sua prerrogativa para avaliar a adequação da legislação. 

Nesse contexto, a conjuntura política pode ter desempenhado um papel relevante na decisão do presidente, assim como foi observado anteriormente em casos semelhantes, como o da fosfoetanolamina durante o governo de Dilma Rousseff. 

No caso da ozonioterapia, a questão ganha ainda mais complexidade, pois ela é considerada uma prática integrativa de saúde, de acordo com uma portaria emitida pelo então Ministro da Saúde, Ricardo Barros.

A falta de embasamento científico pode colocar em risco a saúde da população, uma vez que a ozonioterapia pode ser vista como uma alternativa de tratamento, mas ainda carece de evidências sólidas sobre sua eficácia e segurança em diversas aplicações médicas. 

Nesse caso é de fundamental importância que as autoridades de saúde monitorem a aplicação e promovam a transparência e participação da comunidade científica e da sociedade no debate sobre a eficácia e segurança dessa terapia complementar.

Elize Massard da Fonseca é Professora da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas (FGV EAESP)


• Cientistas vão ao Supremo contra endosso de Lula à ozonioterapia

• ‘Medicina alternativa’ coloca o SUS contra a ciência, dizem estudiosas

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

1º Encontro Nacional de Ateus obtém adesão de 25 cidades

Lakatos: "Queremos mostrar a nossa cara " O 1º Encontro Nacional de Ateus será realizado no dia 12 de fevereiro com participantes de 25 cidades em 23 Estados (incluindo o Distrito Federal). A expectativa é de que ele reúna cerca de 5.000 pessoas. A mobilização para realizar o encontro – independentemente do resultado que possa ter – mostra que os ateus brasileiros, principalmente os mais jovens, começam a se articular em todo o país a partir da internet. A ideia da reunião surgiu no Facebook. Pelo IBGE, os ateus e agnósticos são 2% da população. O que representa 3,8 milhões de pessoas, se o censo de 2010, que apurou uma população de 190,7 milhões, mantiver esse índice. “Queremos mostrar a nossa cara”, disse Diego Lakatos (foto), 23, que é o vice-presidente da entidade organizadora do evento, a SR (Sociedade Racionalista). “Queremos mostrar que defendemos um Brasil laico, com direitos igualitários a todas as minorias, independentemente de crença ou da inexis...

Icar queixa-se de que é tratada apenas como mais uma crença

Bispos do Sínodo para as Américas elaboraram um relatório onde acusam autoridades governamentais de países do continente americano de darem à Igreja Católica um tratamento como se ela fosse apenas mais uma crença entre tantas outras, desconsiderando o seu “papel histórico inegável”. Jesuíta convertendo índios do Brasil Os bispos das Américas discutiram essa questão ao final de outubro em Roma, onde elaboraram o relatório que agora foi divulgado pela imprensa. No relatório, eles apontam a “interferência estatal” como a responsável por minimizar a importância que teve a evangelização católica na formação da identidade das nações do continente. Eles afirmaram que há uma “estratégia” para considerar a Igreja Católica apenas pela sua “natureza espiritual”,  deixando de lado o aspecto histórico. O relatório, onde não há a nomeação de nenhum país, tratou também dos grupos de evangélicos pentecostais, que são um “desafio” por estarem se espalhando “através de um proselitism...

Suposto ativista do Anonymous declara guerra a Malafaia

Grupo Anonymous critica o enriquecimento de pastores O braço brasileiro dos ativistas digitais Anonymous (ou alguém que está se passando por eles) declarou guerra ao Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, e aos demais pastores que pregam "mentiras" e “a prosperidade usando a Bíblia” para enriquecimento próprio. “Vamos buscar a fé verdadeira e a religião”, promete uma voz feminina gerada por um soft, de acordo com um vídeo de 14,5 minutos. As imagens reproduzem cenas de programas antigos do pastor pedindo aos fiéis, por exemplo, contribuição no valor de um aluguel, inclusive dos desempregados. Em contraposição, o vídeo apresenta o depoimento de alguns pastores que criticam a “teologia da prosperidade”. Resgata uma gravação onde Malafaia chama de “palhaço” um pastor cearense que critica a exploração dos fiéis. Como quase sempre, é difícil confirmar a autenticidade de mensagem dos Anonymous. Neste vídeo, o curioso é que os ativistas estão preocup...

2º Encontro Nacional de Ateus já tem a adesão de 9 Estados

O 2º Encontro Nacional de Ateus, que vai se realizar no dia 17 de fevereiro de 2013, um domingo, já tem a adesão de 9 Estados, além do Distrito Federal: São Paulo, Sergipe, Paraná, Maranhão, Rio, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Goiás e Paraíba. Em cada um desses Estados o encontro será promovido por uma associação de livres-pensadores. Lisiane disse que este ano estarão em pauta racionalismo e ceticismo  “Nosso propósito não é apenas a confraternização, mas promover o pensamento crítico”, disse Lisiane Pohlmann  (foto), 23, graduanda de administração e de serviço social e presidente da SR (Sociedade Racionalista), a organizadora nacional do evento. A SR tem a expectativa de obter a confirmação de participantes de Estados como Pará, Minas Gerais, Bahia, Rio Grande do Sul, Ceará, Espírito Santo, Amazonas, Mato Grosso e Amapá. “Qualquer um que preze o uso da razão será muito bem-vindo”, afirmou Lisiane. A faixa etária dos participantes é de 20 a 30 anos, na pr...

Evangélico propõe criar banheiro para gays e lésbicas

Vereador Apolinário é tido por   gays  como homofóbico O vereador Carlos Apolinário (foto), 59, de São Paulo, apresentou projeto de lei que, se aprovado, cria banheiros públicos e em restaurantes, shoppings, cinemas e em casas noturnas para gays, lésbicas, bissexuais e transexuais. Ligado à Assembleia de Deus, Apolinário é tido como homofóbico pelo movimento de defesa dos homossexuais. Para ele,  já existe no Brasil uma ditadura gay. Em 2011, Apolinário conseguiu que a Câmara Municipal aprovasse o “Dia do Orgulho Heterossexual”. A lei foi vetada pelo prefeito Gilberto Kassab. Apolinário disse que teve a ideia de propor a criação do terceiro banheiro a partir da polêmica desencadeada por Laerte Coutinho, 60, que foi barrado ao tentar entrar em banheiro feminino de uma  lanchonete. O cartunista da Folha de S. Paulo é bissexual e atualmente se veste de mulher. O vereador do DEM considerou inaceitável o argumento de Laerte segundo o qual naquele ...

Afegã presa por ter sido violentada terá de se casar com estuprador

Gulnaz e filha estão em uma prisão de Cabul Gulnaz (foto), 21, ainda se lembra do mau cheiro do homem que a estuprou dois anos atrás. “Ele estava com a roupa suja do seu trabalho”, disse à CNN. “Quando minha mãe saiu para ir a um hospital, ele entrou em minha casa e trancou as portas e janelas. Comecei a gritar, mas ele colocou as mãos sobre minha boca.”  Desde então a vida de Gulnaz mudou radicalmente. Ela ficou grávida do estuprador e foi condenada por um Tribunal do Afeganistão a 12 anos de prisão por adultério. O homem que a violentou era na época marido de uma sua prima. Com a sua filha, a jovem está cumprindo a pena em uma prisão de Cabul. Só tem um jeito de ela sair dali antes de todo o período da condenação: casar com o seu estuprador (que também está preso) para voltar a ser "honrada". É o que ela decidiu fazer para continuar com a filha. Se não for assim, terá de doar a criança. Casos como a de Gulnaz são frequentes. Cinegrafistas contratados pela U...

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Câmara só autoriza culto de duas religiões, afirma Wyllys

Foto de culto na Câmara que Wyllys postou em seu Facebook O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) acusou a mesa diretora da Câmara de discriminação religiosa, porque, segundo ele, só permite ali a celebração de cultos de duas religiões, a evangélica e a católica. Ele postou em sua página no Facebook a foto de um culto celebrado por deputados-pastores no plenário 1 ou 2. Disse ter visto “um fervoroso deputado João Campos” [presidente da Frente Parlamentar Evangélica] e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ). Afirmou que a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros) celebra em plenário uma missa por mês. O deputado disse que esse “privilégio” não se estende às demais religiões. “A mesa diretora negou aos adeptos das religiões de matriz africana o direito de realizar um xirê nas dependências da Câmara”, escreveu. “Também não há cerimônias budistas, judaicas, zoroastristas e etc.", disse. “A liberdade de culto aqui [na Câmara] é só pra alguns! Sendo o Estado laico (sem paixã...

Andréa Beltrão crê em pessoas, não em Deus. 'Sou cética'

Atriz afirma  que só crê nela Andréa Beltrão (foto) chamou um padre para rezar no velório do seu irmão — ele morreu aos 19 anos de um aneurisma cerebral. A atriz tomou essa providência porque era o que parentes e amigos do seu irmão esperavam que houvesse. Se dependesse apenas dela, não haveria sacerdote no velório. Beltrão é ateia assumida.