Pular para o conteúdo principal

A beleza ilusória do mundo da nuvem digital tem impacto na saúde mental

As redes sociais são viciantes porque estimulam a geração de dopamina, um neurotransmissor  relacionado a uma felicidade que não existe


Iván Fernández Suárez
pesquisador do grupo trabalho e riscos emergentes na sociedade da informação, Universidade Internacional de La Rioja, Espanha

The Conversation
plataforma de informação e análise produzida por acadêmicos e jornalistas

Há milhões de anos, os hominídeos desceram das árvores e conseguiram viver em praticamente qualquer canto do planeta, e até no espaço. Agora, a nossa espécie voltou para a nuvem digital.

As mudanças mais recentes e aceleradas fizeram com que o nosso trabalho, as nossas relações e, em última análise, as nossas vidas, dependessem de um mundo paralelo, muitas vezes irreal. Somos capazes de viver experiências totalmente novas, rompendo barreiras espaciais e temporais ou usufruindo de novas ferramentas tecnológicas — incluindo o surgimento da inteligência artificial — que complementam a nossa capacidade de adaptação.

Viciado em dopamina

Este mundo digital, defendido pelas redes sociais, oferece um produto que gera alta satisfação dos usuários. E isso representa um risco: as redes são viciantes porque estimulam a geração de dopamina, um neurotransmissor intimamente relacionado com a felicidade (e a falta dela).

O especialista em marketing Armando Espinoza Oliva revela como essa geração de dopamina estimulada pelas redes sociais pode provocar mudanças em nosso comportamento e manipular o psiquismo dos usuários. 

Sua pesquisa destaca o alto poder de persuasão das redes e sua eficácia em definir tendências e modas ou mesmo em viralizar determinados produtos ou comportamentos.

São ferramentas tecnológicas que geram satisfação imediata: uma notificação, um like, um e-mail ou um reel conseguem gerar um aumento na nossa sensação de felicidade em apenas alguns segundos.

O mundo real não
é perfeito como o
mundo da rede digital

Essa realidade digital baseia-se na procura de recompensa imediata. A maior parte do que vemos é um mundo idealizado. Sua estética visual e conteúdo estão distantes do seu dia a dia. Além disso, é um loop alimentado por todos os usuários.

Assim, numerosos perfis de redes sociais como Instagram, Facebook ou TikTok mostram apenas uma parte muito seletiva da vida real, muitas vezes camuflada por filtros, fotomontagens e felicidade forçada. 

Outras redes, por sua vez, estão mais focadas em informação, opinião e polêmica (caso X, antigo Twitter). Em todo o caso, a postura digital surge como uma das características fundamentais deste universo online onde prevalecem as aparências, a imagem e a opinião.

O choque traumático

Esse pode ser o principal problema de passar tantas horas num mundo virtual: sair da nuvem e ver que o que temos ao nosso redor não é tão perfeito. E o golpe da realidade pode ter consequências na saúde mental.

O impacto destes meios de comunicação tem sido amplamente estudado. Assim, constatou-se que os usuários mais jovens (principalmente os adolescentes) vivenciam níveis mais elevados de exposição e dependência. E se nos concentrarmos no gênero, entram em jogo elementos como a desigualdade e o sexismo, ajudando a perpetuar estereótipos sexistas.

De acordo com vários estudos, enquanto as mulheres usam as redes por diversos motivos (entre eles acadêmicos), os homens entram com mais frequência para conversar. Relativamente à idade, a faixa entre os 16 e os 24 anos é a que tem maior exposição às redes sociais (mais de 92% das pessoas deste grupo populacional estão conectados com maior frequência).

A identificação com referências como Youtubers ou influenciadores é diferente dependendo dessas variáveis, mas tem gerado mudanças profundas em aspectos básicos da interação social. Embora seja verdade que os investigadores tenham detectado que as novas tecnologias potenciam benefícios como a facilidade e a rapidez do contato, a sua utilização também conduz à perda da comunicação face a face e a dificuldades na manutenção de relações presenciais e duradouras.


Criamos mundos digitais perfeitos expostos à opinião pública numa busca constante por reconhecimento (seguidores, curtidas, comentários, etc.). Principalmente em adolescentes, que são mais sensíveis a opiniões negativas.

Nesta faixa etária, a digitalização está gerando problemas como a insônia (vamping), perda de autoestima e de valores, diminuição do desempenho acadêmico e aumento de patologias cardiovasculares, obesidade e sedentarismo.

Isto certamente afeta o agravamento a saúde mental. Um fato significativo é que em Espanha, por exemplo, o suicídio se tornou a principal causa de morte em pessoas entre os 12 e os 29 anos, com um aumento de 32% entre 2019 e 2021 (de 34 para 45 mortes).

Dicas para uso responsável

Perante estes riscos, dos quais ninguém está isento independentemente da idade, devemos esforçar-nos para gerir adequadamente as nossas emoções com as seguintes práticas:

— Controlar os tempos de exposição, os quais estão diretamente relacionados à saúde mental. Devemos estabelecer limites, buscar o equilíbrio entre o mundo digital e o mundo real. Raramente temos consciência do tempo total que passamos em ambientes digitais.

— Consumir informações de forma crítica. Infoxicação é um novo conceito que se refere à quantidade de informações incorretas ou falsas a que estamos expostos. As ferramentas digitais têm um grande poder de ensino, mas devemos escolher bem as nossas fontes.

— Evite comparações. Podemos procurar inspiração, motivação ou aprendizagem nos outros, mas devemos estar conscientes dos nossos pontos fortes, fracos e dos objetivos que podemos e queremos alcançar. Somos únicos.


— Esteja atento aos sinais do nosso corpo e da nossa mente. Ter consciência de como as interações digitais e reais nos fazem sentir é a principal ferramenta para regulá-las. Muitas vezes não paramos para reconhecer nossas emoções. Simplesmente desconectamos nossa mente navegando no mundo digital.

— Cuide da saúde física. Uma alimentação saudável e exercícios físicos também podem ajudar a melhorar nossa resistência psicológica.

Como sociedade, devemos colaborar para reconhecer e apoiar a saúde mental em todas as áreas. O primeiro passo é conscientizar e se esforçar para cuidar dele da melhor forma possível. Talvez uma dose da bela imperfeição do mundo real seja um bom substituto para a beleza do mundo digital.

> Este artigo foi publicado originalmente em espanhol.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

Ateísmo faz parte há milênios de tradições asiáticas

Físico afirma que cientistas só podem pensar na existência de Deus como hipótese

Chico Buarque: 'Sou ateu, faz parte do meu tipo sanguíneo'

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

O dia em que os Estados Unidos terão um presidente ateu

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê...

Padre acusa ateus de defenderem com 'beligerância' a teoria da evolução

Roger tenta anular 1ª união para se casar com Larissa Sacco

Médico é acusado de ter estuprado pacientes Roger Abdelmassih (foto), 66, médico que está preso sob a acusação de ter estuprado 56 pacientes, solicitou à Justiça autorização  para comparecer ao Tribunal Eclesiástico da Arquidiocese de São Paulo de modo a apresentar pedido de anulação religiosa do seu primeiro casamento. Sônia, a sua segunda mulher, morreu de câncer em agosto de 2008. Antes dessa união de 40 anos, Abdelmassih já tinha sido casado no cartório e no religioso com mulher cujo nome ele nunca menciona. Esse casamento durou pouco. Agora, o médico quer anular o primeiro casamento  para que possa se casar na Igreja Católica com a sua noiva Larissa Maria Sacco (foto abaixo), procuradora afastada do Ministério Público Federal. Médico acusado de estupro vai se casar com procuradora de Justiça 28 de janeiro de 2010 Pelo Tribunal Eclesiástico, é possível anular um casamento, mas a tramitação do processo leva anos. A juíza Kenarik Boujikian Fel...