Pular para o conteúdo principal

Sacrifício de humanos era comum em culturas antigas dominadas por sacerdotes

A teocracia maia, por exemplo, aplacava a fúria da serpente emplumada Kukulcan com virgens afogadas em poços sagrados e de outras vítimas arrancava o coração arrancado ainda vivas


James A. Haught
jornalista e escritor

Trecho do livro "Perseguições Religiosas"

Em algumas culturas antigas dominadas pela religião e sacerdotes, as pessoas enviavam seus filhos para serem estrangulados, decapitados, queimados, afogados, esfolados, esmagados ou morto de outra maneira, como oferenda para aplacar deuses que agora sabemos serem imaginários.

O sacrifício humano parece insano em retrospecto, mas era rotineiro para pessoas ensinadas incessantemente a temer deusas-serpentes aladas, deuses invisíveis da colheita, deusas veladas da destruição e assim por diante.

A matança não ficou confinada à época do Velho Testamento, mas atingiu um apogeu em tempos relativamente recentes, nas sofisticadas sociedades maia, inca e asteca da América Latina e no culto tugue da Índia.

Ao longo dos séculos, o sacrifício teve muitas variedades. Na antiga Fenícia, garotos eram queimados para satisfazer Adônis e outros deuses — e a queda de Cartago foi atribuída à falta de fé de nobres que passaram a colocar os filhos de escravos no lugar de seus próprios, nos altares.

Na antiga Gália, os druidas colocavam supostamente as vítimas em grandes figuras homem feitas de vime, e lhes atearam fogo. No Tibete, xamãs da seita bon tinham rituais com sacrifício humano.

Na África, os ashantis (ou axantes) ofereciam cerca de cem vítimas a deuses a cada setembro, para garantir uma boa colheita de inhame. Em Bornéu, construtores de palafitas atravessavam o corpo de uma virgem com a primeira estaca da casa, para pacificar a deusa da terra.

Os maias sacrificavam crianças
e virgens para saciar o apetite
a deusa-serpente Kukulcán

A era de outro dos sacrifícios veio com as teocracias altamente organizadas da América Central. Quando os maias se amalgamaram com ferozes tribos vizinhas no século XI, os assassinatos rituais se proliferaram, para aplacar a serpente emplumada Kukulcán (mais tarde chamada de Quetzalcoarl pelos astecas) e outros deuses.

Virgens eram afogadas em poços sagrados, e outras vítimas decapitadas, mortas à flechadas ou tinham seus corações arrancados.

No Peru, tribos pré-incaicas matavam crianças nas "casas da Lua". A partir do século XI, os incas construíram uma complexa teocracia dominada por sacerdotes que liam sinais mágicos diariamente e ofereciam sacrifícios a muitos deuses. Nas cerimônias importantes, até duzentas crianças eram queimadas em oferendas. As mães traziam suas crianças vestidas com ornamentos e flores, para serem submetidas à morte.

Mulheres escolhidas especiais — belas virgens sem mácula — algumas vezes eram retiradas de suas funções no templo e estranguladas. Governantes locais enviavam filhas para a capital em Cuzco, como mulheres escolhidas. Mais tarde, elas eram enviadas de volta para serem queimadas vivas.

A maior das religiões assassinas foi a dos astecas porque exigia cerca de 20 mil vítimas por ano. A principal divindade era o Sol, que poderia desaparecer, alertava os sacerdotes, se ele não fosse alimentado diariamente com corações e sangue. 

Milhares de vítimas, principalmente de prisioneiros de guerra, eram colocadas em altares de pedra, para que os religiosos lhes retirassem o coração com facas de obsidiana. A carne de seus braços era comida ritualisticamente, e suas caveiras eram colocadas em prateleiras já com milhares de cabeças. Expedição chamadas de "gerras das flores" eram promovidas para capturar candidatos ao sacrifício em abundância.

Os sacerdotes matavam muitas crianças astecas chorando para que suas lágrimas induzirem o deus da chuva a regar as plantações.

Para agradar à deusa do milho, virgens dançarinas eram decapitadas e esfoladas — e sua pele era envergada por sacerdotes durante danças sagradas.

• Polícia pega pai de santo que matou menino em ritual

Em 1487, quando o grande templo asteca em Tecnochtilán foi consagrado, oito equipes de sacerdotes trabalharam durante quatro dias sacrificando 20 mil prisioneiros, todos de três tribos capturadas.

Essa era clássica de sacrifício terminou quando os conquistadores espanhóis destruíram as civilizações maia, inca e asteca. Os espanhóis converteram esses povos ao cristianismo, à força — algumas vezes queimando os reincidentes —, mas permaneceram traços dos velhos deuses e seus sacrifícios.

Muito mais tarde, em 1868, um menino indígena foi sacrificado em Chiapas, no México.

No Extremo Oriente, cinco tipos diferentes de sacrifício humano foram interrompidos por governantes britânicos no século XIX.

Um ritual foi o meriah anual dos khonds de Bengala, que cotam uma vítima em pedacinhos e enterravam os fragmentos em muitos campos, para assegurar uma boa colheita.

Outro foi um ritual semanal de certos seguidores da sanguinária deusa hindu Kali. Havia o sacrifício de um menino toda sexta-feira, em um templo de Tanjore, na Índia.

O terceiro foi o código hindu de suttee (sati), que exigia que a viúva pulasse na pira funerária de seu marido, voluntariamente ou à força.

Os ingleses baniram esse ritual em 1829, mas ele persistiu.

Na Birmânia, o rei budista transferiu a capital para Mandalay, em 1854, e santificou as muralhas da nova cidade enterrando vivos dezenas de homens "puros", colocados em barris sob os portões e os bastiões.

Em 1861, descobriu-se que dois dos barris estavam vazios — ao que os astrólogos reais declararam que quinhentos homens, mulheres, meninos e meninas deveriam ser mortos e enterrados imediatamente, ou a capital teria de ser abandonada. Cerca de cem foram de fato enterrados, antes que as autoridades britânicas interrompessem a cerimônia.

A pior das matanças sagradas interrompidas pelos ingleses foi a do infame estrangulamento dos tugues na Índia. Ao longo de gerações, seguidores secretos de Kali, a deusa da destruição, vinham sacrificando por ano cerca de 20 mil vítimas. O custo em vida, desde os idos de 1500, era estimado em 2 milhões.

Pela teologia tugue, Brahma, o Criador, produzia vidas novas mais rápido que Shiva, o Destruidor, havendo, portanto, saldo positivo mesmo com os sacrifícios.

As vítimas dos tugues geralmente eram viajantes. As vítimas eram apanhadas, estranguladas, esfaqueadas e enterradas — e então os tugues faziam uma refeição cerimonial sobre aquele local.

As autoridades britânicas finalmente desbarataram os tugues, identificando 3.689 cultistas, que foram aprisionados ou enforcados. Ou ainda marcados a ferro com a palavra "tugue", como aviso público. Em julgamento em 1840, um único tugue foi acusado de estrangular 931 pessoas.

Outros sacrifícios permaneceram. No século XIX, um rei ashanti da África, desejando tornar seu novo palácio inexpugnável, sacrificou duzentas meninas e misturou seu sangue à argamassa das paredes.

Em 1838, uma menina da tribo americana pawnee foi cortada em pedaços para fertilizar plantações recém-semeadas.

Durante uma onda de fome na Rússia, na década de 1890, uma dúzia de votiaks foi condenada à prisão perpétua por pendurar uma vítima de cabeça para baixa, em uma árvore, e arrancar seu coração para aplacar Kourbane, o deus da terra.

James A. Haught (1932-2023) foi militante do ateísmo e da laicidade de estado.

Mais textos do autor 

• Vacinas contra a pandemia provam que a ciência sempre vence a religião

• Ser cético é uma questão sobretudo de ter honestidade intelectual

• Contar o número de deuses é difícil porque são muitos, dezenas de milhares, milhões

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Seleção de vôlei sequestrou palco olímpico para expor crença cristã

Título original: Oração da vitória por Daniel Sottomaior (foto) para Folha de S.Paulo Um hipotético sujeito poderoso o suficiente para fraudar uma competição olímpica merece ser enaltecido publicamente? A se julgar pela ostensiva prece de agradecimento da seleção brasileira de vôlei pela medalha de ouro nas Olimpíadas, a resposta é um entusiástico sim! Sagrado é o direito de se crer em qualquer mitologia e dá-la como verdadeira. Professar uma religião em público também não é crime nenhum, embora costume ser desagradável para quem está em volta. Os problemas começam quando a prática religiosa se torna coercitiva, como é a tradição das religiões abraâmicas. Os membros da seleção de vôlei poderiam ter realizado seus rituais em local mais apropriado. É de se imaginar que uma entidade infinita e onibenevolente não se importaria em esperar 15 minutos até que o time saísse da quadra. Mas uma crescente parcela dos cristãos brasileiros não se contenta com a prática privada: para

'Meu filho gay não representa nenhuma ameaça à humanidade'

por Paulo R. Cequinel  em resposta a um leitor no post Milhares de europeus católicos e protestantes pedem desbatismo Para que as coisas todas fiquem sempre muito claras, prezado Jefferson, devo dizer que meu filho mais novo é gay e que decidiu viver sua sexualidade abertamente. Como pai tenho o dever incontornável de, enquanto eu estiver por aqui, defender os valores, a honra, a imagem e a vida do meu menino. Eu, imoral? Meu filho, imoral e anticristão? A cada 36 horas uma pessoa LGBTT é assassinada neste país, e uma das razões, a meu juízo, é a evidente legitimação social que a LGBTT-fobia de origem religiosa empresta aos atos de intolerância e de violência contra essas pessoas que são, apenas, diferentes. Meu filho não ameaça nenhuma família ou a humanidade, como proclamou o nazistão do B16 recentemente. Aos 18, estuda muito, já trabalha, é honesto, é amoroso, é respeitado por seus companheiros de escola (preside o grêmio estudantil) e é gay, e não se esconde, e não

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Roger tenta anular 1ª união para se casar com Larissa Sacco

Médico é acusado de ter estuprado pacientes Roger Abdelmassih (foto), 66, médico que está preso sob a acusação de ter estuprado 56 pacientes, solicitou à Justiça autorização  para comparecer ao Tribunal Eclesiástico da Arquidiocese de São Paulo de modo a apresentar pedido de anulação religiosa do seu primeiro casamento. Sônia, a sua segunda mulher, morreu de câncer em agosto de 2008. Antes dessa união de 40 anos, Abdelmassih já tinha sido casado no cartório e no religioso com mulher cujo nome ele nunca menciona. Esse casamento durou pouco. Agora, o médico quer anular o primeiro casamento  para que possa se casar na Igreja Católica com a sua noiva Larissa Maria Sacco (foto abaixo), procuradora afastada do Ministério Público Federal. Médico acusado de estupro vai se casar com procuradora de Justiça 28 de janeiro de 2010 Pelo Tribunal Eclesiástico, é possível anular um casamento, mas a tramitação do processo leva anos. A juíza Kenarik Boujikian Felippe,  da 16ª

Justiça derruba lei anti-blasfêmia de Jundiaí. Mais uma derrota para 'sharia' cristã brasileira

Padre afirmava que primeiros fósseis do Brasil eram de monstros bíblicos, diz livro de 1817

Comissão vai apontar religiosos que ajudaram a ditadura

Pinheiro disse ser importante revelar quem colaborou com os militares A Comissão Nacional da Verdade criou um grupo para investigar padres, pastores e demais sacerdotes que colaboraram com a ditadura militar (1964-1985), bem como os que foram perseguidos. “Os que resistiram [à ditadura] são mais conhecidos do que os que colaboraram”, afirmou Paulo Sérgio Pinheiro (foto), que é o coordenador desse grupo. “É muito importante refazer essa história." Ele falou que, de início, o apoio da Igreja Católica ao golpe de Estado “ficou mais visível”, mas ela rapidamente se colocou em uma “situação de crítica e resistência.” O bispo Carlos de Castro, presidente do Conselho de Pastores do Estado de São Paulo, admitiu que houve pastores que trabalharam como agentes do Dops, a polícia de repressão política da ditadura. Mas disse que nenhuma igreja apoiou oficialmente os militares. No ano passado, a imprensa divulgou o caso do pastor batista e capelão Roberto Pontuschka. De dia ele co

Americano que se tornara cristão voltou a ser ateu

Manchete do Verdade Gospel, site do pastor Silas Malafaia A história do ateu americano Patrick Greene (foto), 63, que anunciou sua conversão ao cristianismo, teve uma sequência inesperada: ele disse que voltou a ser ateu.  A notícia da “conversão” foi destaque em sites religiosos de todo o mundo, embora Greene fosse até então um obscuro e desconhecido cidadão. No Brasil, por exemplo, o Verdade Gospel, do pastor Silas Malafaia, estampou: “Ateu se converte; veja do que a compaixão é capaz”. A “compaixão”, no caso, teria sido uma boa ajuda financeira que Greene tinha recebido de uma igreja batista para levar adiante o tratamento de uma doença que o ameaça deixar cego de um olho. Em um e-mail onde afirma ter anunciado “cedo demais” a sua conversão ao cristianismo, Greene diz que, em que pese o “amor, bondade e compaixão” que recebeu dos batistas, não pode renunciar a 50 anos de ateísmo. Ele disse que, após ter feito um exame de consciência no último fim de semana, concluiu

Alunos evangélicos de escola de Manaus recusam trabalho de cultura africana