Pular para o conteúdo principal

Pesquisadora da etnia Borum-Krenin estima que indígenas protegem 80% das florestas

 Bárbara Nascimento Flores destaca que a cultura dos povos nativos contém o conhecimento da biodiversidade 


Agência Bori
serviço de apoio à imprensa na cobertura da ciência

Assim como muitos cientistas, Bárbara Nascimento Flores tornou-se pesquisadora em busca de respostas. Mas ela queria saber mais não apenas sobre o mundo ou sobre a natureza, mas também sobre as suas origens, seus antepassados e a história dos que vieram antes dela — e encontrar seu lugar no mundo.

Doutora em desenvolvimento e ambiente pela UESC (Universidade Estadual de Santa Cruz, na Bahia), Flores é mulher indígena do povo Borum-Kren, da região atualmente chamada de Ouro Preto, em Minas Gerais.

Em seu Lattes, a pesquisadora usa o nome de sua comunidade como sobrenome para marcar sua identidade: Bárbara Nascimento Flores Borum-Kren. Ela ainda carrega no currículo formações em outras universidades brasileiras e um pós-doutorado no exterior.

Em entrevista à Agência Bori, ela afirma que os povos indígenas têm impacto positivo no clima: “É por meio dos nossos modos de vida que a gente mantém as florestas em pé, e são elas que mantêm o clima regulado na Terra. Mesmo representando 5% da população mundial, os povos indígenas ainda protegem 80% das florestas do planeta”

A pesquisadora diz esperar que as demandas e preocupações dos povos originários sejam levadas em consideração na COP (Conferências das Partes da ONU para o clima) deste ano, a ser realizada no Brasil, em Belém (PA). 

“Temos que ter espaços onde os povos indígenas tenham protagonismo, principalmente nos espaços de decisão sobre a conservação ecológica, a diversidade e os territórios”, diz.


Flores: 'É unânime o
desejo de conservação
da biodiversidade, as
florestas em pé para
manter os modos de
vida tradicionais

Entrevista

Como foi pra você se inserir como pesquisadora indígena no ambiente universitário?

Foi uma construção muito árdua para chegar nesse empoderamento de me identificar como uma pesquisadora indígena. A gente sofre alguns tipos de violência. 

O fortalecimento identitário na universidade veio com o fortalecimento identitário do meu povo, que foi declarado extinto. As famílias remanescentes desse povo tiveram que esconder suas identidades como forma de sobrevivência.

Sempre entendi que a minha luta é coletiva, para o meu povo, meus parentes, os povos indígenas, essa população tão massacrada nos últimos séculos, mas que é tão importante para o presente e para o futuro. 

São as populações indígenas que estão segurando o céu para ele não cair sobre as nossas cabeças, como diz o Davi Kopenawa [escritor e liderança yanomami]. É por meio dos nossos modos de vida nos territórios que a gente mantém as florestas em pé, e são elas que mantêm o clima regulado na Terra.

As crises climáticas que estamos vivendo são causadas pela devastação. Mesmo representando 5% da população mundial, os povos indígenas ainda protegem 80% das florestas do planeta. Mesmo nascendo em um contexto urbano, nós mantemos a conexão com o território e as nossas origens. É a forma como a gente enxerga a vida, o território como extensão do nosso corpo. 

Nossos povos ainda guardam muitas memórias, mesmo povos declarados extintos e que passaram por processos de apagamento histórico, ainda tem muitos conhecimentos sobre biodiversidade muito vivos.

Recentemente, a revista Science publicou um artigo assinado por pesquisadores indígenas brasileiros discutindo e defendendo uma maior integração entre o conhecimento científico ocidental e o indígena, especialmente em temas ligados à preservação da Amazônia e de sua biodiversidade. Qual a relevância desse tipo de trabalho?

Ter uma publicação de um artigo em uma revista de peso como a Science trazendo à tona a importância da ciência indígena, que conversa em pé de igualdade com a ciência acadêmica é algo histórico. Estamos no momento certo para isso, temos ferramentas metodológicas para demonstrar que a ciência indígena deve e pode conversar de igual para igual com a academia. 

Espero que este artigo abra cada vez mais porta para que os nossos conhecimentos se espalhem como sementes e possam influenciar políticas públicas de como ligar com a terra e com a natureza, com as demarcações.

Qual sua expectativa para a COP de 2025 no Brasil?

Temos que usar a linguagem acadêmica para traduzir os conhecimentos indígenas para conversar em pé de igualdade, na COP é a mesma coisa. Temos que ter espaços onde os povos indígenas tenham protagonismo principalmente nos espaços de decisão sobre a conservação ecológica, a diversidade e os territórios. Não temos que participar só como ouvintes, temos que participar das decisões.

Como isso pode ser viabilizado?

Na última COP, na Colômbia, houve a formação do Caucus Indígena, um espaço onde os povos indígenas se encontram para aproximar conceitos e posicionamentos. 

Tem também o G9 [coalização de organizações indígenas de nove países sul americanos criada na COP16], um espaço técnico e político para unificar o movimento indígena nas COPs. Estão sendo criados esses espaços de lideranças que estão conversando sobre essas questões para incidir nas decisões da COP.

Existe uma articulação relevante internacional do movimento indígena?

Sim, tem o Parlamento Indígena, que é uma instância que atua internacionalmente, e outras instâncias internacionais em que lideranças se encontram para discutir pautas em comum para povos indígenas do mundo inteiro. Tem um discurso uníssono, por causa dessa consciência que chamamos de pan-indígena. Antes, os povos ficavam concentrados em demandas do seu próprio território, locais. 

A partir do movimento indígena organizado, que no Brasil começa nos anos 1970 como movimento político organizado, começa a ter consciência da noção indígena nacional e, mais tarde, internacional. Várias questões que incidem nos territórios no Brasil também incidem em outros países.

Quais são as convergências entre povos brasileiros e de outros países?

É unânime o desejo de conservação da biodiversidade, as florestas em pé para manter os modos de vida tradicionais. A questão indígena está totalmente relacionada ao território. A questão da conservação dos territórios é a grande base que une as lutas de todos os povos indígenas, a demarcação e soberania nos territórios.

Como você avalia a postura do atual governo frente às demandas da crise do clima e da devastação ambiental?

No último governo, não tivemos demarcações, nenhuma política, tivemos boicotes de muitas ações dos próprios ministérios, da própria Funai, do próprio Ibama. Houve avanço das invasões dos garimpos, negligência do atendimento aos yanomami. 

Agora, nenhum governo é bom de fato para os povos indígenas. Os governos são desenvolvimentistas. O governo do PT é desenvolvimentista. Muitas políticas desenvolvimentistas são realizadas em cima dos territórios, como Belo Monte, que foi num governo do PT, as hidrelétricas do rio Madeira, que foram no governo do PT, agora o avanço das eólicas, da mineração.

É tudo em prol de um desenvolvimento para ter melhora na economia, na distribuição de renda e fortalecimento de políticas sociais. Só que essa ampliação das políticas sociais vem em cima de avanços nos territórios das florestas. 

Teve demarcação no governo Lula, sim, mas ainda tem muita para fazer, ainda falta muito. Teve a criação do Ministério dos Povos Originários, isso foi bom, mas o ministério não tem como atuar, não tem instrumentalização. 

Ainda assim, mesmo não sendo suficiente para as demandas dos povos indígenas, o governo do PT dialoga.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

Feliciano manda prender rapaz que o chamou de racista

Marcelo Pereira  foi colocado para fora pela polícia legislativa Na sessão de hoje da Comissão de Direitos Humanos e Minoria, o pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), na foto, mandou a polícia legislativa prender um manifestante por tê-lo chamado de racista sob a alegação de ter havido calúnia. Feliciano apontou o dedo para um rapaz: “Aquele senhor de barba, chama a segurança. Ele me chamou de racista. Racismo é crime. Ele vai sair preso daqui”. Marcelo Régis Pereira, o manifestante, protestou: “Isso [a detenção] é porque sou negro. Eu sou negro”. Depois que Pereira foi retirado da sala, Feliciano disse aos manifestantes: “Podem espernear, fui eleito com o voto do povo”. O deputado não conseguiu dar prosseguimento à sessão por causa dos apitos e das palavras de ordem cos manifestantes, como “Não, não me representa, não”; “Não respeita negros, não respeita homossexuais, não respeita mulheres, não vou te respeitar não”. Jovens evangélicos manifestaram apoio ao ...

Orkut tem viciados em profiles de gente morta

Uma das comunidades do Orkut que mais desperta interesse é a PGM ( Profile de Gente Morta). Neste momento em que escrevo, ela está com mais de 49 mil participantes e uma infinidade de tópicos. Cada tópico contém o endereço do profile (perfil) no Orkut de uma pessoa morta e, se possível, o motivo da morte. Apesar do elevado número de participantes, os mais ativos não passam de uma centena, como, aliás, ocorre com a maior parte das grandes comunidades do Orkut. Há uma turma que abastece a PGM de informações a partir de notícias do jornal. E há quem registre na comunidade a morte de parentes, amigos e conhecidos. Exemplo de um tópico: "[de] Giovanna † Moisés † Assassinato Ano passado fizemos faculdade juntos, e hoje ao ler o jornal descubri (sic) que ele foi assassinado pois tentou reagir ao assalto na loja em que era gerente. Tinha 22 anos...” Seguem os endereços do profile do Moisés e da namorada dele. Quando o tópico não tem o motivo da morte, há sempre alguém que ...

Rabino da Congregação Israelita Paulista é acusado de abusar de mulheres

Limpem a boca para falar do Drauzio Varella, cristãos hipócritas!

Varella presta serviço que nenhum médico cristão quer fazer LUÍS CARLOS BALREIRA / opinião Eu meto o pau na Rede Globo desde o começo da década de 1990, quando tinha uma página dominical inteira no "Diário do Amazonas", em Manaus/AM. Sempre me declarei radicalmente a favor da pena de morte para estupradores, assassinos, pedófilos, etc. A maioria dos formadores de opinião covardes da grande mídia não toca na pena de morte, não discutem, nada. Os entrevistados de Sikera Júnior e Augusto Nunes, o povo cristão da rua, também não perdoam o transexual que Drauzio, um ateu, abraçou . Então que tipo de país de maioria cristã, tão propalada por Bolsonaro, é este. Bolsonaro é paradoxal porque fala que Jesus perdoa qualquer crime, base haver arrependimento Drauzio Varella é um médico e é ateu e parece ser muito mais cristão do que aqueles dois hipócritas.  Drauzio passou a vida toda cuidando de monstros. Eu jamais faria isso, porque sou ateu e a favor da pena de mor...

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Prefeito de São Paulo veta a lei que criou o Dia do Orgulho Heterossexual

Kassab inicialmente disse que lei não era homofóbica

Pastor da Frente Parlamentar quer ser presidente do Brasil

Feliciano sabe das 'estratégias do diabo' contra um presidente cristão O pastor Marco Feliciano (foto), 41, do Ministério Tempo de Avivamento, disse sonhar com um Brasil que tenha um presidente da República que abra o programa “Voz do Brasil” dizendo: “Eu cumprimento o povo brasileiro com a paz do Senhor”.  Esse presidente seria ele próprio, conforme desejo que revelou no começo deste ano. Feliciano também é deputado federal pelo PSC-SP e destacado membro da Frente Parlamentar Evangélica. Neste final de semana, após um encontro com José Serra (PSDB), candidato a prefeito de São Paulo, Feliciano falou durante um culto sobre “as estratégias do diabo” para dificultar o governo de um "presidente cristão":  "A militância dos gays, a militância do povo que luta pelo aborto, a militância dos que querem descriminalizar as drogas". Como parlamentar, Feliciano se comporta como se o Brasil fosse um imenso templo evangélico. Ele é autor, entre outros, do p...

Surpresa no Nordeste: evangélicos estão se convertendo ao judaísmo

MP estuda pedir demolição de templo da Mundial que roubou rua

O Ministério Público do Estado de São Paulo poderá enviar à Justiça um pedido para a demolição do templo que a Igreja Mundial está construindo em São Paulo, no bairro Santo Amaro, zona sul. Com a conivência de autoridades municipais, a construção roubou 137 metros de um terreno previsto em lei para ser o prolongamento da rua Bruges, até a Benedito Fernandes, conforme mostra o mapa acima.   Hussain Aref Saab, que foi diretor do Aprov (Departamento de Aprovação de Edificação), da Prefeitura, teria participado de manobras ilegais para permitir que a igreja de Valdemiro Santiago assumisse um pedaço da rua. A informação é de Diego Zanchetta e Rodrigo Burgarelli, do Estado de S.Paulo. Saab se afastou do Aprov após denúncias de que ele se tornou proprietário de 125 apartamentos em 7 anos, levantando a suspeita de enriquecimento ilícito. As obras começaram em março de 2011 sem alvará, apenas com documento provisório chamado “direito de protocolo”. Os vizinhos alertaram as autoridade...