Pular para o conteúdo principal

Saiba o que é secularização orgânica e como ela beneficia os EUA


PHIL ZUCKERMAN
A secularização da sociedade dos Estados Unidos — o declínio da fé, prática e filiação religiosas — continua em um ritmo dramático e sem precedentes históricos. Embora muitos possam considerar tal desenvolvimento como motivo de preocupação, tal preocupação não se justifica. Essa crescente secularização na América é, na verdade, uma coisa boa, para ser bem recebida e abraçada.

As sociedades democráticas que experimentaram os maiores graus de secularização estão entre as mais saudáveis, ricas e seguras do mundo, desfrutando de índices relativamente baixos de crimes violentos e altos níveis de bem-estar e felicidade. Claramente, uma perda rápida da religião não resulta em ruína social.

Pela primeira vez desde que o Gallup começou a rastrear os números em 1937, os americanos que são membros de uma igreja, sinagoga ou mesquita não são a maioria, de acordo com um relatório do Gallup divulgado esta semana. Compare os atuais 47% com 1945, quando mais de 75% dos americanos pertenciam a uma congregação religiosa.

Este declínio na afiliação religiosa se alinha de perto com muitas tendências de secularização semelhantes. Por exemplo, no início dos anos 1970, apenas um em cada 20 americanos alegava "nenhuma" como sua religião, mas hoje está mais perto de um em cada três.

No mesmo período, a frequência semanal à igreja diminuiu e a porcentagem de americanos que nunca frequentaram serviços religiosos aumentou de 9% para 30%.

Em 1976, quase 40% dos americanos disseram acreditar que a Bíblia era a verdadeira palavra de Deus, que deve ser interpretada literalmente. Hoje, apenas cerca de um quarto dos americanos acredita que, com um pouco mais de decreto, a Bíblia é simplesmente uma coleção de fábulas, histórias e contos morais escritos por homens. E a porcentagem de americanos que acreditam com segurança na existência de Deus, sem dúvida, diminuiu de 63% em 1990 para 53% hoje.

Temores de que esse aumento da irreligião possa resultar na deterioração da fibra moral de nossa nação — e ameaçar nossas liberdades e liberdades — são compreensíveis.

Essas preocupações têm mérito histórico: a ex-União Soviética era um país comunista profundamente enraizado no ateísmo e foi um dos regimes mais corruptos e sangrentos do século XX. Outros regimes autoritários ateus, como a ex-Albânia e o Camboja, eram igualmente tortuosos e cruéis.

Secularização em países
democráticos garante 
o direito à crença 

Mas o problema é o seguinte — todas essas ditaduras sem Deus que tentaram destruir a religião à força, perseguindo os fiéis, oprimindo ativamente as instituições religiosas e criando um culto demagógico com seus governantes brutamontes. Essa secularização coerciva é, de fato, algo a temer.

No entanto, existe outro tipo alternativo de secularização, aquele que surge organicamente, em meio a sociedades livres e abertas onde os direitos humanos, incluindo a liberdade religiosa, são defendidos e respeitados.

Muitas sociedades se qualificam para esse rótulo — incluindo aquelas no Japão, Escandinávia, Reino Unido, República Tcheca, Austrália, Canadá e Uruguai, entre muitos outros.

Nesses lugares, a religião não é ativamente reprimida, nem os governos promovem a secularização. E, no entanto, ocorre simplesmente porque as pessoas que vivem nessas sociedades perdem o interesse em todo o empreendimento religioso.

A secularização orgânica pode ocorrer por vários motivos. Acontece quando os membros de uma sociedade se tornam mais educados, mais prósperos e vivem vidas mais seguras, protegidas e pacíficas; quando as sociedades experimentam aumentos no isolamento social; quando as pessoas têm melhores cuidados de saúde; quando mais mulheres têm empregos remunerados; quando mais pessoas esperam mais para se casar e ter filhos. Tudo isso, especialmente em combinação, pode diminuir a religiosidade.

Outro fator importante é a onipresença da internet, que fornece janelas abertas para visões de mundo alternativas e diferentes culturas que podem corroer a convicção religiosa — e permite que os céticos em ascensão e os livres-pensadores nascentes se encontrem, apoiem e encorajem uns aos outros.

Nos Estados Unidos, esses fatores são agravados por fortes reações contra a direita religiosa, a aliança evangélico-republicana, a agenda anti-gay da religião conservadora e os escândalos de abuso sexual da Igreja Católica. Isso resultou em “os ventos da secularização ... girando como nunca antes”, disse recentemente Ryan P. Burge, um cientista político.

Deixando de lado o medo do autoritarismo ateísta, alguns podem se preocupar com o desaparecimento das organizações religiosas por fazerem tanto bem. Eles se envolvem em uma enorme quantidade de trabalho de caridade que inclui a realização de campanhas de alimentos e a instalação de cozinhas populares e abrigos para moradores de rua. No entanto, essa caridade bem-vinda é, em última análise, uma resposta altruísta aos sintomas, não uma cura estrutural para as causas profundas.

É por isso que democracias altamente seculares fazem um trabalho muito melhor na redução da pobreza e dos sem-teto, empregando soluções decididamente seculares, como responder com políticas sociais racionais e estratégias econômicas sábias, e estabelecer instituições mais responsáveis. Moradia a preços acessíveis e assistência médica subsidiada fazem um trabalho muito melhor em aliviar o sofrimento dos pobres e doentes do que instituições de caridade baseadas na fé.

A secularidade está altamente correlacionada com uma série de orientações morais que irão melhorar significativamente nossa nação. Por exemplo, pessoas seculares — quando comparadas a seus pares religiosos — são muito mais propensas a entender e respeitar o método científico, o que resulta em sua maior disposição para se vacinar, por exemplo, e aderir a recomendações de saúde com base empírica, uma orientação racional que salva vidas.

Pessoas seculares também são mais favoráveis de educação sexual, o que reduz a gravidez indesejada e doenças sexualmente transmissíveis.

A pesquisa mostra que as pessoas seculares são mais propensas a apoiar os direitos reprodutivos das mulheres, saúde universal, direitos dos homossexuais, proteção ambiental, morte com dignidade, legislação de segurança de armas e tratamento do abuso de drogas como um problema médico em vez de criminal — tudo o que servirá para aumentar a dignidade, liberdade e bem-estar na América.

A secularização orgânica que estamos experimentando nos Estados Unidos é uma força progressiva para o bem, associada a melhores direitos humanos, mais proteções para o planeta Terra e uma maior propensão sociocultural para tornar esta vida o mais justa e justa possível — no aqui e agora — ao invés de uma recompensa celestial em que cada vez menos acreditamos.

> Esse texto foi publicado originalmente no Los Angeles Times com o título Op-Ed: Why America’s record godlessness is good news for the nation.  Phil Zuckerman é reitor associado do Pitzer College e autor de Society Without God: What the Least Religious Nations Can Tell Us about Contentment.

Moral vem da evolução, não de Deus, diz livro de Phil Zuckerman 



Movimento ateísta é forte entre judeus dos Estados Unidos


Comentários

Anônimo disse…
Enquanto isso no Brasil o STF libera cultos presenciais em plena pandemia batendo os 4 mil mortos por dia.
Dessas "filantropias" de igrejas / religiosos, sim, há as raras excessões, em particular por pessoas bondosas independente da religião, mas a maioria destas é apenas demagogia. Basicamente as religiões causam problemas muito maiores, para depois grupos destas aparecerem como "salvadores".
"Enalteça o minúsculo lado bom. Minimalize ou mesmo suprima o enorme lado ruim. Culpe os outros pelo mal." Essa é a lógica básica de quase todas as religiões / igrejas, e a maioria dos políticos...
Só faltou que nos países Socialistas / "Comunistas" o que ocorreu é a substituição, como lembrado foi à força, da religião "padrão", pela "religião" do ideal politico, inclusive com vertentes: Stalinismo, Maoísmo etc. Muitos utilizam isso como se Ateísmo fosse "o mal" ou "a causa", mas na verdade são os ideais políticos como "religiões". Afinal, tais ideais também são bem irracionais, com muitas coisas nada factíveis, mas que os adeptos acreditavam ser possíveis, mesmo à força.

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Professor obtém imunidade para criticar criacionismo nas aulas

A Corte de Apelação da Califórnia (EUA) decidiu que um professor de uma escola pública de Mission Viejo tem imunidade para depreciar o criacionismo, não podendo, portanto, ser punido por isso. A cidade fica no Condado de Orange e tem cerca de 94 mil habitantes. Durante uma aula, o professor de história James Corbett, da Capistrano Valley High School, afirmou que o criacionismo não pode ser provado cientificamente porque se trata de uma “bobagem supersticiosa”. Um aluno foi à Justiça alegando que Corbett ofendeu a sua religião, desrespeitando, assim, a liberdade de crença garantida pela Primeira Emenda da Constituição. Ele perdeu a causa em primeira instância e recorreu a um tribunal superior. Por unanimidade, os três juízes da Corte de Apelação sentenciaram que a Primeira Emenda não pode ser utilizada para cercear as atividades de um professor dentro da sala de aula, mesmo quando ele hostiliza crenças religiosas. Além disso, eles também argumentaram que o professor não ...

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Reação de aluno ateu a bullying acaba com pai-nosso na escola

O estudante já vinha sendo intimidado O estudante Ciel Vieira (foto), 17, de Miraí (MG), não se conformava com a atitude da professora de geografia Lila Jane de Paula de iniciar a aula com um pai-nosso. Um dia, ele se manteve em silêncio, o que levou a professora a dizer: “Jovem que não tem Deus no coração nunca vai ser nada na vida”. Era um recado para ele. Na classe, todos sabem que ele é ateu. A escola se chama Santo  Antônio e é do ensino estadual de Minas. Miraí é uma cidade pequena. Tem cerca de 14 mil habitantes e fica a 300 km de Belo Horizonte. Quando houve outra aula, Ciel disse para a professora que ela estava desrespeitando a Constituição que determina a laicidade do Estado. Lila afirmou não existir nenhuma lei que a impeça de rezar, o que ela faz havia 25 anos e que não ia parar, mesmo se ele levasse um juiz à sala de aula. Na aula seguinte, Ciel chegou atrasado, quando a oração estava começando, e percebeu ele tinha sido incluído no pai-nosso. Aparentemen...

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

Ateus são o grupo que menos apoia a pena de morte, apura Datafolha

Aluno com guarda-chuva se joga de prédio e vira piada na UERJ

"O campus é depressivo, sombrio, cinza, pesado" Por volta das 10h de ontem (31 de março de 2001), um jovem pulou do 11º andar do prédio de Letra da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e virou motivo de piadinhas de estudantes, no campus Maracanã e na internet, por ter cometido o suicídio com um guarda-chuva. Do Orkut, um exemplo: "Eu vi o presunto, e o mais engraçado é que ele está segurando um guarda-chuva! O que esse imbecil tentou fazer? Usar o guarda-chuva de paraquedas?" Uma estudante de primeiro ano na universidade relatou em seu blog que um colega lhe dissera na sala de aula ter ouvido o som do impacto da queda de alguma coisa. Contou que depois, de uma janela do 3º andar, viu o corpo. E escreveu o que ouviu de um estudante veterano: “Parabéns, você acaba de ver o seu primeiro suicídio na UERJ.” De fato, a morte do jovem é mais uma que ocorre naquele campus. Em um site que deu a notícia do suicido, uma estudante escreveu: “O campus é depressivo, s...

Por que é absurdo considerar os homossexuais como criminosos

Existem distorções na etimologia que vem a antiguidade AURÉLIO DO AMARAL PEIXOTO GAROFA Sou professor de grego de seminários, também lecionei no seminário teológico da igreja evangélica e posso dizer que a homofobia católica e evangélica me surpreende por diferentes e inaceitáveis motivos. A traduções (traições), como o próprio provérbio italiano lembra ( traduttore, tradittore ) foram ao longo dos séculos discricionariamente destinadas a colocar no mesmo crime etimológico, categorias de criminosos sexuais que na Antiguidade distinguiam-se mais (sobretudo na cultura grega) por critérios totalmente opostos aos nossos. O que o pseudoepígrafo que se nomeia Paulo condenava eram os indivíduos de costumes torpes, infames, os quais se infiltravam em comunidades para perverter mocinhas e rapazinhos sob pretexto de "discipulado" e com fins de proveito sexual. Nada diferente de hoje, por isso vemos que a origem da efebofilia e pedofilia católica e evangélica é milenar. O fato...

No noticiário, casos de pastores pedófilos superam os de padres