Pular para o conteúdo principal

Desafio da humanidade na era pós-Covid-19 será obter a solidariedade global, diz Harari

Enrico Franceschini / La Repubblica    A tempestade do coronavírus vai passar, mas as escolhas que fazemos hoje mudam nossas vidas por muito tempo”.

É a profecia de Yuval Noah Harari, historiador israelense de 44 anos que, com três best-sellers mundiais em rápida sucessão, Sapiens: Breve história da humanidade; Homo Deus. Breve história do amanhã e 21 lições para o século XXI e tornou-se recentemente um dos intelectuais mais seguidos do planeta.

O desafio proposto pelo Covid-19, segundo Harari, agora deve pressionar a humanidade a "fechar as fronteiras entre os vírus e o homem", e não entre nações, a escolher "a solidariedade global”, não o nacionalismo isolacionista, a ouvir líderes que "querem unir" seus povos, não os dividir.

"Em suma, deve nos abrir, em vez de nos fechar em nós mesmos, emancipar os cidadãos, em vez de fortalecer o controle totalitário", fala ele ao La Repubblica por telefone de Tel Aviv onde mora com o marido em um moshav, as comunidades agrícolas judias semelhantes aos kibutz, praticando veganismo e meditação.

HISTORIADOR DIZ QUE AS
DECISÕES DE AGORA SERÃO
FUNDAMENTAIS PARA O FUTURO


Essa pandemia é a maior crise global de nossa geração, professor?

Parece definitivamente que sim. Agora, envolve o mundo inteiro e terá profundas consequências, tanto do ponto de vista da saúde quanto do econômico. 

A tempestade do vírus passará em algum momento, mas escolhas que fazemos hoje para enfrenta-la mudarão nossas vidas por muito tempo.

É um desafio maior do que o apresentado pela crise financeira de 2008 e pelas mudanças climáticas?

Maior que o colapso financeiro, porque não é apenas uma crise econômica, mas pode transformar todos os aspectos de nossa vida social. Não é maior que a mudança climática, porque temos as ferramentas para resolvê-la positivamente, de forma relativamente rápida em comparação com os danos causados pela poluição. Mas se fizermos as escolhas erradas, a crise do coronavírus também terá sérias repercussões a longo prazo.

Que escolhas? Parafraseando o título do seu livro mais recente, o coronavírus contém uma vigésima segunda lição?

Primeiro de tudo, dois: entre nacionalismo isolacionista e solidariedade global; e entre controle totalitário e emancipação dos cidadãos. 

Vamos pegar o primeiro: cada país pode tentar enfrentar a pandemia individualmente ou pode escolher um plano de ação abrangente.

O segundo é escolher entre a tentação totalitária de controlar qualquer contágio de cima, com o Estado aplicando qualquer medida indiscriminadamente, ou dar aos cidadãos mais voz e responsabilidade, reconhecer que apenas uma população com alta instrução e forte senso cívico pode entender o que é necessário parar o vírus.

Espero claramente que a segunda opção prevaleça em ambos os casos, caso contrário teremos um mundo fechado sobre si mesmo, menos seguro e menos democrático.

A pandemia não levará ao fim da globalização?

Para mim, isso deve levar a uma melhor globalização. Fechar-se é a resposta errada. As pandemias também existiam em um mundo fechado como o da Idade Média, quando a Peste Negra matou um terço da população da Terra. Devemos voltar à Idade da Pedra, na qual os humanos viviam em pequenos aglomerados sem contato entre si, para ver um modelo de sociedade fechada à prova de epidemias.



Hoje apenas a cooperação, a solidariedade e um esforço comum de todos podem resolver o problema e levar nossa civilização um passo adiante. As fronteiras entre os vírus e o homem devem ser fechadas, e não entre homem e homem, entre nação e nação.

No entanto, "globalização" é um termo que muitos no Ocidente continuam a considerar negativo.

A globalização não pode ser julgada em preto ou branco. Até a comida italiana é um produto da globalização. Sempre foi assim: foram os conquistadores espanhóis que levaram tomates da América Latina para a Itália. Se alguém é contra a globalização, não deveria mais comer espaguete com molho de tomate.

Você escreveu que falta liderança global neste 2020 de crises sem precedentes. No passado, nas duas guerras mundiais e ao longo do século XX, foram os Estados Unidos que a forneceram. Pode voltar a ser, se Biden derrotar Trump, ou depende de outros?

No momento, os Estados Unidos nem sequer estão tentando fornecer uma liderança global. Além do fato de Trump inicialmente negar que o coronavírus fosse uma ameaça séria e depois adiar a intervenção, mesmo agora continua dizendo "America first", primeiro a América: e ele está conseguindo o que queria, a América tornou-se a primeira nos contágios e nas vítimas. 

Mas mesmo que Trump perdesse e Biden chegasse à Casa Branca em novembro, a erosão da confiança nos Estados Unidos nos últimos quatro anos foi tão profunda que não será fácil nem rápido recuperá-la. Para ter liderança global, o mundo não pode esperar a cada quatro anos para ver quem é o Presidente dos Estados Unidos: é preciso contar mais com outros países e especialmente com instituições internacionais, com o multilateralismo, da ONU à União Europeia, do G20 à Organização Mundial da Saúde.

Espero que a crise do coronavírus sirva também para destacar a necessidade de cooperação e solidariedade globais.

O que você acha da maneira como a Itália está lidando com a pandemia?

Vi muitos sinais encorajadores de solidariedade, de espírito comunitário, de cooperação. Também podem ser vistos, na Itália como em outros lugares, de outro tipo: incitação ao ódio contra estrangeiros, tentativas de dividir não apenas nação de nação, mas também cidadãos de um mesmo país. 

Quem pensa diferente de você não é mais considerado um oponente legítimo, mas um traidor da pátria. Bem, em tempos mais ou menos normais, é possível governar com 51% dos consentimentos, colocar metade mais um de um país contra metade menos um. Mas em uma crise como essa pandemia, seria catastrófico tentar fazer isso. 

Aqui está outra lição a ser aprendida com o coronavírus: a necessidade de liderança que uma as nossas sociedades em vez de dividi-las, como os populistas e nacionalistas tentam fazer.

Mas onde você se sente melhor em casa? No seu moshav? Na cidade velha de Jerusalém? Na cosmopolita praia de Tel Aviv?

Eu moro em um moshav, uma comunidade agrícola, gosto porque é tranquilo, mas ao mesmo tempo perto de uma cidade vibrante e cosmopolita, como você a definiu corretamente, que é Tel Aviv. Vou a Jerusalém porque ensino história na Universidade Hebraica, mas a Cidade Santa é um lugar cheio de tensões, onde muitas pessoas odeiam muitas outras pessoas. Sente-se no ar. Eu não moraria lá.

A situação política em Israel está longe de ser tranquila...

Estamos em uma época de caos, à qual o coronavírus acrescentou a tentação de manipular a pandemia para introduzir o estado de emergência, medidas especiais. É um risco que outros países também corram: a ascensão de regimes antidemocráticos sob o pretexto de combater o Covid-19.

E como é uma sua disciplina diária, sugere a meditação a muitos de nós que são forçados nesses dias a permanecer trancados em suas casas?

Pratico duas horas por dia, mesmo em tempos normais, ajuda-me a ter um equilíbrio. Afinal, a meditação ajuda você a conhecer a si mesmo, suas ansiedades, seus medos, que continuam a existir, mas você aprende a conviver com eles e a controlá-los. E em tempos de grandes crises como essa, há uma grande necessidade de equilíbrio e conhecimento.

Com tradução de Luisa Rabolini para IHU Online.





Vídeo: Quarentena, brigas políticas, remédios polêmicos. É a Gripe espanhola de 1918!

20 fatos que você precisa saber sobre entubação

Vídeo: prefeito que disse que cura da Covid-19 virá da igreja é internado

'Internet Segura' adverte para onda de golpes na quarentena

Cidade de Nova York improvisa necrotério fora de hospital

Psicóloga diz como é possível manter o equilíbrio emocional em tempo de pandemia

13 teorias da conspiração sobre o coronavírus. Ou: a bolsa ou a vida?

Microbiologista critica a negação à ciência e alerta que o Covid-19 mudou o mundo




Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Dias sofre ameaça de morte por pedir retirada de Deus do real

"Religião também é usada para violar os direitos humanos" O procurador Jefferson Aparecido Dias (foto), da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal em São Paulo, vem sofrendo ameaças de morte desde que deu entrada a uma ação na Justiça pedindo a retirada da expressão “Deus seja louvado” das cédulas real. “Eu estou sendo ameaçado por causa dessa ação, por cristãos”, disse em entrevista a Talita Zaparolli, do portal Terra. “Recebi alguns emails com ameaças, em nome de Deus.” O procurador tem se destacado como defensor da laicidade do Estado brasileiro. Em 2009 ele ajuizou uma ação pedindo a retirada de símbolos religiosos das repartições públicas federais. Dias, que é católico, recorreu à Bíblia para defender a laicidade prevista na Constituição. “Em nenhum momento Jesus deu a entender, para quem é cristão, que o dinheiro deveria trazer o nome dele ou o nome de Deus”, disse. “Acho que é uma inversão de valores.” Na entrevista, ele...

BC muda cédulas do real, mas mantém 'Deus seja Louvado'

Louvação fere o Estado laico determinado pela Constituição  O Banco Central alterou as cédulas de R$ 10 e R$ 20, “limpou” o visual e acrescentou elementos de segurança, mas manteve a expressão inconstitucional “Deus seja Louvado”.  As novas cédulas, que fazem parte da segunda família do real, começaram a entrar em circulação no dia 23. Desde 2011, o Ministério Público Federal em São Paulo está pedindo ao Banco Central a retirada da frase das cédulas, porque ela é inconstitucional. A laicidade determinada pela Constituição de 1988 impede que o Estado abone qualquer tipo de mensagem religiosa. No governo, quanto à responsabilidade pela manutenção da frase, há um empurra-empurra. O Banco Central afirma que a questão é da alçada do CMN (Conselho Monetário Nacional), e este, composto por um colegiado, não se manifesta. Em junho deste ano, o ministro Marco Aurélio, do STF (Supremo Tribunal Federal), disse que a referência a Deus no dinheiro é inconcebível em um Estado mode...

Malafaia desmente fim de acordo entre sua editora e Avon

com atualização em 22 de junho de 2012 Pastor diz que falsa notícia foi safadeza de gays Silas Malafaia (foto) desmentiu a informação divulgada pelo site "A Capa", do movimento gay, e reproduzida por este blog segundo a qual a Avon tirou do seu catálogo os livros da Editora Central Gospel. Para o pastor, trata-se de “mais uma mentira e safadeza de ativistas gays, o que é bem peculiar do caráter deles”. Na versão de "A Capa", no folheto “Moda e Casa” que a Avon divulgou no dia 13 de junho não tem nenhum livro da editora de Malafaia e que isso, segundo o site, é o desdobramento da campanha que ativistas gays moveram na internet contra a empresa de cosméticos. Malafaia informou que a Bíblia que consta no folheto é de sua editora e que é comum em algumas quinzenas a Avon não divulgar os livros da Central Gospel. A firmou que o acordo entre a editora e a Avon tem uma programação de distribuição de livros até o final do ano. O pastor criticou os sites...

Menina morta por jejum religioso deixou diário com relatos de maus-tratos

Adventistas vão intensificar divulgação do criacionismo

Consórcio vai investir em pesquisa na área criacionista A Igreja Adventista do Sétimo Dia anunciou o lançamento de um consórcio para intensificar a divulgação do criacionismo no Brasil e em outros países sul-americanos. Na quinta-feira (13), em Brasília, entidades como Sociedade Criacionista Brasileira, Núcleo de Estudos das Origens e Museu de Geociências das Faculdades Adventistas da Bahia assinaram um protocolo para dar mais destaque à pesquisa criacionista e às publicações sobre o tema. Os adventistas informaram que o consórcio vai produzir vídeos para adolescentes e jovens explicando a criação e como ocorreu o dilúvio e um plano piloto de capacitação de professores. O professor Edgard Luz, da Rede de Educação Adventistas para oitos países sul-americanos, disse que o lançamento do consórcio é um “passo muito importante”, porque “o criacionismo está ligado à primeira mensagem angélica da Bíblia”. Com informação do site da Igreja Adventista . Colégio adventista de ...

Arcebispo defende permanência de ‘Deus’ em notas do real

Dom Scherer diz que descrentes não deveriam se importar   Dom Odilo Scherer (foto), arcebispo metropolitano de São Paulo, criticou a ação que o MPF (Ministério Público Federal) enviou à Justiça Federal solicitando a determinação no sentido de que a expressão “Deus seja louvado” deixe de constar nas cédulas do real. Em nota, Scherer disse: "Questiono por que se deveria tirar a referência a Deus nas notas de real. Qual seria o problema se as notas continuassem com essa alusão a Deus?" Argumentou que, “para quem não crê em Deus, ter ou não ter essa referência não deveria fazer diferença. E, para quem crê em Deus, isso significa algo”. O promotor Jefferson Aparecido Dias, autor da ação, defendeu a supressão da expressão porque o Estado brasileiro é laico e, por isso, não pode ter envolvimento com nenhuma religião, mesmo as cristãs, que são professadas pela maioria da população. Scherer, em sua nota, não fez menção ao Estado laico, que está previsto na Constituição. E...

Por que Deus puniu Adão e Eva antes de eles saberem do mal?

por Austin Cline , do About.com Adão e Eva não sabiam sobre o errado,  mas foram punidas Gênesis, o primeiro livro da Bíblia, diz que Deus castigou Adão e Eva porque comeram do fruto da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal. Essa é mais uma contradição bíblica. Deus determinou que Adão não experimentasse o fruto, o que não faz sentido porque a criatura, até então, não tinha o discernimento para fazer qualquer juízo de valor. Pois é óbvio que, antes comerem o fruto,  Adão e Eva não podiam compreender que obedecer a Deus era o “bem” e desobedecer, o “mal”. Para eles, a desobediência não tinha nenhum significado em si, nem de certo nem de errado. Está em Gênesis 3: 17-19: “E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do t...

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus