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No Chile, 30% da população estão no grupo dos sem religião, agnósticos e ateus

Pároco em Santiago fala sobre sua trajetória que culmina com o fim da hegemonia do catolicismo no país, onde continua o avanço da secularização 


JOSÉ MARIA VIGIL
teólogo espanhol
naturalizado nicaraguense

Religión Digital

Para nos contar sobre a situação atual da religião no Chile, desta vez chamamos um padre, pároco em Santiago. Com ele a palavra:

"Sou chileno e nasci durante o Concílio Vaticano II. Testemunhei os esforços da Igreja Católica, com sucessos e retrocessos, para aplicar o concílio à realidade chilena. Fiquei grato pelo papel que, em geral, a Igreja desempenhou durante a ditadura de Pinochet, mostrando-se samaritana e corajosa na defesa dos direitos humanos. 

Foram anos em que a Igreja gozou de amplo reconhecimento e prestígio nacional e internacional.

Ordenado padre, fui para a África do Sul, para compartilhar o Evangelho com comunidades negras pobres e marginalizadas, no início da era pós-apartheid.

Quando retornei ao Chile, após meus 20 anos de experiência africana, o apreço e a adesão à Igreja chilena haviam despencado. 

Dou uma simples anedota, como símbolo: na primeira semana de meu retorno ao Chile, fui aos escritórios do Arcebispado de Santiago e presenciei uma situação que me chocou profundamente: um homem de meia idade pediu para fazer o processo de apostasia.

O que aconteceu naqueles 20 anos? A análise completa daria origem a um estudo que não cabe aqui, mas quero mencionar alguns fatores decisivos:

• a crescente privatização da fé desde a chegada da democracia e uma diminuição do papel profético e uma menor participação da Igreja Católica nas mudanças sociais do país;

• a explosão devastadora de denúncias de abusos sexuais eclesiais desde 2010;

• a mudança cultural que muitos chamam de secularização.

Ora, essa tendência de queda é antiga: se em 1930 um total de 97,7% dos chilenos se dizia católico, quando me mudei para a África, em 1998, esse número já havia caído para 72% (em quase 70 anos, a queda representava 25%). 

Mas, agora, o colapso se acelerou: desses 72%, caiu para os atuais 48%, em apenas duas décadas! Pela primeira vez, a Igreja Católica caiu dos 50% de membros psicologicamente relevantes.

E não é só a Igreja Católica que passa por isso. Nos anos 90 (pós-ditadura) as igrejas evangélicas de corte pentecostal cresceram muito. 

Era comum que, quando um católico saísse da Igreja, fosse a uma delas. Hoje isso não acontece mais, e eu já vi isso com muita gente: quando um católico sai da Igreja Católica, ele não vai mais para outra, mas fica sem nenhuma igreja institucional. 

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Os números confirmam isto: no Chile, a queda da filiação religiosa (ou seja, a queda daqueles que pertencem ou se sentem próximos a uma religião) triplicou nas últimas duas décadas (ou seja, desde 2000).

É claro que aqueles que deixam as igrejas não se tornam necessariamente agnósticos, nem ateus, mas engrossam as fileiras daqueles que "acreditam sem pertencer". 

Especialistas dizem que isso é tipicamente indicativo de um processo de secularização ainda em andamento. E mostra: há um novo e robusto 30% da população chilena que hoje se encontra no grupo dos "sem religião - agnóstico - ateu". 70% acreditam em Deus. 

Assim, vê-se que esse panorama de crenças e pertences religiosos está iniciando uma etapa diferente, de grande magnitude. 

Os paliativos pastorais (reformas eclesiais do tipo sinodal, por exemplo) têm sua importância, mas me parece que a tendência indicada continuará seu curso. São novos desafios. Terão de ser aceitos, compreendidos e respondidos em conformidade, com coragem e criatividade.

O santo chileno mais popular, o padre Alberto Hurtado, escreveu um livro altamente polêmico há mais de 80 anos, intitulado "O Chile é um país católico?" 



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