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Professores que ensinam teoria da evolução sofrem perseguição, mostra pesquisa. O tema consta no currículo

Docentes relatam censura, demissões e medo em sala de aula ao abordar temas obrigatórios. Estudo aponta aumento da violência nas escolas a partir de 2016 e insegurança entre profissionais


Professores de ciências que ensinam a teoria da evolução sofrem perseguição de pais e de diretores de escola. Isso ocorre embora tal matéria conste da grade oficial de ensino.

A informação é da pesquisa “Violência contra educadores como ameaça à educação democrática”. O trabalho foi realizado pelo Observatório Nacional da Violência Contra Educadoras/es (ONVE), da UFF (Universidade Federal Fluminense), em parceria com o Ministério da Educação.

Alguns pais abordam os professores solicitando que se ensine o criacionismo, e não a teoria de Darwin. A validade da evolução está comprovada pela ciência.

“Professores que tentam fazer o trabalho de levar o conhecimento às crianças e adolescentes acabam sendo demitidos, transferidos”, afirmou o professor Fernando Penna, coordenador da pesquisa.

Participaram da pesquisa 3.012 profissionais da educação básica e superior do ensino público e privado de todo o país.

Houve registros de variados tipos de censura e violência aos professores. Os relatos incluem, além de temáticas das aulas, perseguição política e agressões físicas.


Nove em cada
dez professores
da educação
básica e superior
já foram
perseguidos
diretamente.
Ou presenciaram
perseguições e
censura contra
profissionais da
educação.
O dado abrange
o ensino público
e o privado em
todo o país.

Fernando Penna afirma que a censura se tornou um fenômeno disseminado pelo território brasileiro. Ela ocorre em todos os níveis e etapas da educação. Não engloba só o professor na sala de aula, mas todos que trabalham na área.

A pesquisa mostrou um percentual alto de professores vítimas diretas da violência. 

Na educação básica, o índice registrou 61%. No nível superior, foi de 55%. Penna destaca que, mesmo um pouco menor no ensino superior, o número ainda supera a metade dos casos.

Tipos de punição e violência

Entre os educadores censurados, 58% relataram tentativas de intimidação. Outros 41% sofreram questionamentos agressivos sobre seus métodos de trabalho. Já 35% enfrentaram proibições explícitas de conteúdo.

Os educadores relataram casos de demissões (6%) e suspensões (2%). A mudança forçada do local de trabalho atingiu 12%. A remoção do cargo ou função ocorreu com 11% dos entrevistados.

A violência verbal também é frequente. Agressões verbais e xingamentos foram citados por 25% dos participantes. As agressões físicas chegaram a 10%.

Fernando Penna analisa que a violência e a censura já estão enraizadas no Brasil. Isso ocorre tanto nas instituições de educação básica quanto na superior. Ele considera o fato preocupante pois envolve temáticas obrigatórias.

Vacinas e negacionismo

O coordenador citou um exemplo ocorrido no interior do Rio de Janeiro. Durante a pandemia da Covid-19, um professor usou material do Ministério da Saúde. O conteúdo trazia orientações sanitárias e a importância da vacinação.

O docente foi impedido de prosseguir sob argumento de “doutrinação”. Ao entregar o material à diretora da escola, ouviu uma recusa. Ela disse que na escola não haveria “doutrinação de vacina”.

A pesquisa identificou professores proibidos de tratar temas como violência sexual na sala de aula. O assunto permite alertar o aluno sobre abusos que ocorrem em casa.

Jovens costumam denunciar o autor da violência após aulas sobre orientação sexual e gênero. Eles percebem que a violência no espaço privado não é natural. Penna ressalta a importância de o tema ser tratado no ambiente escolar.

Política e sexualidade na mira

A discussão envolvendo gênero e sexualidade foi o motivo mais indicado para a violência sofrida pelos professores. O estudo deixa claro que isso impacta a liberdade de ensinar e de aprender. Estudantes deixam de discutir temáticas vitais para a sua formação.

Os temas que motivaram questionamentos foram liderados por questões políticas (73%). Em seguida aparecem questões de gênero e sexualidade (53%). Questões de religião motivaram 48% e o negacionismo científico, 41%.

A pesquisa perguntou os anos em que a violência ocorreu. A hipótese é que existe relação com a polarização política atual. Trata-se de uma polarização assimétrica entre uma extrema direita e uma centro-esquerda.

Os dados configuraram um gráfico que mostra o aumento da violência a partir de 2010. Ocorre um pico em 2016, 2018 e 2022. São os anos do impeachment e de duas eleições presidenciais. A tensão política do país entrou nas escolas.

Agentes da agressão escolar

Os educadores citaram membros da própria comunidade escolar como agentes da violência. Isso inclui a direção, coordenação, famílias e estudantes. O dado mostra que a agressão já está dentro das comunidades educativas.

Membros da comunidade interna lideram a violência dentro da escola. Profissionais da área pedagógica representam 57% dos casos. Familiares dos estudantes aparecem com 44% e os próprios alunos com 34%.

Professores agredindo colegas somam 27%. Profissionais da administração representam 26% e funcionários, 24%. Secretarias de educação ou reitorias respondem por 21% dos casos.

O quadro de perseguição envolve política institucional e partidária. Abre espaço também para dimensões políticas da vida comum. O crescimento da violência observado vincula-se ao dado político do momento. O tema tenciona as relações.

Impacto na carreira docente

A perseguição foi extremamente impactante para 33% dos educadores na vida profissional e pessoal. Para 39%, foi bastante impactante. A consequência é que grande parte acaba deixando a profissão.

Penna confirma o chamado “apagão” dos professores. Ele afirma que isso foi uma das ferramentas de manipulação política. O pânico moral foi usado pela extrema-direita nos anos recentes.

Os educadores não precisam ser vítimas diretas para sofrerem o impacto. Quando a violência acontece em uma escola ou universidade, ela degrada o clima escolar.

A maioria dos educadores afetados citou insegurança e desconforto no cotidiano. O desconforto com o espaço de trabalho foi o terceiro maior impacto, citado por 53%. Isso levou 20% a mudarem de local de trabalho por iniciativa própria.

Medo e autocensura

As pessoas sentem medo de discutir temas. Sentem medo de fazer o trabalho conforme sua formação e saberes. O dano para a sociedade é gigantesco. Professores evitam assuntos como gênero para não serem prejudicados.

Cerca de 45% dos professores se sentem constantemente vigiados. Isso leva à censura sobre o que falam em sala. Professores de escolas privadas entendem que abordar certos assuntos traz risco de demissão.

O educador precisa do emprego e às vezes sofre ameaças no território onde vive. Penna argumenta que é preciso reconhecer esse problema da sociedade brasileira. Educadores temem trabalhar de acordo com seu saber profissional.

Profissionais que produzem conhecimento seguro são vítimas. Isso inclui quem é capaz de desmascarar mentiras e teorias da conspiração. Jornalistas também sofrem perseguição intensa, como mostram dados de outros observatórios.

Regiões mais afetadas

O medo de discutir temas abertamente foi mais identificado no Sudeste e no Sul. Nessas regiões houve mais registros de professores passando por situações de violência direta.

O dado não causou espanto ao coordenador da pesquisa. Santa Catarina foi um dos estados com mais respondentes no Sul. Penna afirma ser um local onde a extrema direita tem força e há muitos casos de violência conhecidos.

Nas cinco regiões brasileiras, 93% dos educadores tiveram contato com situações de censura. Desses, 59% passaram diretamente pela situação. Outros 19% souberam que aconteceu com alguém e 15% ouviram falar.

É necessário criar ações para proteger os professores. Sabe-se que a tendência é a violência recrudescer em anos de eleição presidencial. Ela se torna mais intensa nesses períodos.

Ações futuras e proteção

O banco de dados gerado permitirá novos cruzamentos e análises. Será possível analisar os estados separadamente. A segunda etapa da pesquisa envolverá entrevistas com 20 professores pelo país.

Outros relatórios vinculados a essa pesquisa inicial serão divulgados. O relatório completo sugere a criação de uma política nacional de enfrentamento à violência contra educadores.

Essa política já estaria em elaboração no âmbito do MEC. O Observatório mantém um acordo de cooperação técnica com o Ministério dos Direitos Humanos.

Penna insiste que educadores trabalhem na perspectiva dos direitos humanos. Eles são justamente os que mais sofrem violência. A demanda é que sejam reconhecidos como defensores desses direitos e incluídos em políticas específicas de proteção.

> Com informação MEC e de outras fontes. A ilustração foi gerada por IA.


Comentários

CBTF disse…
Os pais tratam os professores como vilões querendo destruir a inocência das crianças. Sendo que na verdade é o oposto que ocorre, os alunos praticam bullying, atrapalham as aulas, humilham os professores e os colegas e ainda são super protegidos por pais que aprenderam a demonizar culturas e professores pelas redes sociais da extrema direita.

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