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Paquistão lota presídios com pessoas acusadas de blasfemar contra o Islã

Em um Paquistão de maioria sunita, o crime de blasfêmia condena centenas de pessoas a apodrecerem nas prisões. Um simples comentário na internet, por exemplo, pode significar a desgraça de uma pessoa, levando-a a ser caçada por justiceiros e arruinando a vida de famílias inteiras.


As prisões dispararam desde 2023, saltando de dezenas para centenas anualmente, especialmente após o endurecimento das leis para acusações de blasfêmia contra o Islã na internet. 

O país já chegou a censurar o Twitter (hoje X) em 2012 por publicar caricaturas do profeta Maomé.

Para muitos paquistaneses, a blasfêmia é um crime hediondo, e muitas vezes não são necessárias provas para garantir uma condenação. Rumores podem desencadear manifestações violentas e turbas assassinas. 

O crime pode levar à pena de morte, embora ninguém tenha sido executado por isso. Políticos e advogados que tentaram contestar essas leis foram assassinados. 

Muitos dos acusados alegam ter sido vítimas de cibercriminosos que buscavam extorquir dinheiro ou inflar o número de prisões por blasfêmia.



Especialistas em direitos humanos afirmam que a suposta onda de blasfêmia, fabricada ou não, é uma forma de grupos islâmicos ganharem apoio público e financiamento, sob o pretexto de defender a santidade religiosa.

O caso de Shahida Bibi, que mora na capital Islamabad, ilustra esse cenário de gravidade. 

Em 2023, quatro homens bateram em sua porta e levaram seu filho sob custódia, acusando-o de blasfêmia online. O crime? Ter encaminhado uma imagem sexualmente explícita sobreposta a uma escritura islâmica, que havia sido enviada a ele por uma mulher que se passava por recrutadora de empregos. 

A mãe relata que o filho, que buscava desesperadamente uma oportunidade, foi atraído para uma emboscada, sendo espancado e preso. A única imagem encaminhada tornou-se a base para a acusação de blasfêmia.

O relato de Shahida Bibi, embora não possa ser verificado de forma independente, corresponde a um padrão que se tornou comum, conforme apurado pelo New York Times, que analisou documentos judiciais e transcrições de conversas que incriminaram pessoas em casos semelhantes. 

O filho de Shahida, com 26 anos, está preso há mais de dois anos, aguardando o veredito de seu caso, um destino compartilhado por centenas de pessoas detidas por blasfêmia online. O risco de violência impede a divulgação de nomes de acusados e suas famílias.

Um relatório governamental de outubro de 2023 revelou um aumento acentuado nas prisões por blasfêmia online: 11 casos em 2020, 9 em 2021, 64 em 2022, e um salto para 213 em 2023 e 767 nos primeiros sete meses de 2024. 

A maioria dos casos não é conduzida pelo Estado, mas por grupos privados com advogados e voluntários que monitoram as redes sociais. Segundo Peter Jacob, diretor executivo do Centro de Justiça Social do Paquistão, essa crescente “politização das leis de blasfêmia” transforma a punição em uma causa para esses grupos.

> A apuração dessa reportagem foi feita por Zia ur-Rehman, Rawalpindi e Karachi para o New York Post. Texto também contém informações de Paulopes.

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