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Apenas um de 81 projetos para economia marítima brasileira beneficiou comunidades tradicionais

A economia marítima brasileira, chamada de Economia Azul, é frequentemente apresentada como uma oportunidade para conciliar crescimento econômico e sustentabilidade. Porém, ela tem se desenvolvido de forma desigual, ignorando os povos do mar e comunidades pesqueiras tradicionais, afastadas da distribuição dos benefícios oceânicos.


Agência Bori
serviço de apoio à imprensa na cobertura da ciência 
 
Publicado em 4 de setembro na revista Desenvolvimento e Meio Ambiente, o trabalho mostra que os investimentos nacionais priorizam o potencial de grandes empreendimentos econômicos e setores como petróleo e gás, indústria naval, portuária, transporte marítimo, turismo, biotecnologia marinha e mineração em mar profundo.

Os pesquisadores analisaram as interações entre a pesca artesanal e as políticas de Economia Azul no Brasil entre 2012 e 2020. 

Para isto, revisaram literatura acadêmica e relatórios técnicos, analisaram dados de cinco plataformas nacionais e internacionais sobre conflitos socioambientais e levantaram informações sobre investimentos de cinco bancos e agências internacionais.



Dos 1.459
projetos
identificados
no Brasil no
período, 81
foram
classificados
como ligados
à Economia
 Azul, com
investimentos
de US$ 4 bi
(R$ 22 bi).
Porém, só um
deles, com
valor de
US$ 1.500
(R$ 8 mil), foi
diretamente
voltado à
pesca e
aquicultura,
indicando
baixa
prioridade
para o setor.

O artigo identificou, no período, 133 casos de conflitos envolvendo pesca artesanal no país. Eles estão ligados a desenvolvimento costeiro, mudanças no uso do território (como degradação ambiental, especulação imobiliária e restrições de acesso) e atividades do setor energético, especialmente no Sudeste e Nordeste, como exploração de petróleo, energia eólica e usinas.

Iniciativas rotuladas como Economia Azul podem ser vistas como “projetos de morte” para essas comunidades, ameaçando seus territórios, causando degradação ambiental, perda de acesso a recursos e violação de direitos humanos, sem consulta prévia, livre e informada, conforme define uma das lideranças do setor da pesca entrevistadas pela pesquisa.

A pesquisadora Deborah Prado, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e uma das autoras do artigo, comenta: “O que nos surpreendeu foi a clareza com que o cruzamento dos dados sobre conflitos e injustiças vivenciadas pelas comunidades a partir de uma série de base de dados revelou-se alinhado ao baixo investimento no setor, evidenciando um cenário mais crítico do que imaginávamos”.

Para fortalecer as comunidades pesqueiras e ribeirinhas e garantir uma Economia Azul mais justa — uma “Justiça Azul” —, os pesquisadores sugerem políticas que garantam a proteção dos territórios tradicionais de pesca, os “maretórios”, assegurando o acesso seguro ao espaço marinho e aos recursos; e a implementação de regulamentações e legislações específicas que considerem as particularidades e a diversidade da pesca artesanal.

“Valorizar a cadeia produtiva do pescado artesanal significa fortalecer a resiliência dessas populações, preservar conhecimentos ecológicos tradicionais e contribuir para um modelo de Economia Azul mais inclusivo e sustentável”, explica Deborah Prado.

O grupo de pesquisa pretende dar continuidade aos estudos sobre o tema, visto que as análises do artigo abrangem dados até o ano de 2020.

As futuras pesquisas buscarão avaliar a participação social das comunidades pesqueiras nesse processo e como avançar em arranjos de governança costeira e marinha que sejam mais equitativos.

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