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Água não é infinita e é preciso saber usá-la para evitar a escassez

Água deve ser usado com parcimônia porque a produção de alimentos depende dela 



José Martínez Fernández

professor de Geografia Física, Universidade de Salamanca, Espanha

The Conversation
plataforma de informação e análise produzida por acadêmicos e jornalistas

O Dicionário da Real Academia Espanhola define o termo percepção como a “sensação interior que resulta de uma impressão material produzida nos sentidos corporais” ou como “conhecimento, ideia”.

A percepção dos problemas ambientais que nos rodeiam pode ser um obstáculo para podermos enfrentá-los adequadamente. A transmissão do conhecimento por meio da divulgação é uma ferramenta essencial para a conscientização social. Sem a cumplicidade de uma sociedade informada, será difícil resolver adequadamente os problemas da água.

Há algum tempo, durante um dia de trabalho de campo, tive a oportunidade de passar um bom tempo explicando a um agricultor que irrigava a sua parcela com água subterrânea a necessidade de aproveitar bem o recurso (aplicar a dose adequada, no horário mais conveniente).

Transmiti ao homem que, caso contrário, ele extrairia mais água do que o necessário e, com isso, contribuiria para a superexploração do aquífero.

O uso da água
tem de ser consciente

Após alguns momentos de reflexão e descrença, o agricultor questionou o meu argumento com uma alteração na íntegra e uma frase lapidar: “Para quê? Se a água nascer lá.” Isso estaria próximo do que expressa o primeiro significado do dicionário.

Infelizmente, a percepção de uma parte importante da sociedade relativamente aos problemas ambientais, em geral, e aos problemas hídricos, em particular, está em linha com o que foi expresso por aquele agricultor. Ele baseou a sua ideia na existência de um recurso infinito, baseado no seu empirismo e numa transmissão de conhecimento provavelmente secular.

O ano de 2025 marca 50 anos desde a publicação do relatório do Clube de Roma (Os Limites do Crescimento) sobre os limites do crescimento, e a realidade mostra que ainda há muito a fazer neste sentido. 

O imenso avanço da ciência e da tecnologia em matéria de água é de pouca utilidade se os utilizadores finais do recurso, os cidadãos, continuarem a operar com base na ignorância ou na desinformação.

Percepção, eficiência e riscos

Qualquer esforço feito em termos de divulgação e sensibilização pode ser extremamente útil e ter um impacto significativo. Podemos extrair o exemplo mais claro do mundo da agricultura.

Cerca de três quartos da água retirada do sistema natural são utilizados exclusivamente para irrigar campos agrícolas e, portanto, para uma tarefa tão essencial como fornecer os alimentos de que a população se alimenta, entre outras coisas. 

Isso significa que uma redução dessa quantidade de água, por mais modesta que seja, significaria a libertação de um volume considerável de recursos, a atenuação do stress a que estão sujeitos os sistemas hidrológicos em muitas regiões e um contributo inestimável para a adaptação às alterações climáticas.
O enorme investimento feito em planos de modernização da irrigação de pouca utilidade, em termos de utilização eficiente da água, se os utilizadores finais, os agricultores, continuarem a tomar decisões sem ter em conta as limitações do recurso. Muitas vezes o fazem com base em critérios de empirismo e tradição, sem considerar o conhecimento e a tecnologia que hoje estão à sua disposição para produzir mais e melhor, reduzindo o uso de recursos como energia e água.

Disseminação e conscientização

O esforço para alcançar uma percepção mais fundamentada da sociedade também pode contribuir para derrubar o desastroso axioma segundo o qual “a água que não é usada se perde”, o que é a base, em parte, do dilema intencional que às vezes se coloca entre o uso racional da água e do progresso econômico.

Os cidadãos devem ter ferramentas à disposição para compreender que os recursos hídricos que determinadas atividades humanas não consomem são essenciais para a obtenção de outros recursos básicos (alimentação, energia, cultura, qualidade de vida...) e para o desempenho de funções nos sistemas naturais que nos são essenciais mesmo que sejam menos tangíveis (equilíbrio, regulação, harmonia, biodiversidade...).

A divulgação e a sensibilização constituem um aliado essencial para prevenir, enfrentar ou atenuar situações de crise relacionadas com a água, cada vez mais frequentes neste cenário inexorável de alterações climáticas.

O exemplo mais óbvio é a seca e a atitude generalizada da sociedade face a este fenômeno, simbolizada de forma intransponível pelo conceito de ciclo hidroilógico

O desinteresse dos cidadãos (especialmente nas áreas urbanas) pelos problemas hídricos é comum e notória. Até que um dia ele abre a torneira e percebe, perturbado, que não cai uma única gota. Esse comportamento extremo, que passa instantaneamente da indiferença à histeria sempre que ocorre um episódio de seca, é a prova mais clara de falta de consciência.

As secas são fenômenos recorrentes e tudo indica que serão mais frequentes no futuro. Isto significa que, depois de uma seca, com certeza e depois de um período mais ou menos prolongado, virá a próxima. 

Assim, a chave para este tipo de crise hídrica reside na gestão coletiva e individual sensata e responsável do recurso em períodos normais ou abundantes.

Percepção e reciprocidade

É justo reconhecer que parte do défice de informação e sensibilização também pode ser consequência desse tipo de combinação entre arrogância e desinteresse que o mundo da ciência por vezes manifesta em relação ao resto da sociedade.

Numa ocasião, enquanto um grupo de colegas estava ocupado a selecionar uma bacia hidrográfica adequada para um projeto de investigação, tivemos um encontro com um pastor que passava com o seu gado. Esse bom homem, gentilmente e após lhe ter dado um ligeiro início à conversa, explicou-nos detalhadamente o funcionamento hidrológico da bacia que pretendíamos monitorizar e as chaves para a compreender.


Depois de alguns anos de árduo e frutífero trabalho científico, tivemos que nos render às evidências e verificar que o que havíamos feito era, basicamente, corroborar com a ajuda da ciência o que o pastor nos explicou intuitivamente no dia do nosso encontro. Esse seria um caso mais próximo do que é citado no segundo sentido citado no dicionário.

A minha experiência diz-me que a combinação do conhecimento científico e do conhecimento popular resultante da experiência constitui uma ferramenta inestimável que conduz ao enriquecimento mútuo e a uma melhor compreensão da realidade.

Essa interação é também um instrumento muito útil para conseguir uma divulgação eficaz. Com base no envolvimento decisivo do mundo da ciência, numa correta estratégia de divulgação e numa adequada consciência social, conseguiremos a cumplicidade dos cidadãos para enfrentar os desafios da água neste contexto de mudança global.A fim

> Esse artigo foi publicado originalmente em espanhol.

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