Pular para o conteúdo principal

Saiba o que são alimentos biodiversos, consumidos apenas por 1 em cada 100 brasileiros

Os biodiversos incluem vegetais regionais, carne de caça e cogumelos. Eles são neglicenciados pela população, embora possam contribuir para a segurança alimentar e a substituição de comida ultraprocessada

Plantas alimentícias não convencionais


CAMILLA ALMEIDA
jornalista
Jornal da USP

O Brasil possui uma das mais notáveis biodiversidades do planeta, que se estende para a oferta de alimentos. São milhares de espécies nativas que garantem à culinária brasileira diversidade com sabores únicos do país.

Do tucumã, fruta típica da região amazônica, ao pequi, típico do Cerrado, os chamados alimentos biodiversos incluem plantas alimentícias não convencionais (Panc), carnes de caça e cogumelos comestíveis.

Costumeiramente regionais e representativos da biodiversidade brasileira, alguns deles têm potencial para contribuir com a segurança alimentar da população e para uma dieta mais saudável.

Um estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, em parceria com as universidades federais do Pará (UFPA), do Rio Grande do Norte (UFRN), de Campina Grande (UFCG), da Paraíba (UFPB) e de Pernambuco (UFPE), investigou o consumo desses alimentos pelos brasileiros e constatou que apenas 1,3% da população tem acesso a uma dieta biodiversa.

Foram utilizados dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares, realizada pelo IBGE, acerca do recordatório alimentar das últimas 24 horas de mais de 46 mil pessoas, de todos os Estados.

“Nós utilizamos modelos matemáticos para identificar as quantidades e as frequências de alimentos consumidos, além de encontrar quais eram as variáveis socioeconômicas associadas a esse consumo”, explica Aline de Carvalho, professora da FSP, ao Jornal da USP. Para uma melhor compreensão de tais informações, os diferentes nomes regionais para o mesmo alimento foram considerados.

Com isso, os pesquisadores elaboraram uma lista de alimentos biodiversos separada entre as Panc, carnes e cogumelos, unificando dados como estados de aparição, vezes em que foram mencionados e nome científico.

O alimento que mais apareceu foi o pequi, fruto popular da culinária do Cerrado, que foi citado 135 vezes, principalmente por goianos. Algumas frutas como o jenipapo, o babaçu e o butiá foram reportadas apenas uma vez, por moradores da Bahia, Maranhão e Paraná, respectivamente.

Além disso, foram analisados os perfis socioeconômicos dos consumidores de cada subdivisão. “Foi possível observar que as plantas são mais consumidas por mulheres, principalmente não brancas, das regiões Norte e Nordeste do país, e com uma menor renda per capita”, diz Aline.

Com relação às carnes de caça, como paca, jacaré e cotia, homens negros e indígenas em situação de insegurança alimentar, que também residem na zona rural no Norte e no Nordeste, são os maiores consumidores.

Destaca-se que no Brasil a caça de animais silvestres é proibida, com exceção para a caça de subsistência realizada por populações indígenas.

Os cogumelos foram mais encontrados na mesa de mulheres brancas, das regiões Sul e Sudeste, com uma maior renda.

Alimentação saudável e diversa

A pesquisadora destaca a ausência de estudos sobre alimentação biodiversa, e coloca esses alimentos como negligenciados pela maioria da população. 

“Eles são muito pouco consumidos, o que pode ter vários motivos: ou aquele alimento já não é mais considerado cultural naquele local, ou porque ele nem mesmo está presente no supermercado”, explica Aline de Carvalho. 

O enfraquecimento da relação humano-natureza e o afastamento dos centros urbanos com a diversidade natural podem ser citados como fatores que contribuem para a falta desses alimentos na nossa mesa.

A notável falta de biodiversidade na dieta brasileira é uma preocupação para a saúde da população, que cada vez mais consome alimentos ultraprocessados. 

“É preciso promover a segurança alimentar, uma alimentação que seja de qualidade e em quantidade suficiente para toda a população. Esse trabalho vai desde mostrarmos de que maneira esses alimentos [biodiversos] poderiam ser consumidos, mas complementar com diversos outros projetos que fomentem uma alimentação natural”, afirma Carvalho.

O projeto Sustentarea, um Núcleo de Extensão Universitária da USP coordenado pela pesquisadora, busca popularizar esses alimentos por meio de hortas urbanas e livros culinários — medidas que procuram incentivar a busca e a implementação desses elementos na dieta da população.

Oficinas são promovidas todos os meses no Centro de Práticas Esportivas da USP (Cepeusp). Elas contam com demonstração de receitas, roda de debates e introduções teóricas sobre diferentes temas, de maneira dinâmica e prática.

Iniciativas como as realizadas pelo Sustentarea são peças fundamentais não só na popularização desses frutos, vegetais e plantas, mas também para a conscientização da importância de uma alimentação diversificada e in natura — livre de agrotóxicos e conservantes. 

“Estamos perdendo nossa relação com a comida ao longo do tempo. É muito importante nos reconectarmos para assim termos uma alimentação mais saudável, com menos impactos ao meio ambiente”, afirma a pesquisadora.

Agora, o objetivo é compreender a qualidade nutricional desses alimentos e suas implicações no campo econômico e social. A pesquisadora espera que o mapeamento realizado pelo estudos sirva como incentivo para novas investigações e reflexões sobre alimentação biodiversa.

> Os resultados do estudo foram publicados no artigo Biodiversity is overlooked in the diets of different social groups in Brazil, disponível na revista Scientific Reports. Mais informações: e-mail alinenutri@usp.br, com Aline Martins de Carvalho.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Fundamentalismo de Feliciano é ‘opinião pessoal’, diz jornalista

Sheherazade não disse quais seriam as 'opiniões não pessoais' do deputado Rachel Sheherazade (foto), apresentadora do telejornal SBT Brasil, destacou na quarta-feira (20) que as afirmações de Marco Feliciano tidas como homofóbicas e racistas são apenas “opiniões pessoais”, o que pareceu ser, da parte da jornalista,  uma tentativa de atenuar o fundamentalismo cristão do pastor e deputado. Ficou subentendido, no comentário, que Feliciano tem também “opiniões não pessoais”, e seriam essas, e não aquelas, que valem quando o deputado preside a Comissão de Direitos Humanos e Minorias, da Câmara. Se assim for, Sheherazade deveria ter citado algumas das opiniões “não pessoais” do pastor-deputado, porque ninguém as conhece e seria interessante saber o que esse “outro” Feliciano pensa, por exemplo, do casamento gay. Em referência às críticas que Feliciano vem recebendo, ela disse que “não se pode confundir o pastor com o parlamentar”. A jornalista deveria mandar esse recado...

Ateu usa coador de macarrão como chapéu 'religioso' em foto oficial

PMs de Cristo combatem violência com oração e jejum

Violência se agrava em SP, e os PMs evangélicos oram Houve um recrudescimento da violência na Grande São Paulo. Os homicídios cresceram e em menos de 24 horas, de anteontem para ontem, ocorreram pelo menos 20 assassinatos (incluindo o de policiais), o triplo da média diária de seis mortes por violência. Um grupo de PMs acredita que pode ajudar a combater a violência pedindo a intercessão divina. A Associação dos Policiais Militares Evangélicos do Estado de São Paulo, que é mais conhecida como PMs de Cristo, iniciou no dia 25 de outubro uma campanha de “52 dias de oração e jejum pela polícia e pela paz na cidade”, conforme diz o site da entidade. “Essa é a nossa nobre e divina missão. Vamos avante!” Um representante do comando da corporação participou do lançamento da campanha. Com o objetivo de dar assistência espiritual aos policiais, a associação PMs de Cristo foi fundada em 1992 sob a inspiração de Neemias, o personagem bíblico que teria sido o responsável por uma mobili...

Wyllys vai processar Feliciano por difamação em vídeo

Wyllys afirmou que pastor faz 'campanha nojenta' contra ele O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), na foto, vai dar entrada na Justiça a uma representação criminal contra o pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP) por causa de um vídeo com ataques aos defensores dos homossexuais.  O vídeo “Marco Feliciano Renuncia” de oito minutos (ver abaixo) foi postado na segunda-feira (18) por um assessor de Feliciano e rapidamente se espalhou pela rede social por dar a entender que o deputado tinha saído da presidência da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias, da Câmara. Mas a “renúncia” do pastor, no caso, diz o vídeo em referência aos protestos contra o deputado, é à “privacidade” e às “noites de paz e sono tranquilo”, para cuidar dos direitos humanos. O vídeo termina com o pastor com cara de choro, colocando-se como vítima. Feliciano admitiu que o responsável pelo vídeo é um assessor seu, mas acrescentou que desconhecia o conteúdo. Wyllys afirmou que o vídeo faz parte de uma...

Embrião tem alma, dizem antiabortistas. Mas existe alma?

por Hélio Schwartsman para Folha  Se a alma existe, ela se instala  logo após a fecundação? Depois do festival de hipocrisia que foi a última campanha presidencial, com os principais candidatos se esforçando para posar de coroinhas, é quase um bálsamo ver uma autoridade pública assumindo claramente posição pró-aborto, como o fez a nova ministra das Mulheres, Eleonora Menicucci. E, como ela própria defende que a questão seja debatida, dou hoje minha modesta contribuição. O argumento central dos antiabortistas é o de que a vida tem início na concepção e deve desde então ser protegida. Para essa posição tornar-se coerente, é necessário introduzir um dogma de fé: o homem é composto de corpo e alma. E a Igreja Católica inclina-se a afirmar que esta é instilada no novo ser no momento da concepção. Sem isso, a vida humana não seria diferente da de um animal e o instante da fusão dos gametas não teria nada de especial. O problema é que ninguém jamais demonstrou que ...

Defensores do Estado laico são ‘intolerantes’, diz apresentadora

Evangélico quebrou centro espírita para desafiar o diabo

"Peguei aquelas imagens e comei a quebrar" O evangélico Afonso Henrique Alves , 25, da Igreja Geração Jesus Cristo, postou vídeo [ver abaixo] no Youtube no qual diz que depredou um centro espírita em junho do ano passado para desafiar o diabo. “Eu peguei todas aquelas imagens e comecei a quebrar...” [foto acima] Na sexta (19), ele foi preso por intolerância religiosa e por apologia do ódio. “Ele é um criminoso que usa a internet para obter discípulos”, disse a delegada Helen Sardenberg, depois de prendê-lo ao término de um culto no Morro do Pinto, na Zona Portuária do Rio. Também foi preso o pastor Tupirani da Hora Lores, 43. Foi a primeira prisão no país por causa de intolerância religiosa, segundo a delegada. Como 'discípulo da verdade', Alves afirma no vídeo coisas como: centro espírito é lugar de invocação do diabo, todo pai de santo é homossexual, a imprensa e a polícia estão a serviço do demônio, na Rede Globo existe um monte de macumbeiros, etc. A...

Físico afirma que cientistas só podem pensar na existência de Deus como hipótese

Apoio de âncora a Feliciano constrange jornalistas do SBT

Opiniões da jornalista são rejeitadas pelos seus colegas O apoio velado que a âncora Rachel Sheherazade (foto) manifestou ao pastor-deputado Marco Feliciano (PSC-SP)  deixou jornalistas e funcionários do "SBT Brasil" constrangidos. O clima na redação do telejornal é de “indignação”, segundo a Folha de S.Paulo. Na semana passada, Sheherazade minimizou a importância das afirmações tidas como homofóbicas e racistas de Feliciano, embora ele seja o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, dizendo tratar-se apenas de “opinião pessoal”. A Folha informou que os funcionários do telejornal estariam elaborando um abaixo assinado intitulado “Rachel não nos representa” para ser encaminhado à direção da emissora. Marcelo Parada, diretor de jornalismo do SBT, afirmou não saber nada sobre o abaixo assinado e acrescentou que os âncoras têm liberdade para manifestar sua opinião. Apesar da rejeição de seus colegas, Sheherazade se sente segura no cargo porque ela cont...