Pular para o conteúdo principal

Cumprimento de mandato divino leva Israel a matar palestinos. Religião é a causa da matança

Nas origens do sionismo, não havia profecias, revelações ou promessas divinas: havia necessidade. Era uma ideia moderna, racional e profundamente secular. Uma resposta iluminista ao antissemitismo europeu. Até que chegasse o horror.


Victor Hugo Pérez Gallo
professor assistente, Universidade de Zaragoza, Espanha

The Conversationl
plataforma de informação produzida por acadêmicos e jornalistas

Hoje Israel está navegando em uma tensão clara: seu projeto nacional foi parcialmente absorvido por uma narrativa teológico-política que transforma o territorial em sagrado, o legal em providencial e o militar em redentor.

Israel foi concebido como um refúgio, não como uma profecia. No entanto, parte de seu aparato político alinhou-se a uma lógica de guerra brutal que transforma a história em um destino sagrado.

Entender essa transformação é fundamental para repensar não apenas o futuro da região, mas também os riscos de qualquer forma de nacionalismo que recorra ao eterno para justificar o imediato.

Como o sionismo deixou de ser um movimento político secular para ser alimentado, em parte, por imaginários religiosos e escatológicos?

Qual o papel dos Estados Unidos nesse processo, desde a evangelização cristã até o poder do lobby judaico?

Quais as consequências disso para a política israelense contemporânea e o conflito palestino?


Mães choram
a morte dos
filhos.
Estima-se
em 100 mil
cadáveres

Do sionismo esclarecido ao fervor messiânico

O jornalista austro-húngaro Theodor Herzl, o pai do sionismo político, nunca sonhou com uma teocracia. Sua visão era a de um Estado judeu moderno que garantisse a segurança e os direitos do povo judeu em um mundo hostil.

A identidade judaica, para ele, era cultural e histórica, não teológica. O projeto era político: criar uma nação na Palestina, pois a Europa não oferecia outra saída.

Mas o retorno a Sião, mesmo em sua forma secular, inevitavelmente ressoou com ecos bíblicos. A Terra Prometida sempre esteve lá, adormecida na linguagem, pronta para despertar.

Até mesmo autores como Gershom Scholem (1971) reconhecem que o sionismo, por mais secular que fosse, nunca conseguiu se libertar do peso simbólico do messianismo judaico. Em suas palavras, trata-se de uma “estrutura secularizada de expectativa messiânica”.A religião entra em cena

Tudo mudou após a Guerra dos Seis Dias, em 1967. Israel conquistou Jerusalém Oriental e, com ela, mais do que apenas território: recuperou locais sagrados. Foi então que setores do judaísmo ortodoxo — antes céticos em relação ao sionismo — começaram a interpretá-la como um sinal do Messias. Esse ponto de virada foi decisivo.

Movimentos como o Gush Emunim — “O Bloco dos Crentes” – um movimento político judaico fundamentalista, levaram essa interpretação ao extremo: colonizar a Cisjordânia não era apenas uma estratégia, era o cumprimento de uma promessa divina.

O nacionalismo israelense começou a falar a linguagem da redenção. O Estado moderno começou a assumir conotações bíblicas. E partidos religiosos ganharam influência, tanto no Knesset — o órgão que detém o poder legislativo em Israel — quanto no imaginário social.

Alguns autores analisaram esses tipos de fenômenos como sintomas do que chamam de “ignorância sagrada”: quando a cultura se seculariza, a religião não desaparece, mas é reconfigurada como uma forma política.

O caso israelense é paradigmático: a teologia infiltra as estruturas estatais por meio da geografia, da lei e da identidade nacional.

Estados Unidos: entre a fé e a influência

A aliança EUA-Israel não é apenas política. É espiritual. Um segmento significativo do evangelicalismo americano acredita que o retorno dos judeus a Israel é uma condição para o fim dos tempos.

Para eles, Israel é o relógio profético de Deus. Portanto, setores cristãos conservadores apoiam entusiasticamente governos israelenses que fortaleçam o controle sobre territórios bíblicos.

Ao mesmo tempo, o lobby judaico nos EUA, especialmente organizações como o AIPAC — o principal grupo de lobby sionista —, desempenhou um papel fundamental na obtenção de apoio financeiro e diplomático. Embora não represente toda a comunidade judaica, sua influência é inegável.

Essa confluência de fé evangélica e poder político consolidou uma relação bilateral difícil de questionar, tanto por razões religiosas quanto por interesses estratégicos.
O resultado: a sacralização da política

Tudo isso tem efeitos concretos: expansão dos assentamentos, leis que reforçam a identidade judaica do Estado e a exclusão simbólica (e real) de não judeus. 

A política israelense está se tornando cada vez mais refratária à crítica interna, protegida por uma legitimidade incontestável por se considerar divina. 

Sob esse mandato divino, Israel já matou mais de 62.000 pessoas, segundo o Ministério da Saúde de Gaza — um número que alguns estudos elevam para quase 100.000 — e condenou mais de meio milhão à fome, segundo a ONU.

A fronteira entre religião e Estado torna-se porosa. Decisões governamentais podem ser disfarçadas de revelação. E o conflito com os palestinos torna-se mais existencial do que político. Não se trata mais de compartilhar um território, mas de reivindicar uma herança eterna.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

Orkut tem viciados em profiles de gente morta

Uma das comunidades do Orkut que mais desperta interesse é a PGM ( Profile de Gente Morta). Neste momento em que escrevo, ela está com mais de 49 mil participantes e uma infinidade de tópicos. Cada tópico contém o endereço do profile (perfil) no Orkut de uma pessoa morta e, se possível, o motivo da morte. Apesar do elevado número de participantes, os mais ativos não passam de uma centena, como, aliás, ocorre com a maior parte das grandes comunidades do Orkut. Há uma turma que abastece a PGM de informações a partir de notícias do jornal. E há quem registre na comunidade a morte de parentes, amigos e conhecidos. Exemplo de um tópico: "[de] Giovanna † Moisés † Assassinato Ano passado fizemos faculdade juntos, e hoje ao ler o jornal descubri (sic) que ele foi assassinado pois tentou reagir ao assalto na loja em que era gerente. Tinha 22 anos...” Seguem os endereços do profile do Moisés e da namorada dele. Quando o tópico não tem o motivo da morte, há sempre alguém que ...

Feliciano manda prender rapaz que o chamou de racista

Marcelo Pereira  foi colocado para fora pela polícia legislativa Na sessão de hoje da Comissão de Direitos Humanos e Minoria, o pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), na foto, mandou a polícia legislativa prender um manifestante por tê-lo chamado de racista sob a alegação de ter havido calúnia. Feliciano apontou o dedo para um rapaz: “Aquele senhor de barba, chama a segurança. Ele me chamou de racista. Racismo é crime. Ele vai sair preso daqui”. Marcelo Régis Pereira, o manifestante, protestou: “Isso [a detenção] é porque sou negro. Eu sou negro”. Depois que Pereira foi retirado da sala, Feliciano disse aos manifestantes: “Podem espernear, fui eleito com o voto do povo”. O deputado não conseguiu dar prosseguimento à sessão por causa dos apitos e das palavras de ordem cos manifestantes, como “Não, não me representa, não”; “Não respeita negros, não respeita homossexuais, não respeita mulheres, não vou te respeitar não”. Jovens evangélicos manifestaram apoio ao ...

Rabino da Congregação Israelita Paulista é acusado de abusar de mulheres

Feliciano na presidência da CDHM é 'inaceitável', diz Anistia

Feliciano disse que só sai da comissão se morrer A Anistia Internacional divulgou nota afirmando ser “inaceitável” a escolha do pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), na foto, para a presidência da CDHM (Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara), por ter "posições claramente discriminatórias em relação à população negra, LGBT e mulheres". "É grave que ele tenha sido alçado ao posto a despeito de intensa mobilização da sociedade em repúdio a seu nome", diz. Embora esteja sendo pressionado para renunciar inclusive pelo seu próprio partido, Feliciano declarou no fim de semana que só morto deixará a presidência da comissão. O seu mandato no órgão é de dois anos. A Anistia manifestou a expectativa de que os deputados “reconheçam o grave equívoco cometido” e  “tomem imediatamente as medidas necessárias” para substituir o deputado. “[Os integrantes da comissão] devem ser pessoas comprometidas com os direitos humanos” que tenham “trajetórias públi...

'Pessoa sem fé se torna muito só', afirma Christiane Torloni

Atriz diz que segue  preceitos  do budismo Ao falar que é católica por formação e que segue os “preceitos” do budismo, a   atriz Christiane Torloni (foto) afirmou que “sem fé a pessoa se torna muito só”.  “Leio a palavra de Cristo e acredito que ele e o Buda são duas manifestações de muita luz para o ser humano”, disse à coluna de Sonia Racy, no Estadão. Torloni comparou a vida a uma gincana. “É como uma novela”, afirmou. “Os budistas têm um termo muito bom para isso: rigor de continuidade.” Aos 54 anos, a atriz disse que o envelhecimento “traz benefícios incríveis para a alma e a sabedoria”. Tweet ‘Energia espiritual’ tem ajudado Gianecchini, diz médium setembro de 2011

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Padre do Paraná se masturba diante de menina de 13 anos

A Polícia Rodoviária prendeu na quarta-feira (2) o padre Reginaldo Antonio Ghergolet (foto), 37, da Diocese de Jacarezinho (PR), por ter se masturbado diante de uma menina de 13 anos em Ribeirão do Pinhal.

Pastor da Frente Parlamentar quer ser presidente do Brasil

Feliciano sabe das 'estratégias do diabo' contra um presidente cristão O pastor Marco Feliciano (foto), 41, do Ministério Tempo de Avivamento, disse sonhar com um Brasil que tenha um presidente da República que abra o programa “Voz do Brasil” dizendo: “Eu cumprimento o povo brasileiro com a paz do Senhor”.  Esse presidente seria ele próprio, conforme desejo que revelou no começo deste ano. Feliciano também é deputado federal pelo PSC-SP e destacado membro da Frente Parlamentar Evangélica. Neste final de semana, após um encontro com José Serra (PSDB), candidato a prefeito de São Paulo, Feliciano falou durante um culto sobre “as estratégias do diabo” para dificultar o governo de um "presidente cristão":  "A militância dos gays, a militância do povo que luta pelo aborto, a militância dos que querem descriminalizar as drogas". Como parlamentar, Feliciano se comporta como se o Brasil fosse um imenso templo evangélico. Ele é autor, entre outros, do p...

A história da religião é uma história de crueldades e horror