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Aparecida exibe o maior mosaico de padre acusado de abuso

O artista foi afastado de suas atividades sacerdotais por ser acusado de abusar sexualmente de freiras de uma comunidade na Eslovênia e de outras mulheres em Roma


Paulo Lopes
jornalista, trabalhou na Folha de S.Paulo, Diário Popular, Abril e em outras publicações

A Basílica de Aparecida inaugurou em março de 2022 em sua fachada norte o maior mosaico do mundo do esloveno Marko Ivan Rupnik, com a presença do próprio artista. São quadro mil metros quadrados em pedras coloridas do Brasil, França, Itália, Grécia e Afeganistão, com figuras inspiradas no Êxodo. Há planos (ou havia) para a instalação de mosaicos em outras fachadas da Basília.

Inicialmente enaltecida pela administração da Basílica pela beleza e grandiosidade, a obra se tornou uma maldição. Rupnik é um padre que abusou sexual e psicologicamente de uma comunidade de freiras em Lubiana, capital da Eslovênia, de 1992 a 1993, e de mulheres do Centro Aletti, escola de arte sacra que ele fundou em Roma.

Rupnik é jesuíta, da mesma ordem do papa Francisco, do qual o padre era conselheiro, até ser afastado de suas atividades em fevereiro de 2023. Agora, ele tem de ficar longe das fiéis.

Não há, até o momento, uma perspectiva de o padre ser condenado pela Justiça dos homens, ou seja, ir para cadeia, como ocorreria com qualquer outro estuprador, porque a Igreja tem mantido o caso dentro de seus domínios, longe dos holofotes da imprensa.

Em dezembro de 2022, a Ordem dos Jesuítas informou não ter havido abuso de criança, como se isso fosse uma atenuante, criticando, apenas, a forma de o Rupnik "exercer o ministério", uma expressão aviltante porque encobre os sofrimentos das vítimas.

Antes, em maio de 2020, Rupnik foi excomungado pela Companhia de Jesus, por ter recebido em confessionário uma de suas vítimas. Mas no mesmo mês, talvez por um milagre, a sentença foi revogada.

Trata-se de mais uma manifestação do milenar machismo da Igreja Católica, mas o estrago já está feito, porque onde houver um mosaico de Rupnik haverá uma lembrança do seu abuso, assim se espera.

Mosaicos de Rapnik
na ala norte da Basílica
de Aparecida

As obras do padre estão em mais de 200 igrejas e santuários em todo o mundo, incluindo a capela do palácio apostólico do Vaticano.

A Igreja Católica da França iniciou uma discussão sobre o que fazer com os mosaicos de Rupnik da fachada da basílica de Nossa Senhora de Lourdes, ponto de encontro de devotos de todo o mundo.

O bispo de Lourdes, dom Jean-Marc Micas, sinalizou que os mosaicos serão retirados, em respeito aos sofrimentos das pessoas que vão ao santuário em busca de paz espiritual.

“Lourdes é um lugar onde muitas vítimas se voltam para a Imaculada Conceição em busca de consolo e cura. A angústia deles é grande diante dos mosaicos do padre Rupnik neste mesmo lugar: não podemos ignorar isso”, disse o bispo em nota.

A Basílica de Aparecida até agora não se manifestou sobre sua obra de Rupnik. E talvez nunca o faça, se católicas e católicos continuarem em silêncio.

Por enquanto, sobre o padre, a maior visibilidade é de um grupo de católicas que enaltece Rupnik, sem considerar que nem sempre se pode desvincular o artista de sua obra. Esse grupo está abrigado na PUC de São Paulo, na Sala Marko Ivan Rupnik, coordenado pela professora Wilma Steagall De Tommaso.

Em março de 2022, quando as denúncias contra o padre-artista já eram públicas e notórias, De Tommaso deu um curso pela internet sobre os mosaicos de Aparecida. "Ele [o padre] é um homem muito culto, um grande líder, um grande pai espiritual, também", disse ela, entre outros elogios a Rupnik.

Ao menos, a PUC do Paraná revogou em fevereiro de 2023 o título de Doutor Honoris Causa concedido em 2022 a Rupnik.

Francisco aparentemente nada fará. "Não tive nada a ver com isso", disse recentemente.

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