Pular para o conteúdo principal

Famílias impedem doação de órgãos. 59 mil pacientes esperam por transplante

Muitas vezes, mesmo o falecido ter deixado autorização, familiares não concordam com o uso de órgãos

VINÍCIUS BOTELHO
JÚLIA VALERI

jornalistas
Jornal da USP

A doação de órgãos ainda é um assunto polêmico e um desafio para a área da saúde no Brasil. Segundo o Ministério da Saúde, mais de 59 mil pessoas estão na fila de espera para o transplante de órgãos. 

Em 2022, cerca de 45% das famílias de pessoas que poderiam se tornar doadoras não concordaram com o ato. Além dos que esperam um órgão para transplante, a falta de doadores também atrasa o desenvolvimento de pesquisas científicas.

“As pessoas costumam ser conscientizadas sobre a importância da doação de órgãos para transplante, mas não sabem sobre o impacto dessa doação para o desenvolvimento da pesquisa científica”, analisa Christiane Becari, professora do Programa de Pós-Graduação em Cirurgia Clínica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

A professora conta que a doação voltada para pesquisa científica pode ser feita no momento da autorização após o falecimento, por meio de um questionário, e que, muitas vezes, mesmo com o falecido tendo autorizado, a família recusa e o material não pode ser utilizado.

A pandemia da Covid-19, de acordo com Christiane, “deu visibilidade à importância do trabalho da pesquisa científica, com o desenvolvimento de vacinas”, e essa valorização precisa se expandir para o nível de conscientização sobre a importância da doação de órgãos para pesquisas.

“Quando o órgão é utilizado para transplante, um grupo pequeno de pessoas será beneficiado, enquanto a doação de órgãos para pesquisa beneficia milhares de pessoas, por meio do desenvolvimento de novas soluções para problemas de saúde”, explica a professora.

Tendência
de doações
de órgãos é
de queda

Segundo dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (Abto), em 2021 o Brasil registrou cerca de 15 doadores por milhão de pessoas, um número 4,5% menor em relação ao ano anterior. Em números absolutos, foram 123 doadores a menos, de um ano para o outro. O país conta com 1.664 equipes de transplante habilitadas.

Além dos casos de morte, em que a família autoriza ou não a doação, pessoas vivas também podem ser doadoras, desde que a doação não prejudique a saúde do interessado. O doador vivo pode doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea ou parte do pulmão. 

Segundo a lei, parentes de no máximo quatro graus e cônjuges podem ser doadores. Para não parentes, apenas com autorização judicial.
Alternativas para estudo

As doações de órgãos estão diminuindo ao longo dos anos. Essa tendência é preocupante porque aponta para uma ausência de conscientização sobre a importância da doação de órgãos.

O uso de animais em pesquisas médicas é visto como uma alternativa para estudar condições e tratamentos médicos, uma vez que a doação de órgãos para estudos é escassa. No entanto, Christiane Becari afirma que, ao contrário das crenças populares, o estudo em animais não substitui o estudo em pessoas, mas sim o complementa,

 “As duas têm funções importantes, onde muitas vezes a gente precisa primeiro entender como as técnicas, drogas e experimentos medicinais funcionam em animais para depois entender no paciente.”

A professora assimila esse modelo de conhecimento muitas vezes à medicina translacional, um campo da ciência medicinal que se concentra em traduzir descobertas da pesquisa em saúde e biologia básica em tratamentos e terapias para pacientes. 

Becari menciona que a medicina translacional envolve modelos animais e amostras humanas, estudando desde a célula até o paciente. Ela sugere que o que é observado em animais e células pode ser aplicado ao paciente, ou seja, a medicina translacional visa utilizar conhecimentos obtidos em diferentes contextos para desenvolver tratamentos e terapias mais eficazes.


Ela dá um exemplo observado no seu laboratório: “Quando se tem uma droga nova, não se testa diretamente no paciente. A princípio, o foco recairá sobre as células animais, depois a experimentação vai para um estudo clínico em pacientes saudáveis, e só assim para a população doente, são estágios que precisam ser checados”.

A professora é cética em relação aos benefícios da inteligência artificial na área da saúde. Ela reconhece que a tecnologia tem sido revolucionária em diversos campos do conhecimento, mas acredita que a ciência do entendimento geral ainda é mais abrangente. 

Argumenta haver muitas patologias, tratamentos e prevenções que só podem ser descobertas e aprimoradas por especialistas e cientistas por meio de métodos convencionais. 

Becari  afirma que simuladores não conseguem produzir amostras tão funcionais quanto aquelas que advêm dos humanos ou dos animais. Embora a inteligência artificial tenha sua utilidade e eficiência, a professora acredita que a expertise humana é essencial na busca por soluções mais precisas e completas para as questões de saúde.

> Com arte do Jornal da USP.

• Filme mostra a oposição da Igreja ao transplante de coração

• Médica de IML é presa em flagrante furtando três corações

• Japão aprova cultivo de célula tronco de humanos em animais

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

'Sou a Teresa, fui pastora da Metodista e agora sou ateia'

Historiador católico critica Dawkins por usar o 'cristianismo cultural' para deter o Islã

Pereio defende a implosão do Cristo Redentor

Ateu, Dawkins aposta no cristianismo cultural contra avanço do Islã. É um equívoco

Música gravada pelo papa Francisco tem acordes de rock progressivo. Ouça

Comissão aprova projeto que torna a Bíblia patrimônio imaterial. Teocracia evangélica?

Baleias e pinguins faziam parte da cultura de povos do litoral Sul há 4,2 mil anos

Misterioso cantor de trilha de novela é filho de Edir Macedo