Pular para o conteúdo principal

Enfrentamento à Covid-19 evidenciou o poder da ciência

Investimento foi fundamental para a criação em tempo recorde de vacinas


Paula Penedo Pontes
jornalista

Unicamp

Há três anos, em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou a pandemia de Covid-19. Desde então, mais de 700 milhões de pessoas em todo o planeta foram infectadas pela doença, com quase 7 milhões delas falecendo. 

Além de alterar fundamentalmente a maneira como a sociedade vive, trabalha e se relaciona, o SARS-CoV-2 representou um enorme desafio para a ciência, evidenciando que a comunidade científica, quando trabalha em conjunto, é uma importante aliada na solução de problemas globais.

“Ficou muito claro que quando há bastante investimento na ciência e a união de todas as pessoas com o mesmo objetivo, você consegue respostas relativamente rápidas”, comenta a infectologista Raquel Stucchi, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

Com o sequenciamento genético do vírus obtido ainda em fevereiro de 2020, pesquisadores conseguiram determinar a estrutura de DNA do patógeno, possibilitando, pela primeira vez na história, o uso desse conhecimento para construir, em tempo real, respostas de saúde pública a uma pandemia.

Uma dessas respostas foi o desenvolvimento, em tempo recorde, de vacinas seguras e muito eficazes na prevenção das formas graves da Covid, já que conhecer a estrutura do agente infeccioso permitiu investigar as formas como ele atua e produz a enfermidade.

No caso do SARS-CoV-2, isso começa com a proteína Spike, uma espécie de espinha do vírus, que se conecta a um receptor chamado ACE2 para entrar nas células humanas.

“As vacinas geralmente contêm uma parte enfraquecida do agente infeccioso ou de uma toxina produzida por ele para o corpo produzir anticorpos, que são as células de defesa. E as vacinas contra a covid-19 foram criadas para gerar anticorpos contra essa proteína Spike”, acrescenta Stucchi.

Uma novidade, no entanto, foi o uso de vacinas que utilizam a tecnologia de carreamento de RNA, o material genético do vírus. Nesse tipo de imunizante, as células recebem uma sequência de RNA contendo as informações necessárias para produzir uma proteína que estimula a resposta imunológica do corpo. Mas é preciso ressaltar: embora nunca tivesse sido aplicado em populações, esse tipo de vacina não é uma tecnologia nova.

O uso do RNA mensageiro para a produção de vacinas vinha sendo estudado desde a década de 1990 e já contava com protocolos de segurança bem estabelecidos. O que os pesquisadores fizeram foi apenas voltar seu foco para a Covid-19.

O docente do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp Alessandro Faria, que chefia o Departamento de Genética, Evolução, Microbiologia e Imunologia, explica que a finalização dessa vacina foi agilizada porque o mundo inteiro parou para focar apenas nesse assunto. 

Além disso, complementa, havia um nível de financiamento à pesquisa nunca visto antes. Os Estados Unidos, por exemplo, pagaram quase 2 bilhões de dólares para garantir a compra de 100 milhões de vacinas que ainda estavam sendo produzidas pela Pfizer, mesmo não havendo confirmação de que a empreitada teria sucesso.


Amostra do coronavírus
do primeiro paciente
infectado no Brasil

“Se você acha que ciência é cara, experimente ficar doente. Essa é uma frase da filantropa americana Mary Lasker que mostra que o investimento antecipado tem resultado”, argumenta o professor.

“Investir em desenvolvimento sai mais barato, porque permite ter tecnologias nacionais, ao invés de comprá-las, e porque podemos redirecionar a pesquisa de acordo com nossos interesses, como foi o caso da covid-19. Ciência parece que é gasto, mas talvez seja o maior investimento, porque é algo que se paga tranquilamente ao longo do tempo”, garante.

Frente de diagnóstico


Farias foi um dos coordenadores da Força-Tarefa contra a Covid-19 (FT) da Unicamp, iniciativa que colocou a infraestrutura da universidade a serviço da luta contra a doença. Além de pesquisas sobre o tema, a FT foi responsável por uma frente de diagnósticos, liderada pelo docente, que realizou mais de 300 mil testes PCR, tornando-se a segunda maior estrutura de testagem do estado de São Paulo. 

Com o Laboratório de Patologia Clínica do Hospital de Clínicas da Unicamp, tornou-se o primeiro local do país a receber validação para testagens sem contraprova, o que reduziu o tempo médio de espera por um diagnóstico de 17 dias para 24 horas.

De acordo com o pesquisador, um desafio enfrentado pela Força-Tarefa que acabou gerando um saldo positivo foi a escassez no mercado dos insumos para a realização das testagens, que geralmente eram importados. Devido a isso, a Unicamp estabeleceu parcerias com diversas empresas para a produção de alternativas nacionais, o que trouxe para o país a capacidade de realizar testes com tecnologia 100% brasileira.



• Síndrome de fragilidade determina a gravidade da Covid-19 em idosos  

“A testagem era a base para entendermos o que estava acontecendo, inclusive com semanas de antecedência, porque se víamos o número de resultados positivos subindo, sabíamos que dali a alguns dias eles estariam maiores ainda”, comenta o professor.

Atualmente, a Unicamp continua realizando cerca de 500 testes por semana, embora grande parte seja de maneira preventiva, como no caso de testes em pacientes que irão se submeter a transplantes. 

Conforme o professor, a Universidade está atualmente em um cenário bem estabilizado, com uma boa qualidade de monitoramento, mas a covid-19 continuará fazendo parte da rotina da sociedade por algum tempo, principalmente devido ao modo como a pandemia foi manejada.

Esse também é o entendimento da docente do IB Ana Arnt, para quem a Covid-19 está sendo erroneamente tratada como uma gripe. Apesar de a situação estar relativamente tranquila comparando-se a anos anteriores, 5 mil pessoas morreram em decorrência da enfermidade nos dois primeiros meses de 2023, número bem acima de outras doenças infecciosas que afetavam a população até 2019.

“Acho que ainda conviveremos com a covid por muito tempo, porque não há cobertura vacinal que dê conta em um curto espaço de tempo. Por exemplo, levamos décadas para controlar sarampo e pólio no Brasil. Então, teremos épocas de surto e, se tudo der certo, com cada vez menos morte. Mas ainda está morrendo mais gente do que deveria”, alerta.

Ciência não é estática


O comentário de Ana Arnt pode parecer desanimador, mas a docente lembra que quem discutia Covid-19 sem sensacionalismo já alertava isso em 2020. Desde 2019, a bióloga coordena a rede de Blogs de Ciência da Unicamp, que foi o primeiro veículo institucional de divulgação científica a ter um site exclusivo sobre o tema. 

O Especial Covid-19, lançado em 21 de março de 2020, soma mais de 300 textos, produzidos por 110 autores, e quase 2 milhões de visualizações, tendo sido um importante aliado na garantia de informações de qualidade durante a crise sanitária.

“Nos primeiros seis meses de pandemia, acordávamos com centenas de mensagens diárias em nossas redes sociais, com dúvidas de pessoas completamente perdidas sobre o que fazer e como fazer”, relata a professora, lembrando que um importante campo de atuação foi o combate a desinformações que vinham de todos os lugares, inclusive de veículos oficiais.

“Não tínhamos aliados no poder executivo, em termos de mandatários. Cada pronunciamento oficial era um espaço para termos que, no dia seguinte, combater a desinformação que estava chegando”, lamenta.

Em certa medida, essa desinformação se apropriou do fato de que, no início da pandemia, a própria comunidade científica ainda estava aprendendo como o vírus se comportava, e algumas informações vindas de autoridades científicas pareciam se contradizer.

Naquela época, por exemplo, as orientações de proteção focavam mais no incentivo à limpeza das mãos do que no uso de máscaras e distanciamento físico, e muitas pessoas usaram as mudanças de opinião para invalidar o que os cientistas diziam. Como explica Ana Arnt, essa mudança de posicionamento é algo intrínseco e positivo para o bom funcionamento da ciência.

Até o momento em que os cientistas passaram a entender mais detalhadamente os mecanismos do SARS-CoV-2, as medidas de proteção precisaram se basear nos modelos de doenças infecciosas anteriores, como o H1N1, zika e gripe suína, porque havia uma emergência sanitária e não era possível ficar parado.

“A ciência não é estática. Ela é um espaço de questionamentos, não de certezas, e a mudança de opinião se vincula à compreensão que fomos adquirindo. Higienizar mãos e rosto é importante para muitas doenças infecciosas e, talvez, naquele momento em que ainda não havia distanciamento, ela possa ter contribuído para reduzir a transmissão”, supõe.

> Esse texto foi publicado originalmente com o título Protagonismo da Ciência marca os três anos da pandemia.

• Vírus da Covid-19 pode ser detectado em lágrimas, mostra estudo

• Novo coronavírus infecta e se replica em células das glândulas salivares

• Quem não adota medidas contra a Covid-19 é sociopata, mostra estudo da UEL

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Limpem a boca para falar do Drauzio Varella, cristãos hipócritas!

Varella presta serviço que nenhum médico cristão quer fazer LUÍS CARLOS BALREIRA / opinião Eu meto o pau na Rede Globo desde o começo da década de 1990, quando tinha uma página dominical inteira no "Diário do Amazonas", em Manaus/AM. Sempre me declarei radicalmente a favor da pena de morte para estupradores, assassinos, pedófilos, etc. A maioria dos formadores de opinião covardes da grande mídia não toca na pena de morte, não discutem, nada. Os entrevistados de Sikera Júnior e Augusto Nunes, o povo cristão da rua, também não perdoam o transexual que Drauzio, um ateu, abraçou . Então que tipo de país de maioria cristã, tão propalada por Bolsonaro, é este. Bolsonaro é paradoxal porque fala que Jesus perdoa qualquer crime, base haver arrependimento Drauzio Varella é um médico e é ateu e parece ser muito mais cristão do que aqueles dois hipócritas.  Drauzio passou a vida toda cuidando de monstros. Eu jamais faria isso, porque sou ateu e a favor da pena de mor...

Feliciano manda prender rapaz que o chamou de racista

Marcelo Pereira  foi colocado para fora pela polícia legislativa Na sessão de hoje da Comissão de Direitos Humanos e Minoria, o pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), na foto, mandou a polícia legislativa prender um manifestante por tê-lo chamado de racista sob a alegação de ter havido calúnia. Feliciano apontou o dedo para um rapaz: “Aquele senhor de barba, chama a segurança. Ele me chamou de racista. Racismo é crime. Ele vai sair preso daqui”. Marcelo Régis Pereira, o manifestante, protestou: “Isso [a detenção] é porque sou negro. Eu sou negro”. Depois que Pereira foi retirado da sala, Feliciano disse aos manifestantes: “Podem espernear, fui eleito com o voto do povo”. O deputado não conseguiu dar prosseguimento à sessão por causa dos apitos e das palavras de ordem cos manifestantes, como “Não, não me representa, não”; “Não respeita negros, não respeita homossexuais, não respeita mulheres, não vou te respeitar não”. Jovens evangélicos manifestaram apoio ao ...

Deputado gay é ameaçado de morte no Twitter por supostos evangélicos

Resposta do deputado Jean Wyllys O militante gay e deputado Jean Wyllys (PSOL) recebeu hoje (18) pelo Twitter três ameaças de morte de supostos evangélicos. Diz uma delas: "É por ofender a bondade de Deus que você deve morrer". Outra: "Cuidado ao sair de casa, você pode não voltar". A terceira: “"A morte chega, você não tarda por esperar".  O deputado acredita que as ameaças tenham partido de fanáticos religiosos. “Esses religiosos homofóbicos, fundamentalistas, racistas e enganadores de pobres pensam que me assustam com ameaças de morte!”, escreveu ele no Twitter. Wyllys responsabilizou os pastores por essas “pessoas doentes” porque “eles as conduzem demonizando minorias”. Informou que vai acionar as autoridades para que os autores da ameaça seja penalizados. Escreveu: "Vou recorrer à Justiça toda vez que alguém disseminar o ódio racista, misógino e homofóbico no Twitter, mesmo que seja em nome de seu deus". Defensor da união civi...

Prefeito de São Paulo veta a lei que criou o Dia do Orgulho Heterossexual

Kassab inicialmente disse que lei não era homofóbica

Promotor nega ter se apaixonado por Suzane, mas foi suspenso

Gonçalves, hoje com 45 anos, e Suzane quando foi presa, 23 No dia 15 de janeiro de 2007, o promotor Eliseu José Berardo Gonçalves (foto), 45, em seu gabinete no Ministério Público em Ribeirão Preto e ao som de músicas românticas de João Gilberto, disse a Suzane Louise Freifrau von Richthofen (foto), 27, estar apaixonado por ela. Essa é a versão dela. Condenada a 38 anos de prisão pela morte de seus pais em outubro de 2002, a moça foi levada até lá para relatar supostas ameaças de detentas do presídio da cidade. Depois daquele encontro com o promotor, ela contou para uma juíza ter sido cortejadar.  Gonçalves, que é casado, negou com veemência: “Não me apaixonei por ela”. Aparentemente, Gonçalves não conseguiu convencer sequer o Ministério Público, porque foi suspenso 22 dias de suas atividades por “conduta inadequada” e por também por ter dispensado uma testemunha importante em outro caso. Ele não receberá o salário correspondente a esse período. O Fantástico de ontem apre...

Pastor da Frente Parlamentar quer ser presidente do Brasil

Feliciano sabe das 'estratégias do diabo' contra um presidente cristão O pastor Marco Feliciano (foto), 41, do Ministério Tempo de Avivamento, disse sonhar com um Brasil que tenha um presidente da República que abra o programa “Voz do Brasil” dizendo: “Eu cumprimento o povo brasileiro com a paz do Senhor”.  Esse presidente seria ele próprio, conforme desejo que revelou no começo deste ano. Feliciano também é deputado federal pelo PSC-SP e destacado membro da Frente Parlamentar Evangélica. Neste final de semana, após um encontro com José Serra (PSDB), candidato a prefeito de São Paulo, Feliciano falou durante um culto sobre “as estratégias do diabo” para dificultar o governo de um "presidente cristão":  "A militância dos gays, a militância do povo que luta pelo aborto, a militância dos que querem descriminalizar as drogas". Como parlamentar, Feliciano se comporta como se o Brasil fosse um imenso templo evangélico. Ele é autor, entre outros, do p...

Físico afirma que cientistas só podem pensar na existência de Deus como hipótese

Orkut tem viciados em profiles de gente morta

Uma das comunidades do Orkut que mais desperta interesse é a PGM ( Profile de Gente Morta). Neste momento em que escrevo, ela está com mais de 49 mil participantes e uma infinidade de tópicos. Cada tópico contém o endereço do profile (perfil) no Orkut de uma pessoa morta e, se possível, o motivo da morte. Apesar do elevado número de participantes, os mais ativos não passam de uma centena, como, aliás, ocorre com a maior parte das grandes comunidades do Orkut. Há uma turma que abastece a PGM de informações a partir de notícias do jornal. E há quem registre na comunidade a morte de parentes, amigos e conhecidos. Exemplo de um tópico: "[de] Giovanna † Moisés † Assassinato Ano passado fizemos faculdade juntos, e hoje ao ler o jornal descubri (sic) que ele foi assassinado pois tentou reagir ao assalto na loja em que era gerente. Tinha 22 anos...” Seguem os endereços do profile do Moisés e da namorada dele. Quando o tópico não tem o motivo da morte, há sempre alguém que ...