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Cardeais dos EUA são alvo do 'Relatório do Chapéu Vermelho' financiado por milionários

por Christopher White
para Crux

Enquanto os bispos dos EUA trabalham para formular uma resposta oficial ao acobertamento e abuso sexual clerical, um novo grupo de fiscalização apoiado por cristãos milionários está buscando resolver a questão com suas próprias mãos.

Uma nova organização, que organizou um evento apenas para convidados no domingo à noite, planeja gastar mais de US$ 1 milhão no próximo ano para investigar todos os membros do Colégio dos Cardeais “para indicar os que sofreram acusações plausíveis de escândalos, casos de abuso e acobertamento”.

O grupo, chamado “The Better Church Governance Group”, foi lançado no campus da Universidade Católica da América (em inglês, Catholic University of America - CUA) com a intenção declarada de produzir seu ‘Red Hat Report’ (Relatório do Chapéu Vermelho, em tradução livre) até abril de 2020.

Os bispos dos EUA fundaram a Universidade Católica da América, e todos os seis cardeais residentes dos EUA fazem parte do Conselho de Administração.

Numa declaração ao Crux, um porta-voz da universidade disse que “um estudante reservou um espaço no campus de acordo com os nossos procedimentos de reserva de espaços. A Universidade Católica da América não financiou o evento nem o grupo.”

Ex-agentes do FBI
 vão investigar todos os
'chapéus vermelhos'

Os organizadores do Better Church Governance confirmaram que se trata de um evento particular e disse que não havia nenhuma associação entre a universidade e a organização em um e-mail enviado ao Crux.

O Relatório do Chapéu Vermelho, projeto anunciado como o carro-chefe da organização, deve fazer autorias com todos os 124 eleitores papais atuais. Segundo os organizadores, até o momento, espera-se que seja conduzido por uma equipe de quase 100 pesquisadores, acadêmicos, investigadores e jornalistas, com o objetivo de “responsabilizar a hierarquia da Igreja Católica por casos de abuso e corrupção e desenvolver e apoiar a honestidade, a clareza e a fidelidade na administração da Igreja”.

Em uma gravação de áudio do lançamento do evento obtida por Crux, o diretor de operações da Better Church Governance, Jacob Imam, disse que a organização não tem o intuito de atacar o Papa Francisco, apesar de ter perguntado o seguinte ao público de quase 40 pessoas: “E se em 2013 tivéssemos elegido alguém mais proativo na proteção dos jovens e dos inocentes?”

“Se tivéssemos tido o Relatório do Chapéu Vermelho, talvez não tivéssemos elegido o Papa Francisco”, declarava uma das apresentações de slides acompanhando as observações.

Imam, atualmente acadêmico Marshall da Universidade de Oxford, que se converteu do islamismo ao catolicismo há três anos, alegou que logo após o conclave de 2013 que elegeu Francisco várias grandes agências de notícias basearam seu conhecimento sobre o papa recém-eleito no que encontravam na Wikipédia.

Insistindo que não estava difamando o pontífice, acrescentou: “Acho que é justo dizer que ele não se identificaria como um defensor dos valores tradicionais”.

Considerando a falta de conhecimento que muitos eleitores têm uns sobre os outros, ponderou Imam, é uma “situação extremamente precária... quando se fecham as portas da Capela Sistina”,

De acordo com o prospecto, o grupo Better Church Governance quer produzir o relatório antes do próximo conclave papal. Os gastos do primeiro ano estão estimados em US$1.126.500.

“Muitos de nós que fomos criados numa sociedade democrática liberal não sabemos como se forma uma hierarquia”, disse Imam aos presentes. “Mas a história nos dá muitos truques e dicas, e nós, do Better Church Governance começamos a sistematizar algumas dessas estratégias. Estamos aqui para criar transparência na Igreja e para ajudar a apoiar a integridade”.

Atualmente, os organizadores do relatório estão buscando alunos da pós-graduação para a função de assistente de pesquisa e planejam oferecer uma remuneração de US$ 25/hora, trabalhando com uma equipe de investigadores e pesquisadores acadêmicos.

O lançamento da organização vem após um período brutal de repercussões de abuso sexual nos Estados Unidos. A queda do ex-cardeal Theodore McCarrick, que renunciou seu cargo do Colégio dos Cardeais em agosto, após revelações de que teria abusado de uma série de seminaristas e pelo menos um menor, fez com que várias pessoas pedissem uma liderança leiga mais ampla na responsabilização dos bispos pelos casos de acobertamento.

Além disso, a divulgação do relatório da Suprema Corte da Pensilvânia detalhando sete décadas de abusos cometidos por mais de 30 padres abusadores resultou em um compromisso dos bispos dos EUA para uma revisão completa das políticas de denúncia e responsabilização.

Imam disse que o relatório revelou que autoridades da região estavam cientes dos contínuos abusos e acobertamentos. Portanto, o Relatório do Chapéu Vermelho busca, assim que possível, realizar uma investigação nos locais em que reside cada cardeal.

Ele ainda descreveu a dupla proposta do relatório: compartilhar conhecimentos com cada cardeal na tentativa de melhor informá-los sobre os colegas eleitores e disponibilizar informações publicamente para que os leigos católicos possam ter acesso.

“Os cardeais precisam ser responsabilizados publicamente, portanto tem de haver alguma cultura de vergonha”, disse. “Eles sabem que se votarem em determinada pessoa.... as pessoas do seu rebanho e seus pastores saberão”.

“Isso é difícil. Toda decisão tem seu lado obscuro. Reconhecemos isso”, acrescentou. “Estamos dispostos a enfrentar isso em oração e jejum... porque não podemos deixar que as pessoas continuem a permitir que nossas crianças, os inocentes, os jovens, os seminaristas sejam devorados da forma que são”.

Imam também disse que dez ex-agentes do FBI estão envolvidos na investigação, sendo que dois eram chefes de investigação em questões eclesiásticas.

Em um e-mail a que a Crux teve acesso, enviado por Philip Nielsen, editor-chefe do Relatório do Chapéu Vermelho, para pessoas que poderiam estar interessadas, em setembro de 2018, ele destacou que todos os cardeais serão investigados.


“Todos os dossiês terão uma classificação na parte superior indicando a conexão do cardeal com os escândalos e abusos, como ‘culpa severa, acusações plausíveis ou inocente’. A sentença final de cada um será baseada nas evidências mais contundentes e nas recomendações dos melhores especialistas”, escreveu.

Um sistema de classificação revisado foi distribuído no domingo, e os cardeais receberam uma classificação que se constitui em “Fortes evidências de abuso/corrupção, Algumas evidências, Evidências positivas contra abuso/corrupção”.

Imam declarou que com o tempo eles pretendem expandir e fornecer uma auditoria completa dos bispos também. Ele disse para os presentes do domingo que a organização não buscava ir adiante com uma agenda ideológica, mas sim responder como cada cardeal está em “acordo” com a Congregação para a Doutrina da Fé, o serviço de fiscalização doutrinário do Vaticano.

Quando um dos participantes perguntou se o relatório indicaria se os cardeais eram homossexuais, ele respondeu que seguiria o direito civil conforme necessário, mas que também seguiria a lei moral da Igreja, acrescentando que “se houver boatos de que ele é homossexual, será observado muito cuidadosamente... mas precisamos ter certeza”.

Apesar de os materiais oficiais da organização sustentarem que não há intenção de atacar nenhum dos cardeais, o e-mail de Nielsen parece sugerir o contrário.

“Por exemplo, o cardeal [Pietro] Parolin, na página do Wikipédia do Secretário de Estado corrupto do Vaticano está muito benevolente atualmente, sem link algum a escândalos, apesar de ele ter sido reiteradamente associado a escândalos relacionados a bancos e ter aparecido na carta de Viganò”, afirmou.

A carta a que se refere é a de 11 páginas escrita pelo arcebispo Carlo Maria Viganò, ex-embaixador papal dos EUA, alegando que havia alertado Francisco de questões de má conduta de McCarrick em 2013, mas que o pontífice não teria feito nada.

“Podemos mudar isso... até o próximo conclave ele precisa ser conhecido no mundo todo como a desgraça da Igreja. Nosso plano seria fazer com que sua página do Wikipédia mostrasse algo como “Grupo de fiscalização da Igreja The Better Governance indica que Parolin é ‘Extremamente culpado de cometer abusos’, com um link para o relatório. Ao mesmo tempo, acrescentaria todas as citações de outras fontes que o conectam a toda a corrupção financeira, etc.”, acrescentou Nielsen.

O e-mail também revela planos em andamento de fazer um lançamento em alguma reunião do Napa Institute, em Washington D.C., durante esta semana. No entanto, Nielsen disse ao Crux que por enquanto não há nenhum plano oficial de anúncio público lá.

O Napa Institute, uma organização com sede na Califórnia fundada por Tim Busch, um importante católico conservador, cuja conferência anual de verão reúne várias centenas de filantropos católicos milionários e religiosos católicos de alto escalão em seu resort, está organizando uma conferência para a terça-feira sobre a “Reforma Autêntica” no Hotel Mayflower em Washington D.C.

Como se pode imaginar, o e-mail de Nielsen afirma que o grupo ainda está no processo de formar o Conselho Diretivo, e apenas um membro é mencionado nos materiais atuais: Phil Scala, CEO da Pathfinder Consultants International, Inc., que já trabalhou no FBI.

Além disso, três pessoas são indicadas como editores-pesquisadores do Relatório do Chapéu Vermelho: os professores Jay Richards, da Faculdade Busch de Economia da Universidade Católica da América, e Michael P. Foley e Melinda Nielsen, da Universidade Baylor.

Ainda que os materiais da organização insistam em que “não somos um grupo de lobby ou de facção”, Richards já trabalhou para o Acton Institute, um think tank libertário, e já criticou Francisco abertamente. Foley e Neilsen também foram associados a várias instituições e publicações conservadoras, como, por exemplo, Hillsdale College, Crisis, The Catholic Thing e First Things.

Os materiais da organização também mencionam o Center for Evangelical Catholicism (CEC) como o “patrocinador fiscal” que atualmente recolhe doações, até que seja concedido o estatuto oficial de organização sem fins lucrativos. De acordo com o site, o CEC é uma corporação sem fins lucrativos na Carolina do Sul que “busca desenvolver a Nova Evangelização formando católicos capazes de cumprir a Grande Missão”.

Nielsen disse ao Crux que muitos participantes que trabalharam em certas universidades católicas não iriam querer que sua afiliação se tornasse pública, pois a rede mais ampla é muito maior do que os aliados conservadores.

Acrescentou, ainda, que o grupo busca tornar seus “objetivos e objeções algo com que todos possam concordar”, e que alguns dos piores casos de abuso ainda da época do fundador dos Legionários de Cristo, o padre Marcial Maciel, estavam dentre grupos ou indivíduos que tipicamente se identificavam como conservadores.

Quando um dos participantes perguntou qual era o percurso completo do projeto, Imam respondeu: “o projeto não acaba nunca”.

“Sempre temos que estar prontos para um conclave”, avisou.

Com tradução de Luísa Flores Somavilla para IHU Online.


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