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Ensino religioso confessional está no fim, indica audiência

De 31 representantes da
sociedade, somente os dois da
Igreja Católica apoiam a disciplina 
Se a audiência pública realizada no STF (Supremo Tribunal Federal) na segunda-feira (10) sobre ensino público confessional em escolas públicas se refletir no plenário daquela Corte, essa modalidade de ensino está com os dias contados.

Dos 31 participantes que representaram a sociedade, somente os dois que falaram em nome da Igreja Católica opinaram a favor de aulas religiosas que se baseia em uma confessionalidade, a qual, aliás, na  maioria dos casos tem sido a católica.

A audiência foi uma iniciativa do ministro Luís Roberto Barroso, que é o relator da Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4439 na qual a Procuradoria Geral da República questiona o ensino religioso vinculado a uma crença específica.

Barroso vai usar os argumentos expostos na audiência como subsídio na formulação de seu voto.

Na audiência, Antônio Carlos Biscaia, representante da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil), defendeu a permanência do ensino confessional porque isso, argumentou, não significa fazer proselitismo religioso.

“O ensino religioso é distinto da catequese”, disse. “É uma disciplina que tem uma metodologia e linguagens adequadas em ambiente escolar, que é diferente da paróquia”.

O diplomata Luiz Sérgio Corrêa, outro representante da Igreja Católica, mais precisamente da Arquidiocese do Rio de Janeiro, disse que o ensino religioso é confessional porque é assim que a lei estabelece. Se fosse diferente, argumentou, o nome da disciplina seria “ensino da religião”.

Embaixador do Brasil junto à Santa Sé quando em 2008 o país e o Vaticano assinaram um controvertido acordo, dando privilégios à Igreja Católica, Corrêa argumentou não haver nenhuma inconstitucionalidade no ensino religioso porque ele não ofende a laicidade do Estado brasileiro.

Biscaia e Corrêa foram exceções em uma audiência marcada por manifestações enfáticas contra o ensino religioso confessional, inclusive da parte de líderes religiosos.

Vanderlei Batista Marins, presidente da CBB (Convenção Batista Brasileira), afirmou se contra esse tipo de ensino religioso não só o confessional, mas “qualquer que seja o modelo”.

“A posição do Estado deve ser de neutralidade e imparcialidade”, disse.

A Iurd (Igreja Universal do Reino de Deus) também defendeu a extinção do ensino religioso.

Renato Gugliano Herani, advogado da igreja, afirmou que o sistema educacional do país não está preparado para oferecer esse tipo de ensino de maneira igualitária, sem o favorecimento a religiões e crença.

A FEB (Federação Espírita Brasileira) também é contra a existência de ensino religioso, seja confessional ou não.

Alvaro Chrispino, seu representante, disse que, como a extinção dessa modalidade de ensino não está em discussão, os espíritas defendem que a disciplina se concentre na moral, ética e formação do indivíduo moral.

Para a Conib (Confederação Israelita do Brasil), o artigo da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) que institui o ensino religioso nas escolas públicas é inconstitucional. Roseli Fischmann, representante da entidade, argumentou que transformar o ensino confessional e não confessional não é um bom encaminhamento. “É um recurso semântico.”

Por isso, disse Fischmann, quem deveria custear o ensino religioso — já que ele está previsto em lei — são as igrejas, e não o Estado.

A Fambras (Federação das Associações Muçulmanas do Brasil), por intermédio de seu vice-presidente, Ali Hussein El Zoghbi, propôs um ensino religioso de caráter ecumênico.

“O conhecimento das diferenças é um pressuposto para afastar o preconceito”, disse. “A religião tem a capacidade de contribuir com princípios éticos.”

O ponto de vista da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) é de que cada grupo religioso tem o direito de organizar o ensino de sua crença, mas não no espaço público, porque o Estado brasileiro é laico.

“A escola não pode ser um local que privilegie essa ou aquela religião”, disse Franklin de Leão, presidente da confederação, que representa 2,5 milhões de trabalhadores em educação filiados a 48 sindicatos.

O Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação) reconheceu que a religião tem grande importância para os brasileiros e, por isso, se justifica uma disciplina para essa matéria, mas o caráter não pode ser confessional.

Eduardo Deschamps, presidente do conselho, afirmou que o conteúdo do ensino religioso tem de ser definido por representantes das religiões. “Várias experiências em estados da federação comprovam que é possível um ensino religioso que abarque os vários credos”, disse.

O Anis (Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero) ressaltou ser importante regular o ensino religioso não confessional porque se trata, a rigor, de garantir a liberdade constitucional de crer ou não em divindade, além de firmar os princípios da igualdade e da não discriminação.

A professora Débora Diniz, representante do Instituto, afirmou que o ensino religioso é a única disciplina cujo material didático não é regulado nem avaliado pelo Ministério da Educação e Cultura, o que tem sido a causa da adoção pelas escolas de livros que violam a igualdade entre as pessoas.

Ela informou que estudo feito pelo Anis em 2010 constatou em livros de ensino religioso expressões discriminatórias às pessoas não heterossexuais e a portadores de deficiências.

O Observatório da Laicidade na Educação, pelo seu representante Luiz Antônio da Cunha, afirmou que a introdução do ensino religioso na Constituição foi um retrocesso na construção da República brasileira.

Disse que, por isso mesmo, essa modalidade de ensino não pode ter o caráter proselitista, o que significa que tem de ser não confessional e facultativa.

Cunha disse que, pela LDB, o ensino religioso já é facultativo, mas na prática isso não ocorre porque em muitos casos ele é imposto aos estudantes.

O representante da Amicus DH – Grupo de Atividade de Cultura e Extensão da Faculdade de Direito da USP, professor Virgílio Afonso da Silva, disse que esse ensino deve ser não confessional, de modo que as crianças tenham contato com diferentes histórias e culturas.

Para o professor Oscar Vilhena Vieira, da Conecta Direitos Humanos, o ensino religioso confessional está em confronto com a Constituição, que proíbe qualquer forma estatal de apoio a uma religião. “A preocupação fundamental é de que o Estado não possa lotear o sistema educacional para cultos e religiões.”

A Comissão Permanente de Combate às Discriminações e Preconceitos de Cor, Raça, Etnia, Religiões e Procedência Nacional da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro comunicou que não aceita ensino religioso confessional porque o Estado não pode financiar qualquer tipo de proselitismo religioso.

O deputado estadual Carlos Minc (PT), representante da comissão, informou que nas escolas onde há orientação confessional é maior entre os estudantes a intolerância contra os seguidores de religiões de matriz africana e contra as mulheres.

“A defesa necessária da liberdade religiosa se acentua com a defesa da laicidade. Como é dado, o ensino religioso acaba sendo um instrumento de intolerância”, disse.

Para a Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação, que foi representada na audiência pelo pesquisador Salomão Barros Ximenes, o ensino religioso é com frequência a porta de entrada para violação de liberdades fundamentais e de obstáculo à implementação de algumas diretrizes de direito à educação, como o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira, dos direitos humanos e das diversidades sexual e de gênero.

Thiago Gomes Viana, representando a LiHS (Liga Humanista Secular do Brasil), associou o ensino religioso ao retrocesso que se verifica na política brasileira, de onde uma bancada religiosa tem tentado empurrar a sociedade brasileira para um conservadorismo fundamentalista.

Para ele, o ideal seria que não houvesse ensino religioso de qualquer modalidade. Mas como, para isso, haveria necessidade de uma emenda constitucional, o apoio da liga vai para o ensino não confessional.

O ministro Barroso encerrou a audiência informando que a Adin do ensino religioso será levada ao plenário do STF provavelmente no segundo semestre deste ano.

Filho de uma judia com um católico (ele cresceu frequentando sinagogas e igrejas), Barroso disse que a expectativa era de que a modernidade colocasse a religião de lado, o que não ocorreu, mas, conforme disse em outra oportunidade, a crença religiosa pertence à esfera privada, não a pública.

Íntegra da audiência



Com informação da Agência do STF. 





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