Pular para o conteúdo principal

Fundamentalismo cristão tem se expandido na política brasileira

por Jean Wyllys

Radicais cristãos à moda
 brasileira  perseguem religiões
 de matriz africana
Em datas recentes e muito próximas, quatro episódios nos chocaram. Pelo menos chocaram a nós que respeitamos as diferenças religiosas, étnicas, sexuais, de gênero e a diversidade cultural resultante delas. Na cidade mineira de Montes Claros, Ítalo Ferreira da Silva, membro de uma seita cristã neopentecostal, foi preso após destruir sete imagens sacras numa igreja católica. Na Baixada Fluminense, o "barracão" da ialorixá Mãe Conceição de Lissá foi incendiado no mesmo dia em que o muro do babalorixá Germano Marino amanheceu pichado com os dizeres "Vamos matar os gays" e "Deus abomina os gays". Na semana anterior, um delegado da região comentou em uma matéria sobre o dia dos namorados que o casal retratado na matéria deveria "apanhar de cipó" por assumir a relação homoafetiva. Tudo isso enquanto um pastor faz campanha por boicote a "Em Família", novela que ousa retratar o amor entre duas mulheres.

Não se iludam que esses sejam casos isolados, sem relação entre si. Muito menos que correspondam a agonias privadas. Os quatro episódios citados acima são expressões do fundamentalismo cristão e o têm como causa.

Entendo o incômodo que a expressão "fundamentalismo cristão" possa trazer à maioria dos cristãos brasileiros, uma vez que estes não desejam se ver confundidos com fundamentalistas (e não devem mesmo ser confundidos!). Mas a verdade é que, sim, existe no Brasil um fundamentalismo cristão. E ao contrário do que sugerem os telejornais, o fundamentalismo não é uma prerrogativa apenas do islamismo.

Toda religião se fundamenta em um conjunto de narrativas, codificado ou não. Quando um religioso lê ou toma esse conjunto de narrativas como verdades absolutas a serem impostas a todas as pessoas, dizemos que ele é um fundamentalista. Nem todo cristão ou muçulmano ou judeu é fundamentalista, mas alguns cristãos, muçulmanos ou judeus o são.

No caso do fundamentalismo cristão à moda brasileira, este se materializa na difamação e perseguição sistemática da comunidade LGBT e de outras religiões, sobretudo as de chamada "de matriz africana" (a Umbanda e o Candomblé), já que, em relação a estas, ainda há um viés racista por serem religiões "de negros".

O sinal de alerta se acende ao observar os detalhes do primeiro dos quatro episódios citados: suspeita-se que Ítalo não goze de boa saúde mental e de que teria sido por conta disto que ele teria repetido o famoso ato de um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus que investiu contra imagem sacra em rede nacional de televisão. Quando um pastor defende publicamente que pessoas merecem punição física pelo seu pecado, quem garante que uma ovelha em sua doença mental não vá, de fato, executar o “julgamento divino”?

O proselitismo fundamentalista tem saído dos púlpitos e vigorado nas redes sociais, mas, antes (e o que é pior!), na política. Enquanto muitos destes líderes fundamentalistas se candidatam ao Legislativo (formando bancadas que se notabilizam pela intolerância e ignorância, mas também pelas faltas às sessões, ineficiência e problemas com a justiça), outros candidatos e candidatas flertam com eles na esperança de ganhar os votos de seus rebanhos e o dinheiro que adquirem com a exploração comercial da fé.

Lamento profundamente que os principais candidatos à Presidência da República e aos governos dos Estados não estejam rechaçando, de maneira clara e efetiva, o fundamentalismo cristão e seu estímulo à intolerância e à violência contra minorias sexuais e religiosas, mas, antes, estejam cortejando esses inimigos da democracia em troca de dinheiro para suas campanhas e dos votos de seus rebanhos.

Conclamo os cristãos não fundamentalistas, católicos e evangélicos, a reagirem ao fundamentalismo; a virem a público deixar claro que esses líderes fundamentalistas não lhes representam; e a se unirem aos adeptos de religiões minoritárias e ateus na defesa da laicidade do Estado; da diversidade cultural e da cultura de respeito aos diferentes.

Esse texto foi publicado originalmente na Carta Capital. Jean Wyllys é deputado federal (PSOL-RJ).





Bellotto assumiu seu ateísmo por causa do fanatismo religioso
janeiro de 2014

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

Ateísmo faz parte há milênios de tradições asiáticas

Chico Buarque: 'Sou ateu, faz parte do meu tipo sanguíneo'

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê...

Escritor ateu relata em livro viagem que fez com o papa Francisco, 'o louco de Deus'

Físico afirma que cientistas só podem pensar na existência de Deus como hipótese

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Padre acusa ateus de defenderem com 'beligerância' a teoria da evolução