pelo sociólogo José de Souza Martins, para o Estado de S.Paulo
A notícia de que a lapidação de Sakineh Mohammadi Ashtiani, a iraniana condenada à morte por apedrejamento, teria sido comutada para enforcamento trouxe um estranhíssimo alívio para os que se manifestaram contrários à pena e à execução. Embora punições desse tipo ocorram frequentemente nos vários países em que se aplica a lei da sharia, pelo apedrejamento ou pela mutilação dos condenados, o caso de Sakineh teve no Brasil curiosa repercussão.
Num comício eleitoral em Curitiba, na campanha de Dilma Roussef para a Presidência da República, fora da pauta e fora da agenda do que de um presidente da República se espera, Lula, levado pelo seu costumeiro entusiasmo em ajuntamento público, ofereceu à condenada do Irã asilo no Brasil. Foi longe: "Se vale minha amizade e carinho que tenho por (Mahmoud) Ahmadinejad, se essa mulher está causando um incômodo, nós a receberíamos no Brasil".
A bravata foi mais longe ainda. Referindo-se a Dilma, insistiu: "Quando ela for eleita, vai telefonar (para o presidente do Irã) e dizer: companheiroAhmadinejad, meu companheiro Lula pediu que você não fizesse isso". Pouco depois, numa reunião do Mercosul, na Argentina, justificou-se dizendo que é cristão.
É inacreditável que as relações diplomáticas do Estado brasileiro fiquem à mercê dessa retórica de botequim e de amplos desconhecimentos e omissões em face do problema. Do chefe de Estado era de esperar que declarasse em palácio e não na rua que o Brasil adotaria cautelas para evitar que um país que tem tal concepção da Justiça e do castigo pudesse dispor da possibilidade de vir a ter a bomba nuclear, muito mais perigosa ao gênero humano.
O presidente do Brasil poderia ter se inquietado com o fato de que o país que governa está entre os que mais lincham no mundo e que, de 2.028 linchamentos documentados aqui ocorridos nos últimos 60 anos, em 12,1% deles, ou em 246 casos, o condenado morreu ou foi gravemente ferido por apedrejamento.
A diferença é que no Irã eles de preferência apedrejam mulheres e nós, de preferência, apedrejamos homens. Gilberto Freyre, em suas referências à influência da cultura muçulmana nos costumes brasileiros, poderia ter incluído a lapidação. Nossas práticas, nesse capítulo, são mais refinadas porque influenciadas por técnicas e concepções herdadas da Inquisição, dita cristã, que fazia espetáculo público da queima de pessoas vivas.
O linchamento entre nós não é violência impensada. Por isso, prefiro me referir a suas vítimas como condenados. Em 14 casos o ritual se explicitou sob a forma de julgamento, até com voto dos jurados.
Num caso ocorrido em 1984, no bairro de Cidade Dutra, em São Paulo, Osvaldo P., de 33 anos, ficou sabendo como é que isso funciona. Saído da cadeia havia três dias, após cumprir pena por três anos, era conhecido como traficante de maconha e pelo uso de drogas, por furtos, por espancamento de moradores e por expulsar moradores do bairro. Na manhã do dia 2 de abril foi agarrado por um grupo de moradores e levado para um bar. Os que chegavam, homens, mulheres e crianças, passaram a participar do julgamento. Ouviu as acusações, houve votação e foi condenado à morte. Pediu para ver os dois filhos pequenos, o que lhe foi negado. Os julgadores lhe ofereceram cachaça. Foi, então, morto a pedradas, pauladas e pontapés. Seu corpo foi arrastado pela rua. Houve festa para comemorar a morte. Quarenta e duas pessoas assumiram sua participação no justiçamento.
No sertão da Bahia, em 1996, ocorreu uma das manifestações extremas do linchamento brasileiro. Edvaldo S., de 19 anos, havia tentado estuprar sua antiga professora de escola, de 29 anos, que morava sozinha com a avó cega. Como ela resistisse, feriu a avó e perseguiu-a, matando-a a golpes de facão. Acabou preso e levado para a cadeia de Euclides da Cunha. Silenciosamente, durante a noite, um grupo de moradores do bairro rural do acontecimento desembarcou de um caminhão na porta da guarnição da Polícia Militar em que se achava o preso. Rendeu os 14 soldados, arrombou a cela, embarcou o preso e dirigiu-se ao local em que a moça fora morta. No caminho, cortou as orelhas de Edvaldo, depois castrou-o, esquartejou-o vivo no local em que cometera o crime e queimou-o.
Nos dois casos e em muitos outros são esses os ritos de desconstrução do corpo do condenado e, no modo da execução, de destituição simbólica de sua condição humana à vista do crime que originalmente o desumanizara. Portanto, no Brasil e no Irã, muito mais do que crueldade.
> Brasil é país dos linchamentos, afirma sociólogo.
fevereiro de 2008
> Lula faz uso político da iraniana condenada por adultério.
julho de 2010
A notícia de que a lapidação de Sakineh Mohammadi Ashtiani, a iraniana condenada à morte por apedrejamento, teria sido comutada para enforcamento trouxe um estranhíssimo alívio para os que se manifestaram contrários à pena e à execução. Embora punições desse tipo ocorram frequentemente nos vários países em que se aplica a lei da sharia, pelo apedrejamento ou pela mutilação dos condenados, o caso de Sakineh teve no Brasil curiosa repercussão.
Num comício eleitoral em Curitiba, na campanha de Dilma Roussef para a Presidência da República, fora da pauta e fora da agenda do que de um presidente da República se espera, Lula, levado pelo seu costumeiro entusiasmo em ajuntamento público, ofereceu à condenada do Irã asilo no Brasil. Foi longe: "Se vale minha amizade e carinho que tenho por (Mahmoud) Ahmadinejad, se essa mulher está causando um incômodo, nós a receberíamos no Brasil".
A bravata foi mais longe ainda. Referindo-se a Dilma, insistiu: "Quando ela for eleita, vai telefonar (para o presidente do Irã) e dizer: companheiroAhmadinejad, meu companheiro Lula pediu que você não fizesse isso". Pouco depois, numa reunião do Mercosul, na Argentina, justificou-se dizendo que é cristão.
É inacreditável que as relações diplomáticas do Estado brasileiro fiquem à mercê dessa retórica de botequim e de amplos desconhecimentos e omissões em face do problema. Do chefe de Estado era de esperar que declarasse em palácio e não na rua que o Brasil adotaria cautelas para evitar que um país que tem tal concepção da Justiça e do castigo pudesse dispor da possibilidade de vir a ter a bomba nuclear, muito mais perigosa ao gênero humano.
O presidente do Brasil poderia ter se inquietado com o fato de que o país que governa está entre os que mais lincham no mundo e que, de 2.028 linchamentos documentados aqui ocorridos nos últimos 60 anos, em 12,1% deles, ou em 246 casos, o condenado morreu ou foi gravemente ferido por apedrejamento.
A diferença é que no Irã eles de preferência apedrejam mulheres e nós, de preferência, apedrejamos homens. Gilberto Freyre, em suas referências à influência da cultura muçulmana nos costumes brasileiros, poderia ter incluído a lapidação. Nossas práticas, nesse capítulo, são mais refinadas porque influenciadas por técnicas e concepções herdadas da Inquisição, dita cristã, que fazia espetáculo público da queima de pessoas vivas.
O linchamento entre nós não é violência impensada. Por isso, prefiro me referir a suas vítimas como condenados. Em 14 casos o ritual se explicitou sob a forma de julgamento, até com voto dos jurados.
Num caso ocorrido em 1984, no bairro de Cidade Dutra, em São Paulo, Osvaldo P., de 33 anos, ficou sabendo como é que isso funciona. Saído da cadeia havia três dias, após cumprir pena por três anos, era conhecido como traficante de maconha e pelo uso de drogas, por furtos, por espancamento de moradores e por expulsar moradores do bairro. Na manhã do dia 2 de abril foi agarrado por um grupo de moradores e levado para um bar. Os que chegavam, homens, mulheres e crianças, passaram a participar do julgamento. Ouviu as acusações, houve votação e foi condenado à morte. Pediu para ver os dois filhos pequenos, o que lhe foi negado. Os julgadores lhe ofereceram cachaça. Foi, então, morto a pedradas, pauladas e pontapés. Seu corpo foi arrastado pela rua. Houve festa para comemorar a morte. Quarenta e duas pessoas assumiram sua participação no justiçamento.
No sertão da Bahia, em 1996, ocorreu uma das manifestações extremas do linchamento brasileiro. Edvaldo S., de 19 anos, havia tentado estuprar sua antiga professora de escola, de 29 anos, que morava sozinha com a avó cega. Como ela resistisse, feriu a avó e perseguiu-a, matando-a a golpes de facão. Acabou preso e levado para a cadeia de Euclides da Cunha. Silenciosamente, durante a noite, um grupo de moradores do bairro rural do acontecimento desembarcou de um caminhão na porta da guarnição da Polícia Militar em que se achava o preso. Rendeu os 14 soldados, arrombou a cela, embarcou o preso e dirigiu-se ao local em que a moça fora morta. No caminho, cortou as orelhas de Edvaldo, depois castrou-o, esquartejou-o vivo no local em que cometera o crime e queimou-o.
Nos dois casos e em muitos outros são esses os ritos de desconstrução do corpo do condenado e, no modo da execução, de destituição simbólica de sua condição humana à vista do crime que originalmente o desumanizara. Portanto, no Brasil e no Irã, muito mais do que crueldade.
> Brasil é país dos linchamentos, afirma sociólogo.
fevereiro de 2008
> Lula faz uso político da iraniana condenada por adultério.
julho de 2010
Comentários
Costumo comparar os petistas com os membros da IURD (Igreja Universal) por mais que mostre a eles as falcatruas, robalheiras, falta de ética, mais eles acham que devem defendê-los, que é tudo perseguição...
Gostaria de compartilhar esse vídeo.
Nosso amanhã... meus irmanos...
http://www.youtube.com/watch?v=whf-4jeVnmM
Sakineh foi acusada de adultério, coisa que muito me admira que não seja praticado por 100% das muçulmanas, tendo em vista a forma como são tratadas. Para nós do Ocidente é até difícil imaginar os absurdos, a humilhação que esta mulher, assim como a grande maioria das muçulmanas, deve ter passado nas mãos dos "homens da sua vida" (pai, irmãos e depois, "marido"). E, após todas as arbitrariedades que esta pobre mulher deve ter sofrido, ela , obviamente, não suportando mais, "trai" o marido (se é que isso realmente aconteceu). E aí, vem esse sociólogo imbecil (que, é claro, é um HOMEM) querer comparar esta mulher, Sakineh, com traficantes, estupradores e assassinos. Embora eu não seja adepta da "justiça pelas próprias mãos", convenhamos que nossas leis são "mães" para esses marginais. Se nossas leis realmente punissem como se deve um homem que estupra, mata, trafica drogas matando milhares de pessoas, esses casos não aconteceriam. Agora, cá entre nós, tiveram o que mereceram.
Pode-se dizer o mesmo de Sakineh?
se quiser procurar por execução sumária, vai falar com a policia de são paulo sob o comando do geraldo alckimin!
não que isso justifique os casos citados acima, nunca.
e quando o bonitão fala que no irã se apedreja mulheres e aqui, homens ele super "esquece" do absurdo que é a violência contra a mulher em todo o nosso pais.
sem mais comentarios. lamentável.
presidente tem ingerência na execução da justiça e se tentar dar algum pitaco, certamente
será execrado pelo 'juristas', o que esse governo tem feito sim é destinar
recursos aos estados na área de segurança o RJ é o maior exemplo disso; nada justifica, mas na Arábia Saudita, cujo rei é simpático e aliado dos donos do mundo, se pratica a mesma lei intolerante e não vejo ninguém levantar a voz a favor daquele povo, será que é só pelo Almadinejad?
Não tem nem comparação, É DE SOCIÓLOGOS COMO VC QUE O BRASIL ESTÁ CHEIO.
CALA A BOCA!!!!!!!!!!!!!!!!
Estamos falando de seres humanos aqui. A violência contra eles não foi, de forma alguma, justificável, assim como o apedrejamento da mulher.
O que o nosso amigo Sociólogo quis dizer é que nós não temos o direito de reclamar quanto à mulher apredejada por querermos - E sim, muitas vezes queremos - fazer justiça com as próprias mãos. Larguemos um pouco de hipocrisia e pensemos: Se uma mulher (Ou homem) seduzisse o seu marido (Ou esposa), você não quereria espancá-los até a morte?
Pensem nisso.
A propósito, além de vc ter nos brindado com toda sua imbecilidade e ignorância, nos brindou também com sua burrice. Aprenda a escrever, amigão... é "coincidência" e não "coecidencia". O que mais poderíamos esperar de vc, não é?
Abraços.
naquele país.Da mesma forma apoia a ditadura de Fidel Castro, inclusive Lula chamou os dissidentes de marginais.Estes são os fatos, agora, quando convém, o PT pode.....Tudo inclusive a estranha morte do escritor que deu uma bengalada no José Dirceu.
Impressionante a hiper-sensibilidade axiológica do pessoal que comentou, o que esperavam de um sociólogo?
Foi feita uma análise comportamental de duas culturas sociais diferentes,constatou-se que na sociedade muçulmana(iraniana) em questão há um comportamento social de apedrejar mulheres(em função do machismo vigente? lógico,mas não importa o juízo de valor na constatação,se é feita de um ponto de vista sociológico)
e na sociedade Brasileira há o comportamento social de linchamento(em função da má compreensão do conceito de justiça inerente á nossa cultura? sim,mas não importa o juízo de valor na constatação,se é feita de um ponto de vista sociológico,ponto de vista isento de juízos de valor).
Comparar fatos sociológicos,não significa defender pontos de vistas fundados em juízos de valor,como o machismo(identificado por o caso da muçulmana ser injusto pelo tratamento concedido á mulher),ou o feminismo(identificado nos comentários ao se ler menções á juízos de valor não mencionados no artigo,e defesas infundadas "tortuando" para o lado político e atacando os homens muçulmanos como se em algum momento eles tivessem sido defendidos pelo artigo).
Opinião(valorar)é uma coisa gente,constatar (Objetivar) é outra. ;)
Hipocrisia tem perna longa, e um dia cai de cara.
Os mesmos palhacinhos gozos que são contra o apedrejamento lá no cafundó do Judas são a favor de linchamento aqui. Se isso não é a própria definição de hipocrisia, eu não sei mais de nada e 2 + 2 pode ser 5.
Ao menos lá existe um julgamento, existe um sistema, uma instituição fria e seria que não pune sem provas, não é que nem aqui, um bando de macaco pobre e sem instrução agindo por instinto, querendo sangue porque foi incitado pelo "Balanço Geral" ou pelo pastor, lá é uma lei, aqui é apenas uns infelizes sem ensino médio de qualidade usando o velho argumento hitleriano de "não é mais humano" pra praticar brutalidades e torturas a seres humanos que deixariam até Torquemada de estomago embrulhado.
Panem et circenses, mas na falta desses, criam o próprio Coliseu, só que aqui os leões usam facões mal afiados e não dão a minima chance do gladiador se defender.
A sociedade brasileira consegue ser mais atrasada que a da própria Roma antiga.
Já no Irã, além de ser o governo o algoz dos linchamentos, são por motivos considerados fúteis perante nossa cultura, embora faça muito sentido na cultura deles.
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