Pular para o conteúdo principal

Banqueiro Dantas diz que Lula tem dinheiro no exterior


Da Veja desta semana:

A guerra nos porões

O banqueiro Daniel Dantas tem uma lista com contas em paraísos fiscais que seriam do presidente Lula e do resto da cúpula do PT

O banqueiro Daniel Dantas está prestes a abrir um capítulo explosivo na investigação sobre os métodos da "organização criminosa" que se instalou no governo e o estrago causado por ela ao país. Seu nome voltou ao foco na quarta-feira passada, durante o depoimento de Silvio Pereira, ex-secretário-geral do PT, à CPI dos Bingos. Na sessão, o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) revelou o teor de um documento no qual o banco Opportunity, controlado por Dantas, diz ter sofrido perseguição do governo Lula por rejeitar pedidos de propina de "dezenas de milhões de dólares" feitos por petistas em 2002 e 2003. A carta, escrita por advogados de Dantas e entregue à Justiça de Nova York, onde o banqueiro é processado pelo Citigroup por fraude e negligência, é só o começo de uma novela que, a julgar pela biografia de Dantas, não se resume a uma simples tentativa frustrada de achaque.

Para defender-se das pressões que garante ter sofrido do PT nos últimos três anos e meio, Dantas acumulou toda sorte de informações que pôde coletar sobre seus algozes. A mais explosiva é uma relação de cardeais petistas que manteriam dinheiro escondido em paraísos fiscais. Entre eles estão o presidente Lula, os ex-ministros José Dirceu (Casa Civil), Antonio Palocci (Fazenda), Luiz Gushiken (Secom), o atual titular da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, o diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda, e o senador Romeu Tuma (PFL-SP). A lista é fruto de um trabalho de investigação feito pelo americano Frank Holder, ex-diretor da agência internacional de espionagem Kroll. Ela apresenta uma série de números de contas, seus titulares, os nomes dos bancos e os saldos referentes ao primeiro trimestre de 2004.

Holder disse ter comprovado a existência das contas por meio de depósitos. Além disso, Dantas compilou metodicamente não só os pedidos de propina como também as contratações e os pagamentos efetivamente feitos para tentar aplacar as investidas do atual governo sobre seus interesses. Se pelo menos uma parte desse material for verdadeira, o governo Lula estará a caminho da desintegração. Isso, é claro, se o Brasil ainda mantiver as aspirações a se tornar um país sério. Se o material for fruto de falsificação, Dantas vai afundar-se ainda mais na confusão policial na qual se meteu desde que contratou a Kroll para montar dossiês de seus adversários dentro do governo. Em entrevista ao colunista Diogo Mainardi, o banqueiro dá uma idéia do que tem em mãos. Seu arsenal é maior.

VEJA teve acesso à lista das supostas contas dos petistas em setembro de 2005, com o conhecimento de Dantas. De posse dela, a revista deu início a um exaustivo trabalho de apuração. A reportagem encontrou-se com Frank Holder uma vez em Zurique, na Suíça, e outras duas vezes em Buenos Aires. Holder tem uma longa história no mundo da investigação. Oficial de inteligência da Força Aérea dos Estados Unidos, ele transferiu-se para a seção de assuntos latino-americanos da CIA no começo dos anos 90. Nessa condição serviu na Embaixada dos EUA em Buenos Aires até desligar-se, em meados dos anos 90, para fundar a empresa Holder Associates, adquirida em 1998 pela Kroll, da qual se tornou diretor. Em 2003 e 2004, como dirigente da Kroll, supervisionou o trabalho feito para a Brasil Telecom. Foi nesse período que conheceu Dantas e saiu-se com a lista das supostas contas dos petistas em paraísos fiscais.

Inicialmente, Holder explicou a VEJA que a lista fora obtida pela Kroll no curso da investigação de outro escândalo: o da quebra, no Brasil e na Itália, da companhia de laticínios Parmalat. Segundo ele, foram recuperados, nessa investigação, documentos que comprovariam detalhes do pagamento de propina da Parmalat a autoridades dos dois países. Desdobrados, esses dados teriam, por tabela, batido na rede de corrupção pessoal do governo do PT. Em dois encontros com a reportagem de VEJA, autoridades judiciais em Milão, encarregadas do caso Parmalat, afirmaram desconhecer essa conexão. Confrontado com a negativa italiana, Holder então mudou sua versão. Passou a dizer que as contas foram rastreadas por hackers pagos pelo ex-ministro argentino José Luis Manzano, símbolo da corrupção do governo Carlos Menem. Hoje dono do terceiro maior grupo de comunicações da Argentina, Manzano é freqüentemente acusado, em seu país, de manter uma equipe de investigadores privados para chantagear inimigos.

Em conversa com VEJA, em Buenos Aires, Manzano confirmou ter entregue "algumas contas de brasileiros" a Holder, como um favor pessoal, e autorizou seus funcionários a fornecer novos papéis que comprovariam como as contas dos petistas foram hackeadas. Nesses papéis, os saldos eram bem maiores do que os que constavam na lista original e um novo nome surgiu: o de Duda Mendonça

Por todos os meios legais, VEJA tentou confirmar a veracidade do material entregue por Manzano. Submetido a uma perícia contratada pela revista, o material apresentou inúmeras inconsistências, mas nenhuma suficientemente forte para eliminar completamente a possibilidade de os papéis conterem dados verídicos. Diante de tal indefinição, e tendo em vista que o nome de Dantas voltou a aparecer na CPI, VEJA decidiu quebrar o acordo feito com o banqueiro do Opportunity e Manzano. O compromisso inicial era preservar o nome de ambos, caso se pudesse comprovar a veracidade das contas. Nada mais justo: a revelação seria um serviço prestado ao Brasil, uma vez que levaria grandes nomes da República a ter de explicar a origem do dinheiro depositado no exterior.

Revelar agora que Dantas – e, por tabela, Manzano – está por trás de uma lista em que o presidente Lula aparece como dono de uma conta num paraíso fiscal viabilizará, acredita VEJA, que investigações oficiais sejam abertas. Ao mesmo tempo, isso impedirá que o banqueiro do Opportunity venha a utilizar os dados como instrumento de chantagem em que o maior prejudicado, ao final, seriam o país e suas instituições. No quadro da página ao lado, o elenco das contas foi reproduzido, com os números e nomes dos bancos propositalmente apagados. A revista só os cederá mediante requisição legal.

Dantas alega estar apenas defendendo-se de pressões e achaques dos petistas que queriam tirá-lo do comando da Brasil Telecom. Ainda que existam fortes evidências nesse sentido, o banqueiro não cabe na fantasia de vítima. Principalmente quando se sabe que usou dinheiro para acercar-se de pessoas próximas do presidente Lula e de José Dirceu. Dantas tentou seduzir Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, e seus sócios da Gamecorp. Antes de o grupo ser vendido à Telemar, o banqueiro pagava a Lulinha e sua trupe 100 000 reais mensais, para que fornecessem conteúdo para o portal de internet da Brasil Telecom. Por último, ofereceu uma bolada para tornar-se sócio da Gamecorp. No fim, game over para Dantas: Lulinha preferiu os agrados da rival Telemar. Dantas deu também 1 milhão de reais ao advogado Roberto Teixeira, padrinho de um dos filhos de Lula. Até hoje, ninguém explicou o que o compadre fez para merecer tanto dinheiro. Teixeira se limita a dizer que foi em troca de um serviço "sigiloso". O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, também mereceu atenção especial. Amicíssimo do deputado cassado por corrupção José Dirceu, ele foi contratado por Dantas a peso de ouro. Levou 8 milhões de reais para "assessorar" o banqueiro. Com isso, Dirceu, que foi ministro-chefe da Casa Civil de Lula, tornou-se mais sensível aos pleitos do Opportunity.

Tem mais. Dantas deu a Marcos Valério as contas publicitárias da Telemig Celular e da Amazônia Celular, num total de 130 milhões de reais. Além de fazer anúncios para Dantas, o carequinha levava ao banqueiro as propostas não republicanas de Delúbio Soares. Em 2004, o banqueiro colocou na sua folha de pagamentos a agência Matisse, de propriedade de Paulo de Tarso Santos, petista histórico e marqueteiro das campanhas de Lula em 1989 e 1994. A Matisse foi contratada para "reposicionar" a marca da Brasil Telecom. Mas o que fez mesmo foi ajudar a "reposicionar" Dantas frente ao governo petista.

Dantas é assim: rápido e precavido. Tão precavido que começou a reunir seu arsenal anti-PT ainda em novembro de 2002, logo após a vitória de Lula no segundo turno das eleições. Dantas foi, então, procurado pelo megainvestidor Naji Nahas. Dele recebeu um alerta: uma vez no poder, o PT romperia o acordo de acionistas que permitia a Dantas gerir a empresa de telefonia Brasil Telecom com dinheiro de fundos de pensão de estatais. Nahas também contou que o próprio Lula decidira tirar o Opportunity do comando da Brasil Telecom e entregá-lo à Telemar, de Carlos Jereissati. O investidor relatou pormenores de uma reunião do conselho da Telemar na qual se discutiram detalhes de um acordo firmado entre Jereissati e a cúpula do Partido dos Trabalhadores. Na ocasião também teria sido negociado um esquema de nomeações e ajuda financeira a campanhas eleitorais. Munido dessas informações, Dantas as resumiu num texto, que mandou criptografar. A versão codificada foi publicada na edição de 22 de outubro de 2002 do jornal Estado de Minas. Há dúvidas sobre a relevância do papel, mas Dantas anda com uma cópia dele no bolso. Cabe agora ao próprio banqueiro quebrar o seu "Código Da Vinci" pessoal.

No ano passado, Dantas foi defenestrado do comando da Brasil Telecom pelo Citigroup, que agora o acusa na Justiça americana por fraude e negligência. Ele diz ser vítima de uma conspiração entre o governo petista, que o achacou, e o banco americano, que o perseguiria a pedido do próprio presidente Lula. Foi essa briga judicial que produziu o documento lido pelo senador Arthur Virgílio na CPI dos Bingos. Outros milhares de e-mails e documentos serão divulgados em breve. Vários deles relatam encontros entre o presidente Lula e a direção do Citigroup. Outros detalham pedidos de propina feitos pelo PT a Dantas. Se quiser realmente esclarecer os fatos, o dono do Opportunity poderia contar publicamente o que pagou e o que deixou de pagar aos petistas.

Uma dica: ele poderia revelar, por exemplo, quantos encontros teve com o ex-presidente do Banco Popular, Ivan Guimarães, e o que foi discutido em cada um deles. Já se sabia que Guimarães operou como uma espécie de genérico de Delúbio durante a campanha presidencial de 2002. O que não se sabia, e Dantas certamente pode comprovar, é que Ivan continuou operando na clandestinidade em 2003 e em 2004, já no governo, achacando empresas e empresários. Ivan procurou Dantas em setembro de 2004. Queria falar sobre a investigação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) contra o Opportunity. Dias depois, a comissão julgaria um processo contra o banco, acusado de burlar regras do Banco Central ao admitir brasileiros num fundo de investimento das Ilhas Cayman. O Opportunity poderia ser inabilitado pela CVM, mas acabou recebendo uma pena leve. Esse Ivan é mesmo terrível.

Outra dica: Dantas poderia contar às CPIs como Yon Moreira da Silva, ex-diretor de Negócios Corporativos da Brasil Telecom, lhe apresentou a idéia de comprar parte da Gamecorp, a empresa de Lulinha. Aliás, o próprio Yon pode colaborar com as investigações. Depois que as circunstâncias vergonhosas do caso Gamecorp foram denunciadas por VEJA, o ex-diretor da Brasil Telecom declarou que a Telemar fizera um bom negócio e pagara um preço justo para tornar-se sócia do filho do presidente. O que Yon não conta é que essa declaração lhe foi implorada pelo próprio Palácio do Planalto – mais especificamente pelo então ministro Jaques Wagner, que, falando em nome do presidente Lula, pediu a Dantas que o ajudasse a preservar o filho do presidente. Como se vê, o obscuro Dantas daria uma ótima contribuição ao país se saísse de uma vez das sombras. Coragem, Dantas! 

(Leia abaixo a entrevista que Daniel Dantas concedeu ao colunista Diogo Mainard, da Veja)

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Veja 14 proibições das Testemunhas de Jeová a seus seguidores

Só metade dos americanos que dizem 'não acredito em Deus' seleciona 'ateu' em pesquisa

Baleias e pinguins faziam parte da cultura de povos do litoral Sul há 4,2 mil anos

Cigarro ainda é a principal causa de morte por câncer de pulmão no Brasil, com 80% dos casos

Vídeo mostra adolescente 'endemoninhado' no chão. É um culto em escola pública de Caxias

Tribunal do Ceará derruba lei que reduzia pena de condenados que lessem a Bíblia

Pereio defende a implosão do Cristo Redentor

Serviço de Informações da ditadura militar espionou mais de 300 mil brasileiros