Pesquisadores cristãos submetem o poder de cura da oração ao método científico. E ficam decepcionados
Na década de 1980, médicos cristãos decidiram testar se a oração poderia ajudar a curar doenças. O cardiologista Randolph Byrd, do Hospital Geral de São Francisco, liderou o primeiro grande estudo para avaliar o efeito da oração em pacientes com problemas cardíacos.
Após analisar os dados, Byrd concluiu que orações intercessoras — aquelas feitas por terceiros — melhoravam a recuperação. Ele agradeceu a Deus pelos resultados e publicou suas conclusões no Southern Medical Journal em 1988.
Logo depois, descobriu-se que o estudo tinha falhas graves. A coordenadora do experimento sabia quais pacientes recebiam orações, o que violava o princípio do duplo-cego. Mesmo assim, o trabalho inspirou novas pesquisas em outros centros médicos.
Entre 1999 e 2006, quatro novas equipes tentaram repetir o experimento de Byrd. Participaram pesquisadores cristãos do Hospital Saint Luke, da Clínica Mayo, da Universidade Duke e do Hospital Beth Israel Deaconess. Todos acreditavam no poder curativo da oração.
Os pesquisadores decidiram investigar a chamada oração intercessora porque ela pode ser testada cientificamente. O paciente não sabe que é alvo da oração, e quem ora não tem contato com ele. Isso elimina interferências psicológicas, como o efeito placebo.
Em todos os estudos, os pacientes foram distribuídos aleatoriamente entre dois grupos: um recebeu orações, o outro não. Nenhum paciente, médico ou equipe sabia quem estava em qual grupo. O principal indicador de sucesso foi a taxa de mortalidade após o tratamento.
Os resultados contrariaram as expectativas dos próprios pesquisadores. Nos cinco estudos, não houve diferença significativa entre quem recebeu orações e quem não recebeu. Em alguns casos, os que não receberam orações se saíram ligeiramente melhor.
Os dados mostraram que o número de mortes e complicações foi praticamente igual entre os grupos. A comparação geral, somando os cinco estudos, confirmou a ausência de qualquer efeito mensurável da oração.
Segundo Brian Bolton, a conclusão é inequívoca: “O deus judaico-cristão ignora orações por cura com a mesma frequência com que pacientes se recuperam. A saúde depende de medicina eficaz e de sorte, não de intervenção divina.”
Um resultado curioso veio do estudo do médico Herbert Benson, em Boston. Pacientes que sabiam que estavam sendo alvo de orações apresentaram mais complicações após a cirurgia. Ainda assim, a taxa de mortalidade deles foi idêntica à dos outros grupos.
Bolton observa que, se a promessa bíblica “Tudo o que pedirdes em meu nome, eu o farei” fosse verdadeira, todos os pacientes deveriam ter se recuperado. Nos cinco estudos, 116 pessoas morreram mesmo recebendo orações de intercessores cristãos.
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Outro argumento usado pelos defensores da oração é que todos os pacientes, mesmo os do grupo de controle, foram alvo de orações feitas por familiares e igrejas. Os cientistas responderam que as orações experimentais eram adicionais e mais específicas.
Se a oração tivesse algum efeito cumulativo, os pacientes que receberam orações “extras” deveriam ter se recuperado melhor. Isso não ocorreu. Para Bolton, esse tipo de justificativa ignora o ponto central: “Se Deus é onipotente, não deveria haver doenças a curar.”
As cinco pesquisas envolveram centenas de intercessores cristãos, protestantes e católicos, além de poucos participantes judeus, muçulmanos e budistas. Todos oraram pedindo recuperação rápida e sem complicações para os pacientes designados.
Nenhum dos grupos mostrou resultados estatisticamente diferentes. Mesmo quando analisados em conjunto, os números foram indistinguíveis do acaso. Para Bolton, isso mostra que “orações não afetam o curso de doenças cardíacas nem aumentam as chances de sobrevivência”.
O psicólogo destaca que os principais pesquisadores eram cristãos devotos. “Eles não estavam tentando refutar a fé, mas confirmá-la. Ainda assim, o método científico revelou que a oração não tem efeito mensurável sobre a saúde física.”
Bolton afirma que os resultados têm um valor pedagógico. “Esses estudos são uma lição sobre como a ciência pode testar até mesmo as crenças mais sagradas. A fé é pessoal, mas quando entra no domínio da saúde, precisa de evidências.”
Alguns pesquisadores reagiram com perplexidade. Um deles chegou a dizer que a oração poderia causar uma “sobrecarga espiritual” no corpo, o que seria perigoso. Bolton ironiza: “Se fosse verdade, faculdades de medicina já ensinariam terapias de oração.”
Para ele, os resultados reforçam a separação entre fé e ciência. “Crenças religiosas não são confirmadas por dados. A oração pode consolar, mas não cura. A recuperação é explicada por causas naturais, não por milagres.”
Bolton conclui que o episódio expõe um paradoxo: “Mesmo diante de evidências negativas, muitos ainda preferem manter a fé em um deus que, segundo eles, age por amor, mas que ignora súplicas por ajuda.”
> A íntegra do artigo de Brian Bolton foi publicada no Secular Humanism.
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