Pular para o conteúdo principal

Invasão de macroalgas no litoral assusta, gera prejuízo e desafia cientistas e governos

Após 10 anos, um evento extremo se repete na costa amazônica. Não foi uma nova seca ou nem cheia extrema, como em anos anteriores, mas uma invasão alienígena: uma chegada massiva às praias de Sargassum — um tipo de macroalga parda, que ocorre naturalmente no “Mar dos Sargaços”, próximo do Golfo do México e da Flórida. Esse organismo foi reportado pela primeira vez por Cristóvão Colombo, em sua pioneira viagem às Américas.


José Eduardo Martinelli Filho 
professor associado no Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará (UFPA)

João Adriano Rossignolo
professor do Departamento de Engenharia de Biossistemas da FZEA-USP

Leonardo Capeleto de Andrade
pesquisador com atuação em temas de qualidade ambiental, poluição e divulgação científica

A primeira vez que os cientistas notaram que essas algas estavam sendo registradas longe do local original, inclusive no Brasil, foi em 2011. As pesquisas logo mostraram que o material vinha de uma nova origem, um “Novo Mar dos Sargaços“.

Em pequena quantidade, as algas não geram problemas significativos. As chegadas massivas (arribadas), porém, podem liberar gases tóxicos e malcheirosos em sua degradação (como sulfeto de hidrogênio, amônia e metano), afetando a qualidade do ar e da água, com o potencial aumento da acidificação e redução do oxigênio dissolvido, afetando peixes, corais e algas nativas. Além disso, metais tóxicos, como o arsênio, já foram registrados em grandes concentrações nesses organismos.

O temor é isso virar um “novo normal”. No Caribe, a ocorrência do sargaço está gerando prejuízos bilionários para o turismo, por causa dos gastos com a limpeza das praias — que podem chegar a mais de US$ 1 milhão por quilômetro —, e cancelamentos de reservas, o que se notou até oito meses após os eventos. Já no Brasil, as chegadas nas praias ocorrem com uma frequência menor, porém sem um sistema de predição eficiente.

O Sargassum pelágico (aquele que flutua) foi confirmado no país apenas em 2014 e 2015, em Salinópolis (PA) e no arquipélago de Fernando de Noronha, e em 2021 no litoral do Maranhão e em Pernambuco. Não há, até o momento, outros registros oficiais dessas espécies invasoras, apesar de relatos de outros sargaços serem comuns, o que sugere uma fragilidade de monitoramento.

Além disso, o Brasil ainda não possui estimativas oficiais para os custos com limpeza e perdas turísticas. E o impacto para pescadores artesanais, que sofrem com as redes entupidas e danificadas pelas algas (o que reduz a captura de peixes), ainda são pouco estudados.


Foto: Geison Mesquita / Acervo pesquisadores

Registro de sargaço
em Salinópolis (PA)
em março de 2025;
evento pode causar
prejuízos para a
pesca e o turismo

Existem mais de 300 espécies de Sargassum no mundo (fora outras popularmente chamadas de “sargaços”), sendo a maior parte bentônicas — vivendo associadas ao fundo do mar. Porém, as duas espécies que ocorrem no Mar dos Sargaços (S. natans e S. fluitans) são as únicas flutuantes sendo estas as causadoras dessas grandes arribadas, essas invasões exacerbadas.

Os motivos da grande proliferação das massas flutuantes no Atlântico envolvem uma soma de fatores, como o aquecimento das águas superficiais do oceano, mudanças em correntes marítimas, aumento na quantidade de nutrientes trazidos dos continentes e até mesmo de tempestades de areia de origem subsaariana. 

Essas causas são incontroláveis, fazendo com que o problema do sargaço pelágico seja internacional e um dos mais complexos da oceanografia atual.

Apesar da falta de dados e desinformação na mídia sobre o assunto nos eventos anteriores, pesquisas vêm sendo desenvolvidas por universidades brasileiras, como a USP e a UFPA, com parcerias nacionais e internacionais para o aumento da preparação local para as arribadas de Sargassum na Amazônia.

Precisamos nos preparar para eventos futuros, que lamentavelmente tendem a ocorrer, e antecipar as soluções para estes impactos negativos — talvez até os transformando em oportunidades

Com um monitoramento via satélite e drones para estimar os volumes, alertando e comunicando a população local, estas algas poderão ser em breve usadas de forma segura na construção civil agregando em adobe, tijolos, cimentos ou painéis.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Professor obtém imunidade para criticar criacionismo nas aulas

A Corte de Apelação da Califórnia (EUA) decidiu que um professor de uma escola pública de Mission Viejo tem imunidade para depreciar o criacionismo, não podendo, portanto, ser punido por isso. A cidade fica no Condado de Orange e tem cerca de 94 mil habitantes. Durante uma aula, o professor de história James Corbett, da Capistrano Valley High School, afirmou que o criacionismo não pode ser provado cientificamente porque se trata de uma “bobagem supersticiosa”. Um aluno foi à Justiça alegando que Corbett ofendeu a sua religião, desrespeitando, assim, a liberdade de crença garantida pela Primeira Emenda da Constituição. Ele perdeu a causa em primeira instância e recorreu a um tribunal superior. Por unanimidade, os três juízes da Corte de Apelação sentenciaram que a Primeira Emenda não pode ser utilizada para cercear as atividades de um professor dentro da sala de aula, mesmo quando ele hostiliza crenças religiosas. Além disso, eles também argumentaram que o professor não ...

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Reação de aluno ateu a bullying acaba com pai-nosso na escola

O estudante já vinha sendo intimidado O estudante Ciel Vieira (foto), 17, de Miraí (MG), não se conformava com a atitude da professora de geografia Lila Jane de Paula de iniciar a aula com um pai-nosso. Um dia, ele se manteve em silêncio, o que levou a professora a dizer: “Jovem que não tem Deus no coração nunca vai ser nada na vida”. Era um recado para ele. Na classe, todos sabem que ele é ateu. A escola se chama Santo  Antônio e é do ensino estadual de Minas. Miraí é uma cidade pequena. Tem cerca de 14 mil habitantes e fica a 300 km de Belo Horizonte. Quando houve outra aula, Ciel disse para a professora que ela estava desrespeitando a Constituição que determina a laicidade do Estado. Lila afirmou não existir nenhuma lei que a impeça de rezar, o que ela faz havia 25 anos e que não ia parar, mesmo se ele levasse um juiz à sala de aula. Na aula seguinte, Ciel chegou atrasado, quando a oração estava começando, e percebeu ele tinha sido incluído no pai-nosso. Aparentemen...

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Por que é absurdo considerar os homossexuais como criminosos

Existem distorções na etimologia que vem a antiguidade AURÉLIO DO AMARAL PEIXOTO GAROFA Sou professor de grego de seminários, também lecionei no seminário teológico da igreja evangélica e posso dizer que a homofobia católica e evangélica me surpreende por diferentes e inaceitáveis motivos. A traduções (traições), como o próprio provérbio italiano lembra ( traduttore, tradittore ) foram ao longo dos séculos discricionariamente destinadas a colocar no mesmo crime etimológico, categorias de criminosos sexuais que na Antiguidade distinguiam-se mais (sobretudo na cultura grega) por critérios totalmente opostos aos nossos. O que o pseudoepígrafo que se nomeia Paulo condenava eram os indivíduos de costumes torpes, infames, os quais se infiltravam em comunidades para perverter mocinhas e rapazinhos sob pretexto de "discipulado" e com fins de proveito sexual. Nada diferente de hoje, por isso vemos que a origem da efebofilia e pedofilia católica e evangélica é milenar. O fato...

Secretaria do Amazonas critica intolerância de evangélicos

Melo afirmou que escolas não são locais para mentes intolerantes Edson Melo (foto), diretor de Programa e Políticas Pedagógicas da Secretaria de Educação do Estado do Amazonas, criticou a atitude dos 14 alunos evangélicos que se recusaram a apresentar um trabalho sobre cultura africana para, segundo eles, não ter contato com as religiões dos afrodescendentes. “Não podemos passar uma borracha na história brasileira”, disse Melo. “E a cultura afro-brasileira está inclusa nela.” Além disso, afirmou, as escolas não são locais para “formar mentes intolerantes”. Os evangélicos teriam de apresentar em uma feira cultural da Escola Estadual Senador João Bosco de Ramos Lima, em Manaus, um trabalho dentro do tema "Conhecendo os paradigmas das representações dos negros e índios na literatura brasileira, sensibilizamos para o respeito à diversidade". Eles se negaram porque, entre outros pontos, teriam de estudar candomblé e reagiram montando uma tenda fora da escola para divu...

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

CRP dá 30 dias para que psicóloga deixe de fazer proselitismo religioso

Líder de igreja é acusado de abusar de dezenas de fiéis