Pular para o conteúdo principal

Pesquisadores testam venenos de cobra em tratamento de doenças do sangue

Toxinas de animais peçonhentos podem ajudar no combate de leucemias, por exemplo


Gabriela Cupani
jornalista

Agência Einstein
serviço de apoio à imprensa na cobertura da ciência e saúde financiado pelo Hospital Israelita Albert Einstein

Pesquisadores brasileiros estão estudando o potencial terapêutico dos venenos de cobra e de aranha para a produção de medicamentos. As toxinas da jararaca e da aranha-caranguejeira, por exemplo, mostraram efeitos promissores para o tratamento de doenças do sangue e até de tumores.

Esse é um campo no qual o Brasil se destaca e que já rendeu medicamentos em uso no mundo todo. Um deles, o Captopril, uma das drogas mais utilizadas para tratar a hipertensão, foi desenvolvida a partir de pesquisas brasileiras feitas na década de 1960 com o veneno da jararaca.

Para ajudar o animal a caçar ou se defender, as peçonhas têm uma diversidade de efeitos, por exemplo, na coagulação do sangue e na atividade neuromuscular. 


Veneno de serpente mata 
células, característica que
pode ser usada na
formulação de medicamentos 

Recentemente, um estudo da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em parceria com a Universidade Federal de Catalão (GO) e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro, revisou 84 pesquisas brasileiras e constatou que a peçonha da serpente jararaca-caiçaca (Bothrops moojeni) tem 23 proteínas que agem na chamada hemostasia — a capacidade de o sangue fluir sem coágulos nem hemorragias — de diversas formas.

“Elas têm um efeito direto nas plaquetas ou em proteínas do sangue, com ação anticoagulante ou, ao contrário, pró-coagulante, e por isso podem se tornar alternativas para o tratamento de doenças trombóticas, hemorragias e distúrbios da coagulação”, diz a professora Carla Cristine Neves Mamede, da UFU, uma das autoras do trabalho.

Apesar da variedade de componentes e efeitos biológicos, até hoje apenas uma proteína do veneno da jararaca-caiçaca, a Batroxobin, serviu para o desenvolvimento de remédios usados para tratar doenças cardiovasculares. Já o veneno da aranha-caranguejeira (Vitalius wacketi) vem sendo estudado por cientistas do Hospital Israelita Albert Einstein e do Instituto Butantan pelo potencial contra o câncer.

Há mais de 20 anos, o bioquímico Thomaz Rocha e Silva observou que a toxina desse animal tinha ação citotóxica, ou seja, era capaz de matar células. 

“Descobrimos uma poliamina (molécula da toxina) com uma ação interessante”, conta o pesquisador.  

Posteriormente, a toxina foi isolada, purificada e sintetizada pelo Instituto Butantan.

Atualmente, essa versão da molécula, feita em laboratório, está sendo testada contra leucemias resistentes e apresentou resultados promissores, pois, em contato com as células tumorais, ela conseguiu induzir a morte delas. 

O próximo passo é avaliar a segurança e a eficácia em cobaias. Só depois seria possível começar os testes em pessoas.

“É um trabalho de muitos anos e é preciso também avaliar a viabilidade de produção e o custo/benefício”, explica Rocha e Silva. Isso porque as proteínas, após isoladas e sintetizadas, precisam ser modificadas para dar origem aos medicamentos.

“Precisamos testar centenas de moléculas para achar uma que funcione. Queremos mudar a realidade do tratamento de muitos tumores que têm baixa chance de cura. Se mudarmos 1% a chance de cura, já valeu a pena, pois são vidas sendo salvas”, explica o bioquímico.

“Essas pesquisas aumentam a possibilidade de suprir deficiências nos tratamentos tradicionais, minimizando a ocorrência de efeitos colaterais, por exemplo, e podem aumentar o número de medicamentos voltados a tratar e diagnosticar várias doenças”, diz a professora Mamede, da UFU.

Já o bioquímico ressalta que esses estudos ajudam a preservar a nossa riqueza biológica e devem estimular a educação das pessoas, até para prevenir acidentes e preservar os animais silvestres.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Professor obtém imunidade para criticar criacionismo nas aulas

A Corte de Apelação da Califórnia (EUA) decidiu que um professor de uma escola pública de Mission Viejo tem imunidade para depreciar o criacionismo, não podendo, portanto, ser punido por isso. A cidade fica no Condado de Orange e tem cerca de 94 mil habitantes. Durante uma aula, o professor de história James Corbett, da Capistrano Valley High School, afirmou que o criacionismo não pode ser provado cientificamente porque se trata de uma “bobagem supersticiosa”. Um aluno foi à Justiça alegando que Corbett ofendeu a sua religião, desrespeitando, assim, a liberdade de crença garantida pela Primeira Emenda da Constituição. Ele perdeu a causa em primeira instância e recorreu a um tribunal superior. Por unanimidade, os três juízes da Corte de Apelação sentenciaram que a Primeira Emenda não pode ser utilizada para cercear as atividades de um professor dentro da sala de aula, mesmo quando ele hostiliza crenças religiosas. Além disso, eles também argumentaram que o professor não ...

Reação de aluno ateu a bullying acaba com pai-nosso na escola

O estudante já vinha sendo intimidado O estudante Ciel Vieira (foto), 17, de Miraí (MG), não se conformava com a atitude da professora de geografia Lila Jane de Paula de iniciar a aula com um pai-nosso. Um dia, ele se manteve em silêncio, o que levou a professora a dizer: “Jovem que não tem Deus no coração nunca vai ser nada na vida”. Era um recado para ele. Na classe, todos sabem que ele é ateu. A escola se chama Santo  Antônio e é do ensino estadual de Minas. Miraí é uma cidade pequena. Tem cerca de 14 mil habitantes e fica a 300 km de Belo Horizonte. Quando houve outra aula, Ciel disse para a professora que ela estava desrespeitando a Constituição que determina a laicidade do Estado. Lila afirmou não existir nenhuma lei que a impeça de rezar, o que ela faz havia 25 anos e que não ia parar, mesmo se ele levasse um juiz à sala de aula. Na aula seguinte, Ciel chegou atrasado, quando a oração estava começando, e percebeu ele tinha sido incluído no pai-nosso. Aparentemen...

Aluno com guarda-chuva se joga de prédio e vira piada na UERJ

"O campus é depressivo, sombrio, cinza, pesado" Por volta das 10h de ontem (31 de março de 2001), um jovem pulou do 11º andar do prédio de Letra da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e virou motivo de piadinhas de estudantes, no campus Maracanã e na internet, por ter cometido o suicídio com um guarda-chuva. Do Orkut, um exemplo: "Eu vi o presunto, e o mais engraçado é que ele está segurando um guarda-chuva! O que esse imbecil tentou fazer? Usar o guarda-chuva de paraquedas?" Uma estudante de primeiro ano na universidade relatou em seu blog que um colega lhe dissera na sala de aula ter ouvido o som do impacto da queda de alguma coisa. Contou que depois, de uma janela do 3º andar, viu o corpo. E escreveu o que ouviu de um estudante veterano: “Parabéns, você acaba de ver o seu primeiro suicídio na UERJ.” De fato, a morte do jovem é mais uma que ocorre naquele campus. Em um site que deu a notícia do suicido, uma estudante escreveu: “O campus é depressivo, s...

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

No noticiário, casos de pastores pedófilos superam os de padres

Ateus são o grupo que menos apoia a pena de morte, apura Datafolha