Pular para o conteúdo principal

Ateu, ouvi no hospital: 'Só nos resta rezar'. Respondi: 'Tudo bem, doutor, mas também faça alguma coisa!'

“A morte não me dá medo, mas a sensação de que ela já está à porta é, como direi?, desconfortável. A expectativa é sempre estressante”


Paulo Lopes
jornalista, trabalhou na Folha de S.Paulo, Agência Folha, Diário Popular, Editora Abril e em outras publicações

Faz mais de dez anos.

Acordei ao som de Pink Floyd, uma das minhas obsessões. Fernanda, minha mulher, havia deixado no meu leito do hospital um tocador mp3. Seria a Comfortably Numb? Não lembro. Um trecho da música, na voz de David Gilmour, diz: “Tem alguém aí?”.

Depois, a Fernanda me contou que fiquei dez dias de coma, com os rins paralisados, pelos quais começa geralmente a falência múltipla dos órgãos. Para mim, foi como eu tivesse acordado de uma noite sem sonhos nem pesadelos.

Eu tinha me submetido a uma bariátrica, e ocorreu o que os médicos chamam de 'intercorrência'. Em bom português: havia dado merda.

Eu estava com uma febre cuja causa só dias depois os médicos descobririam. Era uma febrinha, mas preocupante por ser constante.

Durante o coma, os médicos falaram para a Fernanda algo como:  “De amanhã ele não passa, chama a família para se despedir dele”. E às pressas minhas filhas se reuniram diante o meu leito. 

E eu fui sobrevivendo — os dias passavam, e a febre não. Estava no hospital havia uns 40 dias, e já não aguentava estar ali sem ter um diagnóstico.

A morte não me dá medo, mas a sensação de que ela já está à porta é, como direi?, desconfortável. A expectativa é sempre estressante.

Um dia pressionei o médico, o chefe da equipe que me atendia: “Afinal, qual é a origem da febre?”

Ele respondeu que não sabia e propôs: “Só nos resta rezar”.

Fiquei furioso: “Não acredito nesse tipo de coisa. Estou em um hospital, não em uma igreja. Você é médico, não pastor. Faça alguma coisa!”

Se tivesse morrido naquele instante, eu seria como sempre tenho vivido: indignado com posturas que não fazem sentido, ao menos para mim.

O médico ficou surpreso com minha explosão — e eu também. Ele saiu do quarto sem dizer nada.

Nos dias seguintes, o hospital me submeteu a exames de ultrassom, ressonância magnética e raios X, e análise do sangue e urina, tudo outra vez.

Os laudos mostraram que havia no meu estômago uma bolsa de pus — retirada às pressas para que não houvesse uma infecção generalizada. E a febre passou.

Perdi oito quilos em alguns meses, mas voltei a superar o peso anterior em pouco tempo.

Não digo que a bariátrica não funcionou, a culpa foi minha, não segui a dieta prescrita. Mas, de qualquer maneira, se alguém me perguntar, recomendarei que não faça bariátrica nem vá um médico que peça ao paciente que reze.

Comentários

Maravilha! Você escapou dessa medicina tosca, assassina, ridícula, medieval, que mistura feitiçaria com Idade das Trevas do cristianismo. Não podemos em hipótese alguma perder um pensador de primeira linha, primeiro mundo, como você. Este país está condenado às Trevas, meu irmão do ateísmo científico. Jogo na quina há vários anos! Assim que sair meus números vou deixar uma grana para ajudar em suas publicações e ir morar na Estônia, país mais ateu do mundo! Não suporto mais ouvir "graças a deus'', ''Se deus quiser'', e toda uma gama de besteiras que a grande mídia incentiva em impiedosa e satânica lavagem cerebral às pobres massas populares já descerebradas!

Post mais lidos nos últimos 7 dias

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Vicente e Soraya falam do peso que é ter o nome Abdelmassih

Chico Buarque: 'Sou ateu, faz parte do meu tipo sanguíneo'

Ateísmo faz parte há milênios de tradições asiáticas

Escritor ateu relata em livro viagem que fez com o papa Francisco, 'o louco de Deus'

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

Santuário Nossa Senhora Aparecida fatura R$ 100 milhões por ano

Basílica atrai 10 milhões de fiéis anualmente O Santuário de Nossa Senhora de Aparecida é uma empresa da Igreja Católica – tem CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) – que fatura R$ 100 milhões por ano. Tudo começou em 1717, quando três pescadores acharam uma imagem de Nossa Senhora no rio Paraíba do Sul, formando-se no local uma vila que se tornou na cidade de Aparecida, a 168 km de São Paulo. Em 1984, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) concedeu à nova basílica de Aparecida o status de santuário, que hoje é uma empresa em franca expansão, beneficiando-se do embalo da economia e do fortalecimento do poder aquisitivo da população dos extratos B e C. O produto dessa empresa é o “acolhimento”, disse o padre Darci José Nicioli, reitor do santuário, ao repórter Carlos Prieto, do jornal Valor Econômico. Para acolher cerca de 10 milhões de fiéis por ano, a empresa está investindo R$ 60 milhões na construção da Cidade do Romeiro, que será constituída por trê...

Mulheres tendem a ser mais religiosas que os homens, mas nos EUA geração Z pode mudar isso

Documentário relata abusos sexuais do autor dos mosaicos do Santuário de Aparecida

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...