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Diocese de Roma reabilita Rupnik e levanta dúvidas sobre sua excomunhão

O padre é acusado por pelo menos 20 mulheres de abuso psicológico e sexual; Vaticano estaria sendo complacente com ele
jornal italiano

O ex-jesuíta é acusado de abusos contra pelo menos vinte mulheres, mas a visita canônica ao centro que fundou vai na direção oposta: “No Centro Aletti existe uma vida comunitária saudável, sem quaisquer questões críticas particulares”. Uma reviravolta que poderia ser dirigida pelo papa.

“Resulta claramente que dentro do Centro Aletti existe uma vida comunitária saudável, sem quaisquer questões críticas particulares”: isto, em resumo, é o resultado da visita canônica ordenada pelo cardeal vigário de Roma, dom Angelo De Donatis, ao Centro fundado e há muito dirigido por Marko Rupnik, o ex-jesuíta acusado de ter abusado de pelo menos vinte mulheres.

Não apenas isso: o cardeal vigário questiona uma sentença do Dicastério para a Doutrina da Fé (anteriormente Congregação) quando declara que “o Visitador pôde identificar e, portanto, relatou procedimentos gravemente anômalos, cuja análise gerou sérias dúvidas até mesmo sobre o próprio pedido de excomunhão”.

Trata-se da excomunhão em que Rupnik incorreu por ter absolvido em confissão uma mulher com quem teve relações sexuais e que lhe foi remetida poucos dias depois, provavelmente pelo próprio papa. Ora, o fato de o vigário geral declarar hoje que “apresentou o relatório às autoridades competentes” devido à gravidade das conclusões sobre o “pedido de excomunhão” parece evidenciar um confronto clandestino no Vaticano em nome de Rupnik.

A investigação

A visita canônica, iniciada em 16 de janeiro deste ano (2023) investigou a dinâmica interna da equipe do Centro Aletti, associação pública de fiéis desde junho de 2019, e em particular, as relações entre o atual grupo de gestão e Rupnik.

O relatório final do visitador responsável, padre Giacomo Incitti, professor de direito canônico na Pontifícia Universidade de Urbana, é claro: não há nada que se oponha ao que está acontecendo na Via Paolina.

Com efeito, o grupo saiu fortalecido: “a história”, na opinião de Incitti, “ajudou as pessoas que vivem a experiência do Centro Aletti a fortalecer a confiança no Senhor, na consciência de que o dom da vida de Deus também abre espaço através da provação”.

Os membros do Centro Aletti, apurou o visitador, “embora entristecidos pelas acusações recebidas e pela forma como foram tratadas, optaram por manter o silêncio — apesar da veemência da mídia — para guardar o coração e não reivindicar alguma irrepreensibilidade com o objetivo de se colocar como juiz dos outros”.

Sem problemas

Não há problema, então. Nada a dizer sobre o fato de a diretora Maria Campatelli estar na primeira fila no passado dia 5 de março, juntamente com o resto da equipe e o grupo de jesuítas (que agora abandonam a Companhia após a expulsão de Rupnik, ratificada no passado dia 14 de julho), quando Rupnik concelebrou na Basílica de Santa Prassede, em Roma, violando a proibição dos seus superiores de exercer atividades ministeriais e sacramentais em público.

Nada a dizer, nem sequer sobre os exercícios espirituais que Rupnik deveria ter realizado para o Centro Aletti, violando as restrições impostas pela Companhia de Jesus e, sobretudo, nada a assinalar sobre os abusos que o sacerdote e artista também cometeu nas instalações do Centro Aletti, em Roma, aproveitando-se do seu papel, pois mais de uma vítima testemunhou à Companhia de Jesus durante a investigação lançada em fevereiro passado.

Resumindo, está tudo normal. Algumas alterações no Estatuto foram necessárias, dada a saída da equipe jesuíta do Centro, mas, fora esses ajustes técnicos, os propósitos fundadores permanecem intactos.
A direção do Papa

Resta saber o que acontecerá agora que o cardeal De Donatis lançou a bomba sobre a excomunhão, imposta a Rupnik em 2020 com uma sentença assinada pelo cardeal Luis Ladaria Ferrer, na época prefeito da Congregação (atualmente, Dicastério) para a Doutrina da Fé.

Sem a subsequente revogação, questionar as condições da excomunhão parece ser um claro ato de desafio ao citado dicastério, com um único objetivo: a reabilitar Rupnik, em desprezo pela Companhia de Jesus que decidiu a sua expulsão e aos bispos eslovenos que condenaram os abusos, sem mencionar as vítimas.

Não só isso: é difícil acreditar que por trás do ataque pesado de De Donatis não esteja a aprovação, se não mesmo a direção, do Papa. Além disso, o próprio Francisco, há apenas três meses, ilustrou um mosaico de Rupnik presente em Santa Marta durante uma mensagem a um congresso mariológico brasileiro, um sinal inequívoco de apoio ao polêmico irmão.

Há três dias, a diretora do Centro Aletti, Maria Campatelli, que nunca escondeu estar totalmente ao lado de Rupnik, mesmo por meio de cartas públicas em que o ex-padre era retratado como vítima da imprensa e dos jesuítas, foi recebida pelo Papa em conversa privada. Hoje, à luz do resultado da visita canônica, não é difícil imaginar que no centro do encontro no Vaticano houve um apoio cordial às atividades do Centro, que poderá, portanto, continuar os proveitosos trabalhos de Rupnik com a bênção de Francisco.


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