Pular para o conteúdo principal

Tribunal mantém no Youtube funk com trechos do Alcorão

por Maria Fernanda Guimarães

Em terceira instância, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve, por unanimidade, dia 5 de fevereiro, a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo mantendo no Youtube o conteúdo de um funk chamado "Passinho do Romano" [vídeo abaixo].

O funk criado pelo autor, conhecido pelo nome de “Fezinho Patatyy”, mescla hinos do Alcorão com versos e música de sua própria lavra e se intitula "Eu já tô louco, já tô crazy". A outra parte do processo é o Google, proprietário do Youtube. 

A 3ª turma de desembargadores, no entanto, não se ateve ao mérito do processo, deixando o caso para o Superior Tribunal Federal (STF), onde a temática constitucional será julgada.

Mérito do processo e conhecimento processual

No caso, o mérito do processo será julgar se,  no plano constitucional, a liberdade de expressão (e de atividade artística e intelectual, claro) está no mesmo nível da liberdade religiosa e de expressão litúrgica.

A ação foi impetrada em primeira instância pela Sociedade Beneficente Muçulmana e a Justiça concedeu a liminar. No despacho, a juíza, Anna Paula Dias da Costa arrazoa que "o conteúdo do vídeo é, ao menos em sede de cognição sumária, potencialmente ofensivo, uma vez que nele são utilizadas frases e termos do Alcorão em contexto completamente diverso do religioso".

O Google recorreu e ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), cuja 3ª Câmara de Direito Privado suspendeu a liminar. O clipe musical "Passinho do Romano"  ficou no ar.

Com entendimento diverso do julgado na 1ª instância, o desembargador Dácio Tadeu Viviani Nicolau, que relatou o caso, em 2015 , afirmou que se "estivesse caracterizado plenamente, na letra da canção, discurso de ódio ou discriminatório, seria possível reconhecer de pronto a existência de ato que extrapola o limite tangível da liberdade de expressão e a consequente necessidade de fazer prevalecer a inviolabilidade da crença religiosa. Não é o caso, e a recorrente bem sabe disso.”

E garantiu: no plano constitucional, tanto a liberdade religiosa quanto a de expressão da atividade artística e intelectual são consideradas garantias individuais, invioláveis e livres.

A Sociedade Muçulmana fez subir a ação ao STJ. Que não entrou no mérito e só tomou "conhecimento processual".

Em sua queixa ao STJ, a Sociedade Muçulmana alegou que o funk seria ofensivo à religião islâmica por citar trechos do Alcorão numa letra que também apresentava palavras de cunho libidinoso. Também pediu a anulação de um acórdão proferido pelo TJSP, alegando falta de fundamentação na decisão  e violação aos artigos 489 e 1022 do Código de Processo Civil

No STJ, o desembargador Villas-Bôas Cueva não se ateve ao mérito do processo, isto é, não esclareceu se o direito à liberdade de expressão (inciso IV do artigo 5º da Constituição) prevalece sobre o direito à liturgia religiosa (inciso VI da CF).

O ministro Villas-Boas Cuevas só tratou do tema processual. Disse apenas que a decisão de segunda instância não feriu os artigos 489 e 1022 do Código de Processo Civil. Os dispositivos preveem que as decisões judiciais devem ser devidamente fundamentadas. Para ele, foram. E o "Passinho do Romano" fica no ar.

Passinho vai para o Supremo

Agora, a resposta à questão constitucional caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF).

No entanto, desde a primeira instância, o desembargador Dácio Tadeu Viviani Nicolau, que relatou o caso no TJSP, afirmava que no caso em tela não houve ofensa, já que  não ficou caracterizado na letra "discurso de ódio ou discriminatório".

Passinho avança

Enquanto isso, o funkeiro   Fezinho Patatyy vai angariando likes no seu canal do YouTube. Além da primeira versão, de 2015, que tem quase 66 milhões de visualizações , ele gravou uma "versão 2018" (abaixo), agora junto com o parceiro "Rodrigo Patatá". A dupla criou novo funk mixado com recitação corânica, chamado  Tu tá moscando.
  


 'Passinho do Romano'
 na versão 2018 


Outros funkeiros também surfam na onda do sucesso de músicas com recitação do Alcorão. MC Nando e MC Luanzinho também criaram o  Vem Dançando. 

Ameaças, xingamentos e insultos foram postados contra todos eles  no YouTube. 




Processos citados

No TJSP:
1024271-28.2015.8.26.0100
Sociedade Beneficente Muçulmana x Google Brasil Internet Ltda.

No STJ:
REsp 1765579
Sociedade Beneficente Muçulmana x Google Brasil Internet Ltda.

No STF:
ARE 953822
União Nacional das Entidades Islâmicas x Google Brasil Internet Ltda.


Com informação de tribunais, Jota e Conjur



Aviso de novo post por e-mail

Justiça decide que funk com trechos do Corão não é ofensa  


Marchinha 'Cabeleira do Zezé' ofende Maomé, acusa fiel

Muçulmanos acusam Nike da ofensa de tênis que pisa em Alá

Filhos de imigrantes muçulmanos querem tirar a cruz da bandeira suíça




Aumenta nos EUA número de ateus em famílias muçulmanas


A responsabilidade dos comentários é de seus autores.

Comentários

Post mais lidos nos últimos 7 dias

Professor obtém imunidade para criticar criacionismo nas aulas

A Corte de Apelação da Califórnia (EUA) decidiu que um professor de uma escola pública de Mission Viejo tem imunidade para depreciar o criacionismo, não podendo, portanto, ser punido por isso. A cidade fica no Condado de Orange e tem cerca de 94 mil habitantes. Durante uma aula, o professor de história James Corbett, da Capistrano Valley High School, afirmou que o criacionismo não pode ser provado cientificamente porque se trata de uma “bobagem supersticiosa”. Um aluno foi à Justiça alegando que Corbett ofendeu a sua religião, desrespeitando, assim, a liberdade de crença garantida pela Primeira Emenda da Constituição. Ele perdeu a causa em primeira instância e recorreu a um tribunal superior. Por unanimidade, os três juízes da Corte de Apelação sentenciaram que a Primeira Emenda não pode ser utilizada para cercear as atividades de um professor dentro da sala de aula, mesmo quando ele hostiliza crenças religiosas. Além disso, eles também argumentaram que o professor não ...

90 trechos da Bíblia que são exemplos de ódio e atrocidade

Caso Roger Abdelmassih

Violência contra a mulher Liminar concede transferência a Abelmassih para hospital penitenciário 23 de novembro de 2021  Justiça determina que o ex-médico Roger Abdelmassih retorne ao presídio 29 de julho de 2021 Justiça concede prisão domiciliar ao ex-médico condenado por 49 estupros   5 de maio de 2021 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico Abdelmassih 26 de fevereiro de 2021 Corte de Direitos Humanos vai julgar Brasil por omissão no caso de Abdelmassih 6 de janeiro de 2021 Detento ataca ex-médico Roger Abdelmassih em hospital penitenciário 21 de outubro de 2020 Tribunal determina que Abdelmassih volte a cumprir pena em prisão fechada 29 de agosto de 2020 Abdelmassih obtém prisão domicililar por causa do coronavírus 14 de abril de 2020 Vicente Abdelmassih entra na Justiça para penhorar bens de seu pai 20 de dezembro de 2019 Lewandowski nega pedido de prisão domiciliar ao ex-médico estuprador 19 de novembro de 2019 Justiça cancela prisão domi...

Reação de aluno ateu a bullying acaba com pai-nosso na escola

O estudante já vinha sendo intimidado O estudante Ciel Vieira (foto), 17, de Miraí (MG), não se conformava com a atitude da professora de geografia Lila Jane de Paula de iniciar a aula com um pai-nosso. Um dia, ele se manteve em silêncio, o que levou a professora a dizer: “Jovem que não tem Deus no coração nunca vai ser nada na vida”. Era um recado para ele. Na classe, todos sabem que ele é ateu. A escola se chama Santo  Antônio e é do ensino estadual de Minas. Miraí é uma cidade pequena. Tem cerca de 14 mil habitantes e fica a 300 km de Belo Horizonte. Quando houve outra aula, Ciel disse para a professora que ela estava desrespeitando a Constituição que determina a laicidade do Estado. Lila afirmou não existir nenhuma lei que a impeça de rezar, o que ela faz havia 25 anos e que não ia parar, mesmo se ele levasse um juiz à sala de aula. Na aula seguinte, Ciel chegou atrasado, quando a oração estava começando, e percebeu ele tinha sido incluído no pai-nosso. Aparentemen...

Secretaria do Amazonas critica intolerância de evangélicos

Melo afirmou que escolas não são locais para mentes intolerantes Edson Melo (foto), diretor de Programa e Políticas Pedagógicas da Secretaria de Educação do Estado do Amazonas, criticou a atitude dos 14 alunos evangélicos que se recusaram a apresentar um trabalho sobre cultura africana para, segundo eles, não ter contato com as religiões dos afrodescendentes. “Não podemos passar uma borracha na história brasileira”, disse Melo. “E a cultura afro-brasileira está inclusa nela.” Além disso, afirmou, as escolas não são locais para “formar mentes intolerantes”. Os evangélicos teriam de apresentar em uma feira cultural da Escola Estadual Senador João Bosco de Ramos Lima, em Manaus, um trabalho dentro do tema "Conhecendo os paradigmas das representações dos negros e índios na literatura brasileira, sensibilizamos para o respeito à diversidade". Eles se negaram porque, entre outros pontos, teriam de estudar candomblé e reagiram montando uma tenda fora da escola para divu...

Por que é absurdo considerar os homossexuais como criminosos

Existem distorções na etimologia que vem a antiguidade AURÉLIO DO AMARAL PEIXOTO GAROFA Sou professor de grego de seminários, também lecionei no seminário teológico da igreja evangélica e posso dizer que a homofobia católica e evangélica me surpreende por diferentes e inaceitáveis motivos. A traduções (traições), como o próprio provérbio italiano lembra ( traduttore, tradittore ) foram ao longo dos séculos discricionariamente destinadas a colocar no mesmo crime etimológico, categorias de criminosos sexuais que na Antiguidade distinguiam-se mais (sobretudo na cultura grega) por critérios totalmente opostos aos nossos. O que o pseudoepígrafo que se nomeia Paulo condenava eram os indivíduos de costumes torpes, infames, os quais se infiltravam em comunidades para perverter mocinhas e rapazinhos sob pretexto de "discipulado" e com fins de proveito sexual. Nada diferente de hoje, por isso vemos que a origem da efebofilia e pedofilia católica e evangélica é milenar. O fato...

Estudante expulsa acusa escola adventista de homofobia

Arianne disse ter pedido outra com chance, mas a escola negou com atualização Arianne Pacheco Rodrigues (foto), 19, está acusando o Instituto Adventista Brasil Central — uma escola interna em Planalmira (GO) — de tê-la expulsada em novembro de 2010 por motivo homofóbico. Marilda Pacheco, a mãe da estudante, está processando a escola com o pedido de indenização de R$ 50 mil por danos morais. A primeira audiência na Justiça ocorreu na semana passada. A jovem contou que a punição foi decidida por uma comissão disciplinar que analisou a troca de cartas entre ela e outra garota, sua namorada na época. Na ata da reunião da comissão consta que a causa da expulsão das duas alunas foi “postura homossexual reincidente”. O pastor  Weslei Zukowski (na foto abaixo), diretor da escola, negou ter havido homofobia e disse que a expulsão ocorreu em consequência de “intimidade sexual” (contato físico), o que, disse, é expressamente proibido pelo regulamento do estabelecimento. Co...

Seleção feminina de vôlei não sabe que Brasil é laico desde 1891

Título original: O Brasil é ouro em intolerância Jogadoras  se excederam com oração diante das câmeras por André Barcinski para Folha Já virou hábito: toda vez que um time ou uma seleção do Brasil ganha um título, os atletas interrompem a comemoração para abrir um círculo e rezar. Sempre diante das câmeras, claro. O mesmo aconteceu sábado passado, quando a seleção feminina de vôlei conquistou espetacularmente o bicampeonato olímpico em cima da seleção norte-americana, que era favorita. O Brasil é oficialmente laico desde 1891 e a Constituição prevê a liberdade de religião. Será mesmo? O que aconteceria se alguma jogadora da seleção de vôlei fosse budista? Ou mórmon? Ou umbandista? Ou agnóstica? Ou islâmica? Alguém perguntou a todas as atletas e aos membros da comissão técnica se gostariam de rezar o “Pai Nosso”? Ou será que alguns se sentiram compelidos a participar para não destoar da festa? Será que essas manifestações públicas e encenadas, em vez de prop...

Cinco deuses filhos de virgens morreram e ressuscitam. E nenhum deles é Jesus

Neymar paga por mês R$ 40 mil de dízimo à Igreja Batista