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'Meu sonho é a destruição de todas as religiões', diz Dawkins



por Barbara Axt
para Superinteressante

Cientista disse que tomou
 consciência de que é ateu 
aos 17 anos de idade
Professor de compreensão pública da ciência na Universidade de Oxford, Richard Dawkins (foto) publicou no final de 2006 "Deus, um Delírio".

 O livro é um grande manifesto ateu – mas, ironicamente, acabou se tornando um presente de Natal bem popular em países de língua inglesa.

Nele,­ Daw­kins afirma que as religiões não são só coisas sem sentido, mas elas também são altamente prejudiciais à sociedade.

“Meu grande sonho é a completa destruição de todas as religiões do mundo”, dispara, com sua voz tranquila, depois de dois minutos de entrevista.

A Super conversou com o cientista em sua confortável casa de tijolinhos na cidade inglesa de Oxford onde, sentado no sofá e vestido como um perfeito inglês, de paletó, camisa social e colete de lã, ele completou o raciocínio: “Mas eu sei que isso é ambicioso demais. Na verdade, eu quero atingir as pessoas que estão em cima do muro. Pensando no assunto, talvez elas percebam que não são religiosas”.

Dawkins é considerado um dos mais importantes intelectuais do mundo e um dos mais famosos divulgadores de assuntos científicos.

Ele já publicou 8 livros, que venderam centenas de milhares de cópias e foram traduzidos em mais de 25 línguas, começando pelo best seller "O Gene Egoísta", de 1976.

O livro revolucionou a área de biologia evolutiva ao explicar a Teoria da Evolução de Darwin pelo ponto de vista dos genes.

De acordo com sua perspectiva, a seleção natural não favorece os organismos mais adaptados à sobrevivência, mas, sim, os genes mais eficientes em se multiplicar.

Depois que Darwin provou que os seres humanos não foram criados à imagem e semelhança de Deus – eles evoluíram a partir de animais mais simples –, Dawkins tirou os animais, as plantas e os seres vivos em geral do papel de protagonistas da evolução, afirmando que nós não passamos de máquinas de sobrevivência projetadas pelos genes. Agora volta sua bateria para Deus.

A maior parte das religiões afirma que estamos sendo acompanhados de perto por um ser superior e que isso dá sentido à nossa vida. Uma imagem tão confortante quanto sem sentido, na opinião de Dawkins. “Existe um propósito na nossa existência, que é a propagação do DNA. Pode não parecer muito nobre, porque não é o tipo de objetivo que as pessoas procuram”, explicou em uma entrevista à BBC.

Criado em um lar anglicano, Dawkins descobriu que era ateu aos 17 anos, quando se convenceu de que a Teoria da Evolução de Darwin explicava o mundo muito melhor do que qualquer religião. Mas, só agora, aos 65 anos, decidiu se dedicar de corpo e alma (ops!) a uma cruzada pela ciência e contra o obscurantismo.

Seu objetivo é combater o poder crescente das religiões como forças absolutas e inquestionáveis – cita como exemplos o fundamentalismo islâmico e o que ele chama de talibã cristão nos EUA.

Ele é o primeiro a reconhecer que suas opiniões são polêmicas. “Se você colocar meu nome no Google, vai encontrar um equilíbrio: há coisas muito negativas escritas por gente religiosa e coisas muito positivas escritas por gente não religiosa”, se diverte.

Ocorre que até entre os ateus existe gente que discorda de suas idéias, como o físico brasileiro Marcelo Gleiser.

“Acho que o Dawkins escreveu um livro provocativo para polarizar ainda mais as tensões entre ciência e religião, o que é inútil”, reclama.

“As pessoas se sentem ameaçadas pela ciência, achando que ela vai ‘matar’ os deuses. É essa distorção que os cientistas devem combater, e não a fé. A ciência não quer roubar Deus de ninguém”, diz Marcelo.

Não é bem isso que Richard Dawkins pensa. Ele discorda radicalmente da posição liberal de ateus como o paleontólogo Stephen Jay Gould, que afirmava que religião e ciência são assuntos que não se misturam e podem coexistir em paz, cada um ocupando partes diferentes da vida (e da mente) humana.

Para Dawkins, isso não passa de duplipensamento, a técnica descrita por George Orwell no livro 1984: acreditar em duas coisas conflitantes ao mesmo tempo. No caso, o Gênesis e a Teoria do Big-Bang.

Em sua opinião, essa posição conciliadora mais atrapalha do que ajuda. Quem não se opõe abertamente às religiões ajuda, com sua omissão, a fortalecer o poder que elas já têm. Ainda assim ele nega que seja um radical: “As pessoas acham isso porque já se acostumaram a falar de religião sempre pisando em ovos”, argumenta. “É possível questionar e discordar de alguém sobre economia, esporte ou qualquer outro assunto. Quando se trata de religião, é proibido falar qualquer coisa.”

Em termos: as religiões vêm, sim, sendo questionadas em vários livros sobre ateísmo lançados recentemente. Dawkins faz parte desse movimento, ao lado de pensadores como os americanos Daniel Dennett (autor de "Quebrando o Encanto") e Sam Harris (autor de "O Fim da Fé").

O cientista compara a situação dos ateus hoje em dia com a dos homossexuais nos anos 50. Para mostrar o preconceito contra as pessoas sem religião, ele cita uma pesquisa feita pelo Instituto Gallup em 1999.

Segundo o levantamento, 95% dos americanos votariam em uma mulher para presidente, 92% em um negro ou judeu e 79% em um homossexual. Mas apenas 49% colocariam um ateu na Casa Branca.

“Enquanto o número de judeus nos EUA é muito menor do que o de ateus, eles são muito mais poderosos, pois foram capazes de se organizar e criar lobbies políticos para defender seus interesses”, diz Dawkins. “Os ateus americanos, que são entre 20 milhões e 30 milhões, não fazem isso.”

Para Richard Dawkins, a pior coisa das religiões é a ideia de fé. A simples ideia de acreditar em algo que não pode ser provado é capaz de tirá-lo do sério – o que significa, para um britânico tão educado, levantar uma das sobrancelhas.

“Fé é algo em que você acredita sem evidência. Pior: quanto mais absurdo o artigo de fé, mais virtuoso é o fato de se acreditar nele.” 

Dawkins crê que a aceitação de dogmas pode levar a sérios problemas.

“Disputas entre crenças incompatíveis não podem ser resolvidas com argumentos racionais”, disse à revista online americana Salon.

“Cientistas discordam entre si usando fatos e evidências para decidir quem está certo. Mas é impossível argumentar racionalmente se você simplesmente sabe que o seu livro sagrado contém a verdade absoluta dita por Deus, e a pessoa do outro lado pensa a mesma coisa sobre o próprio livro, "disse.

"Não surpreende que, ao longo da história, fanáticos religiosos tenham lançado mão de torturas, execuções, cruzadas, jihads e guerras santas.”



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